Revista pessoal feita pela GCM é discutida por juristas



Uma prova obtida por meio da revista pessoal realizada pelo guarda municipal seria ilegítima
Giuliano Bonamim

giuliano.bonamim@jcruzeiro.com.br 

A Guarda Civil Municipal (GCM) é destinada à proteção dos bens, serviços e das instalações pertencentes ao poder público. Mas, em Sorocaba, esse trabalho de segurança tem ido além do que determina a Constituição Federal. A própria corporação tem divulgado em seu site oficial o trabalho de revista em suspeitos, cuja ação é permitida somente às polícias civil, militar e federal.
Juristas dizem que a ação de revistar qualquer indivíduo, feita pelos guardas civis municipais, é inconstitucional. O vice-presidente da 24.º subseção da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Fábio Cenci, condena esse excesso. "É um ato anticonstitucional e isso não é de competência da guarda, mas sim da Polícia", diz. Cenci se baseia na Constituição. O texto diz que a "segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos: polícia federal, polícia rodoviária federal, polícia ferroviária federal, polícias civis; polícia militar e corpos de bombeiros militares". Já os municípios poderão constituir guardas municipais destinadas à proteção de seus bens, serviços e instalações, conforme dispuser a lei. As ações da GCM de Sorocaba têm sido registradas constantemente nos sites da Prefeitura de Sorocaba (www.sorocaba.sp.gov.br) e da 
Associação dos Guardas Municipais de Sorocaba (www.agms.com.br). Parte desses textos relatam a ação de revista em pessoas suspeitas ou detidas em flagrante de delito.
Em 10 de janeiro de 2012, guardas civis municipais abordaram um rapaz na rua Moreira César, região central de Sorocaba, "e o submeteram a uma revista pessoal". Com ele foram encontrados R$ 95 em dinheiro. Um outro caso foi registrado em 8 de fevereiro de 2012, no bairro Nova Sorocaba. Integrantes da GCM alcançaram dois suspeitos em uma motocicleta e, "na revista, os GCMs constataram que a moto não tinha documentação e o seu chassi e seu quadro estavam pichados". Já em 7 de março de 2012, os guardas detiveram um suspeito de traficar entorpecente nos arredores de uma escola na Vila Carvalho. Uma porção de maconha foi achada dentro do tênis do acusado.
O advogado Fábio Cenci ressalta que os guardas civis municipais não podem fazer a revista pessoal em nenhum caso. "O cidadão comum não pode, então a guarda também não tem esse direito", comenta. O delegado assistente da Delegacia Seccional de Sorocaba, José Antônio Belloti, também concorda com a falta de atribuição constitucional dos 
guardas civis municipais em relação à revista pessoal. "Em consequência da problemática da criminalidade, de estar pela rua, a guarda se agrega aos órgãos de segurança auxiliando-os em benefício da comunidade", diz. O promotor de Justiça da Infância e Juventude de Sorocaba, Antonio Domingues Farto Neto, diz que cada intervenção da guarda municipal tem de ser colocada dentro de um contexto. "Eu me coloco contrário à militarização da guarda, com o uso de colete à prova de bala e de pistola automática, pois isso faz com que a guarda comece a fazer um trabalho repressivo e deixe de fazer o preventivo", comenta.
A reportagem do jornal Cruzeiro do Sul questionou a Guarda Civil Municipal (GCM) sobre o assunto, na segunda-feira (dia 5), por meio 
da assessoria de imprensa da Prefeitura de Sorocaba. Nenhuma resposta foi encaminhada. A corporação enviou no fim do mês passado um 
texto para rebater o editorial publicado em 26 de fevereiro com o tema "Guarda Civil Municipal hoje transformada em Policia Militar Municipal". Um trecho da carta, assinada pela Secretaria de Segurança Comunitária, diz que "diuturnamente observamos e cuidamos da nossa cidade e em muitas ocasiões, em deslocamentos, nos deparamos com situações de flagrante e, com responsabilidade, profissionalismo e para o bem estar da comunidade temos a obrigação de atendê-los".
Discussão

O assunto tem sido discutido nos tribunais. O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, em pedido de habeas corpus, não acolheu o pedido de anulação da prova conseguida a partir de revista feita por guardas municipais. A decisão foi tomada em 23 de fevereiro de 2010 pelo relator ministro Arnaldo Esteves Lima. Segundo ele, “embora exista norma constitucional (art. 144, 8º, da Constituição Federal) limitando a função da guarda municipal à proteção dos bens, serviços e instalações do município, não há nulidade na decisão impugnada, porquanto a lei processual penal, em seu art. 301 do Código de Processo Penal, disciplina que qualquer do povo poderá e as autoridades policiais e seus agentes deverão prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito”.
Já o volume 1 do livro “Código de Processo Penal e sua interpretação jurisprudencial” consta uma sentença do ministro Marco Aurélio, aplicada em 22 de abril de 1997, a respeito da revista dos GCMs. A prova obtida por meio da revista pessoal realizada pelo guarda municipal seria ilegítima, contaminando tudo que dela derivou, conforme entendimento do STF”.

Postar um comentário

0 Comentários