Sorocaba:Acervo de museu histórico está ameaçado



Documentos que registram a memória de Sorocaba ficam estocados em um velho casarão de madeira

Daniela Jacintodaniela.jacinto@jcruzeiro.com.br

Anunciado para março de 2012, até agora o novo prédio que deve abrigar os documentos mais antigos da história de Sorocaba não saiu do papel, e provavelmente nem saia, porque a Prefeitura acaba de anunciar que o material será transferido para o Palacete Scarpa, onde ocupará uma sala adequada à conservação e manuseio por pesquisadores. Enquanto isso não acontece, as pesquisas ao acervo do Centro Cultural Antônio Francisco Gaspar, situado em anexo ao Museu Histórico Sorocabano, seguem interrompidas há cerca de quatro anos. 

Em fase de desenvolvimento de sua dissertação de mestrado, a historiadora Mariana Alice Ribeiro foi surpreendida na quarta-feira com a informação de que o setor anexo ao Museu Histórico Sorocabano não oferece mais esse tipo de atendimento, contrariando o que indica a placa logo na entrada do local, onde está escrito que as pesquisas podem ser feitas de segunda a sexta-feira, das 8h30 às 16h30. 
O Centro Cultural está abrigado em um velho casarão de madeira, onde constam importantes documentos da história de Sorocaba, porém o anexo teria sido interditado entre 2009 e 2010 e quem precisasse consultar os arquivos deveria solicitar por e-mail. A orientação era que o interessado enviasse para o e-mail da Secult, com cópia para a antiga diretora do museu. Agora, porém, a informação é que o serviço está suspenso, mas de acordo com estudiosos, as pesquisas estão inviabilizadas desde a época da interdição, há cerca de quatro anos.
Quando o Centro Cultural Antônio Francisco Gaspar foi interditado, a Prefeitura explicou que foi devido à queda do galho de uma árvore, que danificou o telhado. Na época, conforme denúncia de uma leitora, o telhado estaria deteriorado por cupins. Em 2011, a informação da antiga diretora da unidade, Sonia Nanci Paes, era que o espaço seria demolido por determinação do prefeito Vitor Lippi, e até março de 2012 o novo prédio estaria concluído. Sonia chegou a declarar para a reportagem que Sorocaba contaria com "um centro mais funcional, moderno, dotado de melhorias para maior comodidade do público". O casarão, porém, continua em pé e o material (que ainda está lá) corre riscos de se deteriorar naquele espaço. "Afinal, onde está a real política de preservação da memória da cidade tão divulgadas entre a Prefeitura e a Secretaria de Cultura? Sorocaba, a cidade educadora? Impossível, sem a preservação de sua história", reclama Mariana. 

A historiadora afirma que não está preocupada apenas com sua pesquisa. Mariana lembra que Sorocaba tem uma faculdade de História e outras pessoas podem precisar. "Não é por mim, reclamo como historiadora e cidadã sorocabana, gostaria que os documentos estivessem acessíveis a todo mundo. Tem cidades bem menores que Sorocaba que não acontece isso. Pelo porte de Sorocaba é revoltante. Acho mesmo um absurdo um museu não estar aberto pra pesquisa. Eu preciso desses documentos e só tem lá, isso vai prejudicar meu trabalho", disse.
Por meio de nota enviada pela assessoria de imprensa da Prefeitura, a Secretaria da Cultura e Lazer (Secult), através da Divisão de Patrimônio Histórico (DPH) esclarece que "a consulta ao acervo do Museu Histórico Sorocabano não é acessível tal qual uma biblioteca, no que tange às pesquisas. Acessar documentos históricos requer autorização, plano de estudo e justificativas prévias que devem ser requeridas na DPH, que fica no prédio da Secult (telefone 3211-2911)", essa informação, porém, não é transmitida por funcionários quando pesquisadores procuram o local para pesquisa e também não era a antiga prática do local.
A Secult informou ainda que "estão sendo executadas intervenções físicas de preservação do espaço no Museu Histórico e técnicas que visam à garantia do acervo disponibilizado", porém a reportagem esteve ontem no local e a situação do casarão continua a mesma, em estado de abandono, como pode ser verificado pela foto. 

Em nota, a Secult anuncia que "parte do acervo deverá, a partir do segundo semestre, ser digitalizado, incluindo atas dos trabalhos da Câmara Municipal, com a qual a Secult estabelecerá parceria, de forma a permitir, no futuro, que as pesquisas sejam feitas com mais agilidade e segurança dos documentos".

Ainda de acordo com a nota, a Secult irá constituir uma comissão para avaliar e organizar todo o material que será abrigado no Palacete Scarpa. A comissão ficará sob a responsabilidade do historiador José Rubens Incao e da chefe de Divisão Cláudia Tavares (atualmente responsável pelo Museu Histórico Sorocabano). Não foi comentado nada sobre o novo prédio.

Memória
O Centro Cultural Antônio Francisco Gaspar foi criado em 1995 e abriga os documentos mais antigos de Sorocaba, que são as atas da Câmara Municipal. Como no passado não existia Prefeitura, constam nesses livros todas as decisões da cidade. Neles podem ser observados relatos do cotidiano, as profissões da época, informações econômicas da cidade. O registro mais antigo data de 1811. O local também abriga o livro de registros do cemitério da Saudade, o primeiro de Sorocaba instituído enquanto cemitério. Esse material oferece estudo para várias áreas, como a pesquisa de doenças, ou mortalidade infantil, e é muito procurado por quem precisa localizar parentes e comprovar vínculo genealógico, geralmente para conseguir cidadania. 

Projetos não cumpridos
No dia 4 de agosto de 2012, a Prefeitura de Sorocaba anunciou outro projeto, o Laboratório do Núcleo de Estudos Históricos e Arqueológicos, que seria instalado em um anexo no antigo Matadouro dentro de 45 dias. O laboratório seria instalado em uma sala azulejada, equipada com pia e mobiliário adequados para pesquisas, mas ainda não está funcionando. Os documentos históricos, como os livros de atas da Câmara Municipal que fazem parte do acervo do Centro Cultural Antônio Francisco Gaspar, também seriam transferidos para o anexo do Matadouro. A permanência do acervo naquele local, no entanto, seria temporária, tempo suficiente para ser construída a nova sede desse Centro Cultural, mas a Prefeitura não tinha previsão para o início da licitação e construção do prédio, que já deveria estar pronto, conforme anunciado anteriormente.

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