Presidente da França quer parceria em espionagem com os Estados Unidos

Posição francesa é diferente da adotada pelo Brasil; na Assembleia Geral da ONU, em setembro, Dilma propôs projeto de regulamentação da internet, após denúncias do jornalista Glenn Greenwald


Andrei Netto, correspondente em Paris
PARIS - Duraram três dias as reclamações do presidente da França, François Hollande, sobre a Agência de Segurança Nacional dos EUA (NSA, na sigla em inglês). Depois de o governo se dizer chocado e indignado com as denúncias de que órgãos oficiais, empresas e cidadãos franceses são monitorados pelos americanos, o líder propôs que os serviços secretos dos dois países aprofundem a cooperação.
Premiê (E) criticou EUA; Hollande (D) mudou de posição e, agora, quer cooperação com EUA - Michel Euler/AP
Michel Euler/AP
Premiê (E) criticou EUA; Hollande (D) mudou de posição e, agora, quer cooperação com EUA
O objetivo do Palácio do Eliseu é "enquadrar" os pontos de divergência entre Washington e Paris. A mudança de estratégia ficou clara nesta quarta-feira, 23, dois dias depois de o jornal Le Monde começar a publicar uma série de reportagens sobre como a NSA invade a privacidade dos franceses e descobre segredos industriais e de Estado.
Escritas em colaboração com o jornalista americano Glenn Greenwald e com base em documentos obtidos pelo ex-técnico de inteligência Edward Snowden, asilado desde agosto na Rússia, as reportagens revelaram que, apenas entre 10 de dezembro de 2012 e 8 de janeiro de 2013, 70,3 milhões de telefonemas feitos na França foram gravados de forma clandestina pelos americanos.
De início, a prática foi considerada "chocante" pelo primeiro-ministro francês, Jean-Marc Ayrault, o que levou o chanceler Laurent Fabius a convocar o embaixador americano em Paris, Charles Rivkin.
Ainda na segunda-feira, 21, o presidente Barack Obama garantiu a Hollande, por telefone, que "questões legítimas de amigos e aliados" sobre privacidade e limites da espionagem estão sendo levadas em consideração na revisão das competências da NSA - a mesma resposta dada à presidente brasileira, Dilma Rousseff, em agosto e setembro. Na terça-feira, 22, foi a vez o secretário de Estado americano, John Kerry, encontrar-se com Fabius para discutir o caso.
Depois da ofensiva diplomática americana, Hollande amenizou o discurso. Segundo a porta-voz do governo francês, Najat Vallaud-Belkacem, Hollande propôs ao americano "uma cooperação bilateral", oferta que teria sido aceita. "Eles concordaram no fato de que as operações de coleta de informações devem ser disciplinadas e o enquadramento deve ocorrer de maneira bilateral."
A porta-voz disse que Paris considera os instrumentos da espionagem americana úteis e manifestou mais preocupação em "enquadrar" a prática do que impedi-la. "As intercepções e a cooperação entre nossos dois países sobre o assunto podem ser úteis na luta contra o terrorismo", afirmou Najat, ao ser questionada sobre se o governo impediria as interceptações.
A posição francesa é diferente da de Dilma, que propôs na Assembleia-Geral da ONU, em setembro, um projeto de regulamentação da internet - na prática, tornando a discussão multilateral.
O tema da espionagem deve ser um dos pontos de discussão entre os chefes de Estado e de governo da União Europeia na cúpula que ocorre nesta quinta-feira, 24, e sexta-feira, 25, em Bruxelas, na Bélgica.
Uma das propostas em discussão deve ser a que obriga empresas como Google, Yahoo, Facebook, Apple e Microsoft a não acessar certos dados de vida privada ou não transmiti-los a serviços de espionagem.
Nesta semana, o Parlamento Europeu aprovou um projeto de multas que podem chegar a € 100 milhões ou a até 5% do faturamento das empresas caso elas transmitam, sem autorização, dados sigilosos de governos.

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