Promotor que acusou Cristina Kirchner é achado morto; entenda o caso

Alberto Nisman foi encontrado morto com um tiro em seu apartamento no bairro de Puerto Madero, em Buenos Aires
A morte de um promotor que havia acusado na semana passada a presidente Cristina Kirchner de querer por um fim à investigação do atentado em 1994 que matou 85 pessoas em uma centro judaico em Buenos Aires provocou comoção e polêmica na Argentina.
O corpo de Alberto Nisman, de 51 anos, foi encontrado na noite de domingo no banheiro do seu apartamento na capital argentina, no bairro de Puerto Madero, quatro dias depois de ter denunciado que a presidente, o ministro das Relações Exteriores, Hector Timerman, e outras duas pessoas teriam arquitetado um plano para acobertar possíveis pistas contra iranianos acusados pelo ataque a bomba de 1994.
Nisman era esperado na tarde desta segunda-feira na Câmara dos Deputados para esclarecer as denúncias feitas na quarta-feira.
O corpo do promotor estava junto a um revólver calibre 22, segundo uma promotora de Justiça que esteve no local. Nisman tinha afirmado à imprensa argentina no final da semana passada que temia ser morto por causa da investigação.
A polícia trabalha com a hipótese de suicídio. Mas setores da oposição suspeitam que Nisman teria sido morto.
"Falei com ele no sábado, mais de uma vez, e ele me disse que estava se preparando, estudando tudo para comparecer na segunda-feira. Ele também me disse que vinha sendo pressionado e sofrendo ameaças", disse a deputada opositora Patricia Bullrich nesta segunda à imprensa local.
Num comunicado divulgado na manhã desta segunda-feira, a Secretaria Nacional de Segurança diz que Nisman contava com a segurança de dez profissionais e que foram eles que perceberam que o promotor não tinha pego os jornais na porta do apartamento, como fazia normalmente, e decidiram ligar para a secretária dele e para familiares.
O secretário de Segurança do governo da presidente Cristina Kirchner, Sergio Berni, disse que, diante da preocupação dos seguranças, ligou para familiares de Nisman, e foi decidido que entrariam no apartamento.
"Entramos com seguranças, com a polícia e com a família. A mãe dele entrou no banheiro, que estava fechado, e foi constatado (que ele estava morto no local)", disse Berni à emissora de televisão TN (Todo Notícias), de Buenos Aires.
Os documentos e fitas sobre as denúncias que fez contra a presidente e seus assessores teriam ficado em uma mesa do apartamento, segundo informações da imprensa local.
"Tudo foi fotografado porque buscamos a maior transparência possível. Mas não posso dizer o que havia no apartamento", disse Berni quando perguntado sobre os documentos.
Para o ex-ministro da Justiça Ricardo Gil Laavedra, a morte do promotor "é um caso gravíssimo".
Complô
Nisman havia denunciado um suposto complô liderado pela presidente Cristina Kirchner para excluir iranianos da lista de acusados pelo atentado contra a Associação Mutural Israelense Argentina (AMIA), no dia 18 de julho de 1994, que deixou 85 pessoas mortas e cerca de 300 feridas.
Na ocasião, um carro-bomba foi detonado em frente à associação, no que até hoje é visto como o maior atentado terrorista da história na América Latina. As primeiras investigações levaram à prisão de alguns argentinos que teriam dado apoio logístico aos autores do ataque a bomba. Mas eles foram soltos e hioje ninguém se encontra preso pelo caso.
As investigações judiciais - que passaram a ser comandadas por Nisman a partir de 2005 - levaram à acusação formal de oito pessoas - sete iranianos e um libanês.
A Justiça argentina dizia ter provas de que o ataque foi organizado pelo movimento islâmico libanês Hezbollah com apoio estratégico e econômico do governo iraniano.
Em 2006, o governo de Néstor Kirchner fez um pedido formal à Interpol pela captura dos acusados. O governo iraniano refutou as acusações e se recusou a entregar os oito acusados, que supostamente vivem no país.
Segundo Nisman, desde 2011 o governo teria mudado de posição em relação ao caso. "Houve uma mudança radical na postura do governo", disse ele na quarta passada à emissora de TV Todos Notícias (TN). "Agora se fez um acordo com terroristas".
Ele disse à TN, naquela mesma quarta, que o governo argentino ofereceu grãos em troca de petroleo ao Irã, com a promessa de que as acusações contra os sete iranianos e o libanês fossem colocadas de lado.
"Tenho uma série de gravações (de escutas telefônicas) e tudo foi por ordem da presidente Cristina Kirchner", disse à TV.
Petróleo e grãos
Nisman havia acusado Timerman (esq.) e Cristina Kirchner de fazer um acordo com o Irã
Segundo Nisman, em janeiro de 2011 a presidente teria "determinado" ao ministro Timerman que "desvinculasse" os iranianos acusados do caso.
Ele afirmou ainda que contava com gravações que comprovam o que chamou de "pacto de silêncio" sobre os iranianos procurados pela Interpol.
Na entrevista à TN, Nisman disse que vinha sofrendo ameaças e que seu telefone havia sido grampeado. "Sabem da minha ex-mulher, sabem de coisas que eu não sabia".
Os familiares das vítimas do atentado afirmaram estar "chocados" com a morte do promotor.
Luis Cichesky, pai de uma das vítimas do atentado a bomba, disse: "É uma tragédia para o país. O melhor agora é que a denúncia dele ganhe um caminho para a saúde do país".
O presidente da DAIA (Delegação de Associações Judaicas Argentinas), Julio Schlosser, disse que todos estão "consternados".

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