'Desigualdade é resultado da atuação de governos e empresas', diz Oxfam



CONCENTRAÇÃO

Segundo diretora da organização, estudo que aponta crescimento da diferença entre ricos e pobres alerta para falsa ideia de meritocracia
por Luciano Velleda, para a RBA publicado 16/01/2017 11h44, última modificação 16/01/2017 13h04
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miséria
Relatório da Oxfam destaca que 1 em cada 10 pessoas no mundo sobrevive com menos de US$ 2 por dia
São Paulo – Estudo da ONG Oxfam divulgado hoje (16) no Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça, revela que apenas oito homens possuem a mesma riqueza que os 3,6 bilhões de pessoas da metade mais pobre da humanidade. No relatório divulgado no anos passado, essa concentração estava com os 62 mais ricos – isto é, cresceu quase oito vezes em um ano. O documento Uma economia humana para os 99% aponta que o aumento da diferença entre ricos e pobres no planeta é mais veloz do que se pode prever. (Confira íntegra do relatório ao final desta reportagem.)
Segundo o estudo, feito com base no dados do Credit Suisse Wealth Report 2016 e na lista de milionários da revista Forbes, os 50% mais pobres da população mundial detêm menos de 0,25% da riqueza global líquida. São em torno de 3 bilhões de pessoas que vivem abaixo da "linha ética de pobreza" definida pela riqueza que permitiria que as pessoas tivessem uma expectativa de pouco mais de 70 anos. 
DIVULGAÇÃO/OXFAMKatia Maia
Katia Maia, diretora da Oxfam
"Os dados são os mais impactantes possíveis", afirma Katia Maia, diretora-executiva da Oxfam. "Queremos chamar a atenção dos governos, das empresas e da sociedade, eliminar a ideia falsa da questão do mérito no tema da riqueza. No nível extremo em que está, a desigualdade é resultado da atuação de governos e empresas, que devem trabalhar para os 99% da população." 
O relatório da Oxfam destaca que uma em cada dez pessoas no mundo sobrevive com menos de US$ 2 por dia. Por outro lado, a ONG prevê o surgimento do primeiro trilhardário em 25 anos. Sozinha, essa pessoa terá uma fortuna tão estratosférica que precisaria gastar US$ 1 milhão todos os dias, durante 2.738 anos, para acabar com seu dinheiro. 
Katia Maia explica que o estudo não foi apresentado no Fórum Econômico de Davos por acaso, afinal, é lá na pequena cidade suíça que se encontram as pessoas que comandam o destino da economia mundial. Em meio ao seleto grupo dos homens que comandam a economia do planeta, o estudo apresentado mostra que 7 de cada 10 pessoas vivem em países cuja taxa de desigualdade aumentou nos últimos 30 anos. Entre 1988 e 2011, os rendimentos dos 10% mais pobres aumentaram em média apenas US$ 65 (US$ 3 por ano), enquanto os rendimentos dos 10% mais ricos cresceram em uma média de US$ 11.800 – ou 182 vezes mais. 
"As empresas precisam assumir suas responsabilidades e não colocar o lucro a qualquer preço. Elas precisam pagar seus impostos, precisam respeitar questões trabalhistas, incorporar a temática de gênero. Os governos também devem assumir suas responsabilidades. No momento de crise absoluta, quem socorre o setor empresarial é o Estado", ponderou a diretora-executiva, lembrando a crise mundial de 2008.  "É em Davos que está o problema. Queremos que as pessoas que estão lá assumam a responsabilidade, queremos pressionar os empresários e dar visibilidade para que medidas sejam tomadas." 
Para a Oxfam, a solução para o dramático cenário passa por medidas como: governos que trabalhem para os outros 99% da população; incentivo à cooperação entre os países; modelos de empresas com melhor distribuição de benefícios; tributação justa à extrema riqueza; igualdade de gênero na economia humana; tecnologia a serviço dos 99%; fomento às energias renováveis; e valorização e mensuração do progresso humano 

A realidade brasileira 

No caso do Brasil, Katia Maia revela que a riqueza de apenas seis bilionários alcança US$ 78 bilhões e representa a soma dos recursos de 50% da população brasileira mais pobre. "No Brasil, o governo também deve assumir suas responsabilidades. Dependendo por qual caminho vão as medidas adotadas, pode se aumentar a desigualdade." Para ela, "é urgente no país uma reforma tributária".
A diretora-executiva da Oxfam dá como exemplo a ação do governo de Michel Temer em congelar os gastos públicos por 20 anos como justificativa para o equilíbrio fiscal, ao mesmo tempo em que não toma medidas de combate a sonegação. 
"Acabamos fazendo a escolha de ir por um caminho que congela gastos, mas não enfrenta a evasão fiscal que representa uma perda em torno de R$ 240 bilhões por ano. É uma opção que não enfrenta as desigualdades em favor do 1% dos ricos e não em favor dos outros 99% da população." 
Katia Maia é taxativa ao dizer que os grandes negócios e os indivíduos que mais detêm a riqueza mundial estão se alimentando da crise econômica, pagando menos impostos, reduzindo salários e usando seu poder para influenciar a política em seus países. 
"A desigualdade está mantendo milhões de pessoas na pobreza, fragmentando nossas sociedades e minando nossas democracias. É ultrajante que tão poucas pessoas detenham tanto enquanto tantas outras sofrem com a falta de acesso a serviços básicos, como saúde e educação", reforça.

Confíra íntegra do relatório

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