‘Economia em 2014 deve crescer mais que em 2013’

Para Márcio Holland, secretário da Fazenda, cenário neste ano é de aumento dos investimentos e crescimento da economia


Adriana Fernandes e João Villaverde, de O Estado de S.Paulo

Segundo ele, o Brasil vem praticando uma política de consolidação fiscal de muitos anos. "Não estamos falando de uma política de um ano, dois anos. Há muitos anos o Brasil vem fazendo excelentes resultados primários", diz.BRASÍLIA - Depois de um início do ano de piora nas expectativas, o secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Márcio Holland, afirma que a economia brasileira está recuperando a confiança e o que o País vai continuar na trajetória de bons e sólidos resultados fiscais. Na sua avaliação, o quadro macroeconômico e fiscal não será empecilho para o aumento dos investimentos e o crescimento da economia. "Não há motivo nenhum para acreditar que haja algum empecilho advindo do quadro macroeconômico brasileiro", afirma o secretário.
Em entrevista exclusiva ao Estado, Holland avalia que há uma processo de recuperação da confiança na economia e faz uma análise detalhada dos principais fatores que vão impulsionar a atividade econômica em 2014 e que não estavam presentes em 2013. "Teremos avanço mais consistente de consumo", diz.
Ele prevê um cenário de muitas vendas de eletroeletrônico domésticos, celulares, TVs digitais e smartphones ao longo do ano. E destaca que a demanda agregada adicional vai promover movimentação a mais de estoques e produção. "Quando a economia cresce ajudada pelo mundo há sinal diferente para as expectativas", destaca. Para ele, as notícias boas vão contagiar as expectativas. Veja os principais trechos da entrevista:

Há razão para ser mais otimista com o crescimento econômico?

Márcio Holland: A economia brasileira está neste processo de recuperação desde 2012. Todos têm a avaliação de que 2013 foi melhor do que 2012. E o interessante é que nesse processo de recuperação temos um investimento muito bom. Está acima do PIB, o que é ótimo sinal. Vislumbramos situação, em termos de investimento, também para 2014, acima do ritmo do PIB. Uma qualidade de recuperação depois de 2012 muito boa, depois de acomodação pela crise e também pelo papel da política econômica em 2011.

O que vai ajudar?

Márcio Holland: Teremos agora alguns componentes adicionais na atividade em 2014 que não estavam presentes em 2013. O primeiro deles é que em 2014 há cenário de crescimento mundial maior, com a zona do euro saindo de crescimento negativo para positivo. Ainda que pequeno, mas isso é bom. E essa movimentação deve gerar externalidades positivas para o Brasil ao longo de 2014. O segundo elemento que estava pouco presente no ano passado é a dinâmica do crédito. Em 2013, nós começamos com uma pressão de inflação de alimentos que tencionou a preferência do consumidor e que teve associação com oferta de crédito dos bancos e isso não está se configurando neste ano. Estamos avaliando isso: uma inflação de alimentos bem mais benigna. Fechou 2013 com 8,51% no IPCA de alimentação e bebidas, e chegou a ser 14% no acumulado até abril de 2013. Mas vemos menor pressão de alimentos e bebidas. Esse ambiente faz com que você tenha uma redução consistente de inadimplência. A taxa de desemprego vem se mantendo estável em nível baixo, com cenário de queda em alguns casos. Essa combinação de redução da inadimplência, baixa taxa de desemprego, aumento de salários, e alimentos e bebidas mais baixo, isso vai representar um avanço mais consistente de consumo.

Mas pode haver aumento dos preços bebidas?

Márcio Holland:
 Tive telefonemas hoje com os empresários de bebidas e não é o que ouvi. Eles tem usado marketing de "carnaval sem reajuste", e eles estão otimistas.

A visão então é favorável para a combinação desses fatores?

Márcio Holland: Essa combinação vai ser mais um fator de movimentação dinâmica na economia, teremos demanda agregada adicional em relação a 2013 e isso vai promover movimentação a mais em estoques, e portanto mais produção ao longo do ano. Só para se ter uma ideia, o consumo até o terceiro trimestre do ano passado estava crescendo 2,4%. Esse consumo deve ser elemento adicional de crescimento da economia ao longo do ano. São esses fatores importantes para a atividade: investimento crescendo acima do PIB, o mercado internacional em recuperação gerando externalidade positiva para o Brasil por meio do vazamento de renda e melhoria do ambiente internacional.

E quanto a taxa de investimento propriamente? Foi muito puxada em 2013 por ônibus e máquinas agrícolas....
Márcio Holland: A parte de máquinas e equipamentos representa 55% da Formação Bruta, parte é meios de transportes e parte é máquinas para fins agrícolas, que cresceu muito no ano passado e está gerando modernização do setor agrícola, e isso segue firme em 2014, com mais safra recorde, indo para 167 milhões de toneladas, e com aumento da produtividade. Esse grande volume de máquinas gera produção. Veja também máquinas para fins industriais, que são complementadas por importadas, o que é natural. É assim em todos os países.

Se olharmos o começo de 2013, já tínhamos o mercado de trabalho aquecido e com consumo firme, sinal era sempre positivo, mas o PIB não cresceu até agora... o que mudou? Só cenário internacional?


Márcio Holland: Estamos falando de período de redução substancial do comércio mundial, os dados mostram isso, um volume grande de produção internacional excedente, inclusive naquele período de 2011 e 2012 com enfrentamento de práticas comerciais desleais, ou seja, teve essa movimentação, a economia brasileira estava em processo de acomodação, e quando há isso, acontece essa coisa de agentes recalibrarem confiança e expectativa. Há um tempo para isso mudar. Quando a economia começa a crescer, ajudada pelo mundo, agora há sinal diferente para as expectativas.

O sr. está preocupado com saldo comercial baixo e o déficit nas transações correntes recorde?

Márcio Holland: Não. Todos os cenários, os nossos e dos analistas, são de melhora em 2014. O ano de 2013 foi um momento específico. Vamos observar uma correção nesse desequilíbrio de conta corrente, então não nos preocupa. Há sinal de melhoria da balança comercial, da própria conta petróleo, então vai melhorar. Nosso cenário inclui melhora das transações correntes, isso não será um problema para 2014. O IED vai voltar a financiar o déficit ao longo do ano, com patamar de US$ 65 bilhões.

A política fiscal tem sido um problema para a confiança do empresário?

Márcio Holland: O ambiente macro é de muita solidez, tem demonstrado isso em todas as frentes. No lado fiscal temos feito muito nos últimos 15 anos, são os maiores superávits primários do mundo. A dívida líquida está caindo, a bruta está estável ao longo do tempo. As comparações internacionais mostram um aumento da dívida bruta nos outros países, temos também melhorado o perfil da nossa dívida, em linha com o Plano Anual de Financiamento. Nesse cenário em particular, o que acredito é: não há qualquer razão para associar o quadro macroeconômico a uma decisão de investimento no Brasil.

O que o sr. quer dizer com isso?

Márcio Holland: Quero dizer que nossa economia vem apresentando bons resultados, seja no campo da agricultura, seja na indústria, inclusive na indústria mineral, seja na construção civil que vai avançar mais frente ao ritmo de 1,7% no acumulado de 2013 até o terceiro trimestre, será ainda maior em 2014. Então do lado da oferta tem elementos adicionais acontecendo na economia, e isso vai restaurando a confiança de todos os agentes econômicos, e essas notícias boas serão somadas às notícias positivas do mundo. Isso vai contagiar as expectativas quanto ao Brasil.

A política fiscal não será um empecilho?

Márcio Holland: Não há motivo nenhum para acreditar que haja algum empecilho advindo do quadro macroeconômico brasileiro.

Por que a presidente Dilma deu tanto destaque à política fiscal em Davos?

Márcio Holland: Ela tocou em vários pontos, não somente esse. Eu destacaria também a ênfase nos investimentos em infraestrutura, em educação e saúde, e também a importância da estabilidade institucional brasileira, as baixas taxas de desemprego. Também vi uma série de análises interessantes sobre os emergentes no discurso dela, o fato de que se mantém muito dinâmicos, particularmente o Brasil, tendo mercado consumidor muito grande, como potencial de mercado consumidor ainda maior. A penetração de TV digital em 8%, de máquinas de lavar roupa em 55%, sendo 35% de automáticas, então há um universo de municípios para aumentar. As análises que nós recebemos de perspectivas de investimento para Brasil destacam isso.

Mas porque as previsões dos analistas são fracas?
Márcio Holland: O mercado sempre começa com uma avaliação de um cenário mais base e à medida que vêm ingredientes da atividade eles revisão para cima. Isso aconteceu porque num período anterior eles faziam sempre uma cenário de previsão maior e iam corrigindo um pouco para baixo.

As previsões para a economia vão melhorar, então?

Márcio Holland: Nossa expectativa é essa, por conta inclusive desse cenário que eu desenhei. A economia mundial melhorando seu ambiente de crescimento, de comércio mundial, os investimentos mantendo taxas de crescimento mais forte, agricultura continuando a contribuir de forma muito relevante, a indústria extrativa mineral dando contribuição positiva, o que não deu em 2013, a construção civil crescendo mais ainda. Do lado da demanda, muito acontecendo em vários setores da economia e que deve continuar. O que temos de cenário é que haverá muita venda de eletroeletrônico doméstico, celulares, TVs digitais, smartphones. O setor automotivo tem uma previsão de continuação das taxas de crescimento que tiveram nos últimos anos. Alguns setores crescem mais num período e alguns e outros períodos. Nós esperamos ter crescimento melhor ainda na indústria de alimentação este ano. Traduzindo: estamos vendo cenários de atividade acontecendo.

Mas e a previsão para o PIB?

Márcio Holland: O que eu posso dizer é que fazemos revisão periódica da nossa taxa de crescimento e isso vai continuar. Acreditamos que a economia em 2014 deve crescer mais do que 2013 e mais do que 2012. E é importantíssima essa trajetória de crescimento, com investimento e expansão da infraestrutura. Não se pode esquecer que está sendo processada a confiança no Brasil a partir do sucesso dos leilões. Em poucos meses do final do ano passado, tivemos cinco leilões de importantes rodovias e dois grandes aeroportos com importantes players internacionais.

E a Copa vai ajudar?

Márcio Holland: É esperado um movimento positivo de consumo.

Qual pode ser o papel do governo em 2014 para atividade?

Márcio Holland: Nós já temos um conjunto de incentivos. A partir de janeiro, os 56 setores de desonerações da folha estarão a pleno vapor, processo que começou em final de 2011 com três setores. O governo já anunciou o PSI (programa de sustentação do investimento) para esse ano com taxas interessantes e já temos programa de infraestrutura. Dos leilões já ocorridos, muito provavelmente já tem toda uma movimentação para iniciar os investimentos. E isso começa a mexer na atividade econômica. Só desses leilões estamos falando de investimentos de R$ 80 bilhões. Esses investimentos estão acontecendo a taxas cada vez mais rápidas e o efeito multiplicador é o maior. Tem uma atividade aí por conta desses investimentos.

Por que, então, o mau humor com o Brasil nesse início do ano?

Márcio Holland: Nós crescemos em 2013 mais do que em 2012. E o que é mais importante crescemos o investimento de forma relevante, a despeito de uma alteração da política monetária americana, que aconteceu em maio, manifestações em junho, e muita incerteza no cenário internacional associada ao tapering (a redução do programa de estímulos à economia americana). E a própria mudança do tapering em dezembro. Mesmo nesse ambiente de alteração da política monetária americana, o Brasil teve crescimento na taxa de investimento.

A expectativa é de que esse mau humor vai passar ?

Márcio Holland: Nessa discussão de mau humor, a gente está falando de sentimentos em torno de fatos. E os sentimentos vão mudando à medida que os fatos vão se concretizando. Vai se dissipando. O sentimento em torno dos fatos é cada vez mais positivo. Não vejo problemas nesse sentido. Estamos recuperando a confiança. E, ao longo desse ano, não há motivo para acreditar que essa avaliação de há um mau humor esteja afetando alguma coisa na atividade econômica agora.

Há economistas defendendo mais austeridade fiscal e outros dizendo que nessa hora de retomada do crescimento o governo não deveria transmitir aperto?

Márcio Holland: Eu respeito as avaliações. Mas eu acredito que o Brasil vem praticando uma política de consolidação fiscal de muitos anos. Não estamos falando de uma política de um ano, dois anos. Há muitos anos o Brasil vem fazendo excelentes resultados primários. A dívida líquida caiu de 60% para 34% do PIB e não é a toa. Melhorou seu perfil e alongou. O que eu acho fundamental é que esses resultados têm sido obtidos ao longo de uma história recente do Brasil. Não é uma novidade de um ano ou três. É algo que esta acontecendo e tem acontecido. E vamos continuar na mesma trajetória de bons e sólidos resultados econômicos e fiscais.

Qual pode ser o papel do câmbio para estimular as exportações e investimentos?

Márcio Holland: Nós estamos num regime de câmbio flutuante.

O câmbio pode influenciar o investimento de alguma forma?

Márcio Holland: É difícil falar isso. Não tem uma clareza sobre o nível de câmbio que afeta o investimento ou o crescimento. A única coisa que eu sei te falar é que nós temos a propriedade de ter a flutuação cambial como um pilar dos fundamentos e da atividade econômica. Essa flutuação cambial absorve choque diversos e evita esse contágio sobre o lado real da economia de forma relevante.

A crise da argentina tem assustado todo mundo. O CDS dos países vizinhos tem aumentado como sinônimo de risco natural. O governo está preocupado? Pode contagiar?

Márcio Holland: Não esperamos nenhum contágio ou relação que comprometa a atividade econômica qualquer evento dentro da Argentina que está se normalizando, inclusive.

Por último, o governo vai mudar as regras de previdência aberta e fechada por conta do cenário ruim do ano passado?

Márcio Holland: Não há nada nesse front. Eu posso falar porque é da minha secretaria o assunto. Vocês já conversaram com eles? Eles estão tranquilíssimos. Não tem nenhuma mudança de regra sendo discutida. Nada, Nada. Já está acertado com o setor, funcionando normal. Tá tudo arrumadinho, funcionando bem. Não sei de onde surgiu isso. Nem faço ideia. Não está na mesa.

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