Com atraso, Globo descobre lista mas foge do conteúdo; papéis mencionam Cedraz, tucano Imbassahy e Erasmo Dias


publicado em 28 de março de 2016 às 20:02
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Cedraz, Imbassahy posando de moralista sem moral e Erasmo Dias, o agente daquela ditadura em que não havia corrupção
Da Redação-Viomundo
Domingo passado o Fantástico transmitiu entrevista com Conceição Andrade, ex-funcionária da Odebrecht que tinha em sua posse documentos demonstrando que a corrupção e o uso de codinomes pela empreiteira vem dos anos 80.
Ou seja, governos Sarney, Itamar Franco, Fernando Collor, Fernando Henrique Cardoso…
O programa da TV Globo repetiu a artimanha do Jornal Nacional para evitar a constatação, pelo público, de que a bandalheira antecede em muito a chegada de Lula e do PT ao poder, em 2002.
O Fantástico poderia, por exemplo, ter escolhido alguns nomes que constam da lista. Exemplos? O prefeito de Manaus, Artur Virgílio, o Arvir, ou o ministro Aroldo Cedraz, do Tribunal de Contas da União, apelidado pela empreiteira de Toldo.
Porém, a Globo argumentou assim: “O Fantástico não vai divulgar os nomes das pessoas que aparecem nas listas. Primeiro, porque a polícia ainda não sabe se elas cometeram alguma ilegalidade. Além disso, as duas listas juntas têm mais de 700 nomes. Não haveria tempo nem para citar todos e nem para dar a defesa de cada uma delas. Além disso, escolher alguns e omitir outros não seria justo”.
Ora, por que não divulgar os nomes daqueles que ainda exercem cargos públicos e remeter os telespectadores à lista completa na internet?
Em 2006, foi assim que a Globo fez num famoso Jornal Nacional: mencionou os acusados ligados ao PT em um escândalo e disse que os nomes dos demais, inclusive de um aliado de José Serra, poderiam ser encontrados no G1!
Os papéis não são exatamente novidade. Em 17 de setembro de 2015 o deputado Jorge Solla (PT-BA) denunciou a existência da lista no site do PT na Câmara. Ele encaminhou a papelada à Polícia Federal.
Recentemente, Miguel do Rosário, de O Cafezinho, informou que o Anonymous vazou o conteúdo completo da papelada, que está aqui.
A lista mostra, por exemplo, que o cão-de-guarda da ditadura militar, Erasmo Dias, o coronel do Exército que foi vereador, deputado estadual e deputado federal e comandou a famosa invasão da PUC quando secretário de Segurança de São Paulo, é suspeito de ter recebido propina em uma obra da Odebrecht no interior da Bahia, o complexo de Mirorós. Dias tinha o codinome apropriado de Liquidificador.
Mas, como se sabe, não havia corrupção naquele regime apoiado pela Globo, né? Pelo menos nunca houve denúncia de corrupção no Jornal Nacional contra o ditador de plantão durante 20 anos de regime!
Outro motivo para a Globo abafar o conteúdo: na lista aparece Fernando Sarney, filho do ex-presidente, que ocupou cargo-chave na CBF quando o grande parceiro da emissora, Ricardo Teixeira, era o manda-chuva do futebol brasileiro.
Para corrigir mais esta omissão da TV Globo, que anteriormente publicou uma sopa de letras para encobrir a recente superplanilha da Odebrecht, republicamos abaixo um texto do UOL e a lista completa de nomes e codinomes:
Esquema de propina da Odebrecht funcionava desde governo Sarney
Pedro Lopes*
A 26ª fase da operação Lava Jato expôs, na última terça-feira (22), a existência de um “departamento de propina” na empreiteira Odebrecht, que teria sido utilizado para movimentar altas somas de dinheiro em pagamentos ilícitos para agentes públicos e políticos principalmente em 2014. O esquema, no entanto, pode ser muito mais antigo. Documentos mostram que, durante o mandato presidencial de José Sarney (1985-1990), procedimentos bem semelhantes aos apontados pelos investigadores da Lava Jato envolviam 516 agentes públicos, empresários, empresas, instituições e políticos. Entre eles, há ex-ministros, senadores, deputados, governadores, integrantes de partidos como PSDB, PMDB e PFL (atual DEM).
O UOL teve acesso a quase 400 documentos internos da empreiteira, a maioria datada de 1988, detalhando remessas e propinas a diversos políticos. A documentação estava de posse de uma ex-funcionária da Odebrecht. Como no esquema divulgado pela Lava Jato na terça-feira (22), eram utilizados codinomes para os receptores dos pagamentos e as propinas eram calculadas a partir de percentuais dos valores de obras da empreiteira nas quais os agentes públicos estavam envolvidos.
A Odebrecht afirmou “que não se manifestará sobre o tema”. Todos os políticos ouvidos negaram qualquer envolvimento em esquema de propinas com a construtora.
Na documentação chamada “Livro de Códigos”, havia uma lista, batizada de “Relação de Parceiros”, que detalha os codinomes de políticos, agentes públicos e empresários relacionados às obras da Odebrecht nas quais teriam atuado.
Um dos nomes que aparecem é de Antonio Imbassahy, atual deputado federal pelo PSDB – que tinha o codinome “Almofadinha”, e estaria relacionado à obra da barragem de Pedra do Cavalo, na Bahia. Imbassahy presidiu a Desenvale (Companhia do Vale do Paraguaçu) nos anos 1980, quando era filiado ao PFL. A Desenvale foi o órgão público responsável pela obra de Pedra do Cavalo.
Também do PSDB, Arthur Virgílio, atual prefeito de Manaus, recebe o codinome “Arvir”. Do PMDB, são citados Jader Barbalho (“Whisky”), atualmente senador, ligado à obra da BR-163, no Pará, e o ex-ministro de Minas e Energia, senador Edison Lobão (“Sonlo”). Os filhos do ex-presidente José Sarney, Fernando e José Filho, aparecem com os codinomes “Filhão” e “Filhote”; Roseana Sarney, como seu nome de casada, “Roseana Murad”, aparece como “Princesa”.
Na lista, está também o ex-presidente e atualmente senador recém-desfiliado do PTB, Fernando Collor de Mello (“Mel”), relacionado a um emissário submarino construido na década de 1980, quando ele era governador de Alagoas. Há também o nome de Aroldo Cedraz, atual presidente do TCU (Tribunal de Contas da União), de codinome “Toldo” e ligado à obra adutora do Sesal – ele ocupava na época os cargos de presidente da Cerb (Companhia de Engenharia Rural da Bahia) e de secretário de Recursos Hídricos e Irrigação da Bahia.
O já falecido ex-deputado federal e governador do Mato Grosso, Dante Oliveira (1952-2006), que ficou famoso como o autor do projeto que pedia eleições diretas para presidente nos anos 1980, tinha o apelido “Ceguinho” e estaria relacionado a obras de canais em Cuiabá, cidade onde foi prefeito por três mandatos.
“O esquema naquela época era mais ou menos como esse divulgado essa semana, só não tão organizado assim. Esse esquema de propina, de fraudar licitações, sempre existiu na empresa. Aliás em todas as grandes, o esquema sempre foi esse”, explica Conceição Andrade, ex-funcionária da empresa e que trabalhou no departamento responsável pelos pagamentos – a antecessora de Maria Lúcia Tavares, que delatou o esquema atual na Lava Jato.
“Eram porcentagens de valores das obras. Era feito o fechamento, e determinava um percentual. A partir daí ocorria o superfaturamento e o pagamento. Tudo isso era feito através de transações bancárias e dinheiro. É bem semelhante ao que foi divulgado na Lava Jato, mas hoje tem um departamento específico para isso. Naquela época era feito em nível de gerência, mas acredito que tenha funcionado em diretoria e presidência também”, completa Conceição.
“Quando fui demitida e peguei os pertences pessoais, esses documentos estavam no meio da caixa, acabaram vindo junto. As pessoas recomendaram que me desfizesse, mas achei bom guardar. É preciso traçar um paralelo, mostrar que isso é antigo. Alguns desses crimes podem até estar prescritos, mas isso tudo mostra que o esquema vem de bem antes. A saída é reforma, não é demonizar o PT”, explica a ex-funcionária.
Investigação
Em 2015, Conceição encaminhou toda a documentação detalhando as propinas para o deputado federal Jorge Solla (PT-BA). Solla apresentou tudo em dois âmbitos: na Polícia Federal e na CPI da Petrobras.
Os documentos foram entregues ao delegado Bráulio Galloni, que, por sua vez, remeteu tudo para Curitiba, sede da força-tarefa da Lava Jato. Atualmente, estão na Delegacia de Repressão a Crimes Financeiros da Polícia Federal.
Outro Lado
O deputado federal Antonio Imbassahy afirmou que é “um despropósito” a menção ao seu nome na “Relação de Parceiros” da Odebrecht. “Como homem público sempre tive uma relação baseada na decência com a Odebrecht e com qualquer empresa.”
O prefeito de Manaus, Artur Virgílio Neto, enviou nota ao UOL, na qual afirma:
“Meu pai, que tinha nome igual ao meu, era, nessa época, um simples senador cassado. Eu era um ex-deputado, prefeito de Manaus entre 1989 e 1992, distante dos governos federais desse período, que nunca se relacionou com a empresa Odebrecht.
Não fui e não sou parceiro de empresas e, em meio a esse charco todo, sempre me mantive nos limites da seriedade pública.
Considero no mínimo precipitada a formulação da pergunta sobre “propina”. Equivaleria a eu perguntar ao jornalista se ele vende opinião em matérias ou artigos. Perdoe-me a dureza, mas sou cioso do patrimônio de honradez que herdei e que transmito aos meus filhos.
Desviar o foco dessa lama que vem cobrindo o Brasil pode terminar servindo de válvula de escape para os que têm culpa real nos desmandos éticos que desmoralizam o Brasil.
Nos meus dois mandatos de prefeito, não houve nenhuma obra dessa empresa [Odebrecht]. Espero, sinceramente, que um veículo do peso e da respeitabilidade de vocês saiba respeitar a honra de quem a possui.”
Advogado responde por Lobão e Sarney
O advogado criminalista Antonio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, negou que seus clientes, o senador Edison Lobão (PMDB-MA) e a ex-governadora Roseana Sarney, tenham cometido qualquer ato ilícito.
“O Brasil passa por um momento de criminalização da política. Isto é muito grave. Vamos afastar da atividade política, que é essencial para qualquer país, as pessoas de bem. E a delação passou a ser prova para incriminar, sem sequer investigar. Um país punitivo não serve para a democracia. A palavra do delator normalmente é falsa e estranhamente seletiva.”
O senador Fernando Collor, por meio de sua assessoria de imprensa, negou que tenha recebido “contribuições de empresas que não fossem legítimas doações de campanha” e afirmou que não se manifestará “sobre listagem apócrifa”.
O UOL ligou para os telefones do senador Jader Barbalho (PMDB-PA) e de seus assessores, mas ninguém atendeu aos telefonemas. A assessoria do TCU não respondeu aos questionamentos da reportagem. O UOL não conseguiu contato com Fernando Sarney e José Sarney Filho.
*Colaboraram Flávio Costa, Fabiana Maranhão e Ricardo Marchesan

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