Haitianos escolhem cidade para recomeçar a vida


Refugiados encontram na construção civil local a chance de sustentar as famílias que ficaram para trásMILENE GÓES 


Um pouco mais de dois anos após o terremoto que devastou o Haiti e matou mais de 200 mil pessoas, milhares de haitianos ainda têm esperança de uma vida melhor. Trabalhar e estudar estão nos planos de quem perdeu família, amigos e emprego. O Brasil tornou-se refúgio para muitos que sofreram com a miséria e Sorocaba não ficou de fora da rota daqueles que buscam recomeçar a vida.

Desde março do ano passado, um grupo de pelo menos 25 haitianos escolheu a cidade para morar e trabalhar. A construção civil acabou sendo o destino da maioria deles. Outros estão vindo aos poucos e se espalhando pelo município.

Ainda tímido e com um sotaque que mistura espanhol e português, Jaequessaint Caméus, 33 anos, deixou para trás a mulher e três filhos – a mais nova com apenas três anos de idade. “Vim guiado por Deus”, afirma.

Professor de francês com fluência em espanhol,  Jaequessaint deixou no Haiti também os alunos.  Em Sorocaba conseguiu emprego em uma empreiteira e trabalha como carpinteiro. Ganha R$ 800 por mês, dinheiro que se mantém aqui e ainda manda uma parte para a família. “O salário não dá para quase nada, mas preciso sustentar a família, já que no Haiti não sobrou quase nada.” 

Desde que chegou ao Brasil, o professor, hoje  carpinteiro por necessidade, não viu mais a mulher  e os filhos. O contato é apenas por telefone. Jaequessaint, no entanto,  afirma que ainda quer trazê-los para morar em Sorocaba. O único problema é o valor da passagem. O custo chega a R$ 2 mil e sai das possibilidades financeiras dele.

dificuldade com a língua/ O Acre foi o primeiro Estado que os haitianos pisaram ao chegar no Brasil. Lá eles conseguiram passagem até Sorocaba. Legalizados junto à Polícia Federal, tiveram a  possibilidade de se encaixar no mercado de trabalho local. “O povo brasileiro nos recepcionou muito bem”, diz Jaequessaint.

Em solo português, o grupo de haitianos não conseguia se comunicar. O único que tinha mais habilidade era justamente Jaequessaint.

Na visita do BOM DIA à empreiteira  onde hoje eles  trabalham, no bairro Ipatinga, zona oeste, era ele quem traduzia as perguntas aos colegas e também às respostas. Receosos, evitaram  falar sobre assustos pessoais. Apenas diziam que queriam uma vida melhor.

No trabalho, usam um dicionário para tentar entender o que os brasileiros dizem. Atualmente,  já estão até arriscando contato com a literatura portuguesa.

Mão de obra haitiana vai para a  construção civil

A mão de obra haitiana na construção civil em Sorocaba ainda não é muito comum. Eles vêm aos poucos e encontram trabalho em construtoras e empreiteiras, como afirma o diretor do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção Civil e do Mobiliário de Sorocaba e Região, João Donizetti Martins. 

Segundo ele, os haitianos trabalham nas mesmas condições que os brasileiros: são registrados de acordo com as legislações da CLT, recebem salário compatível com as funções que exercem e ganham cesta básica e refeição no local de trabalho. “Nunca recebi denúncia de trabalhos irregulares, mas também nunca descartamos a possibilidade”, relata.

Ainda segundo o sindicalista, não há como saber o número exato de haitianos que estão trabalhando na construção civil. “Não temos esses dados, pois cada um é registrado em uma função”, justifica. 

Donizetti afirma que eles podem ser registrados como pedreiro, ajudante, servente, carpinteiro, entre outros e não existe somente uma faixa salarial, varia de R$ 979 a R$ 1.168,20. 

Mão de obra brasileira / Como os haitianos estão chegando aos poucos na cidade, os nordestinos e até paranaenses tomam conta da construção civil em Sorocaba.  Conforme o diretor do Sindicato da Construção Civil, a demanda está grande em todo o Estado de São Paulo e em Sorocaba. A falta de mão de obra aqui faz com que trabalhadores de outros estados migrem para a cidade. “Em dez anos o número de construções na cidade dobrou. Precisamos cada vez mais de mão de obra”, diz. 

De acordo com Donizetti, a tendência é a demanda aumentar ainda mais com construções de empreendimentos e de condomínios residenciais no município. “Os haitianos serão bem-vindos para ajudar com a mão de obra”, finaliza.

Situação dos haitianos no Brasil

De acordo com o Ministério da Justiça, depois de  12 de janeiro deste ano, o governo brasileiro criou um canal direto para regularizar a estadia dos haitianos no país. São emitidos vistos  sem exigência de vínculo empregatício. Eles estão sendo regularizados pelo Ministério do Trabalho

5.200 
haitianos vieram para o Brasil após o terremoto de 2010

Vistos
São concedidos por mês cerca de cem vistos para trabalho. O documento também pode ser para estudo ou turismo.  O governo brasileiro concede ainda vistos para familiares diretos, como pai, mãe, filhos e maridos/mulheres.

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