Coordenador de comissão questiona Lei da Anistia


Mais direto que em outras vezes, Paulo Sergio Pinheiro afirma que perdões autoconcedidos no Brasil ‘não são aceitos em cortes internacionais’


Roldão Arruda - O Estado de S. Paulo
SÃO PAULO - Em comentário sobre a Lei da Anistia de 1979, o atual coordenador da Comissão Nacional da Verdade, sociólogo Paulo Sérgio Pinheiro, disse nesta terça-feira, 2, em São Paulo que o Brasil deveria seguir as regras de tribunais internacionais, para os quais a autoanistia não é aceitável.
"Sentenças de tribunais internacionais devem ser cumpridas", afirmou, referindo-se a uma sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos, com a recomendação para que o Brasil reveja a lei, promulgada ainda durante o período do regime militar. Pinheiro também disse que não se pode esquecer que, "no governo de Fernando Henrique houve uma luta grande para que o Brasil reconhecesse a jurisdição da Corte Interamericana".
Ele se referia ao fato de, em 1998, na comemoração dos 50 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos, o então presidente ter sancionado a decisão do Congresso que reconheceu a jurisdição da Corte.
Ao mencionar que a Lei da Anistia foi promulgada ainda durante a vigência do regime militar (1964-1985), o coordenador disse: "Autoanistias não são aceitas em cortes internacionais".
Posição pessoal. Pinheiro enfatizou por duas vezes, no início e no fim de suas observações, que elas refletem sua posição pessoal e não a da comissão. Diplomático, também disse que o grupo que coordena não representa o Estado e não cabe a ele tomar decisões ou fazer manifestações sobre o assunto.
Referiu-se, por fim, ao fato de ter atuado durante oito anos na Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos, fato que o aproximou bastante daquele sistema.
Desde que assumiu o cargo de coordenador da comissão, porém, ele ainda não havia falado de maneira tão incisiva sobre a questão da anistia, que provoca polêmicas nos meios jurídicos e políticos. De acordo com a lei de 1979, foram anistiados no Brasil tanto perseguidos políticos pela ditadura quanto seus perseguidores, os agentes de Estado.
Contestada no Supremo Tribunal Federal pela Ordem dos Advogados do Brasil, essa interpretação foi ratificada pelo Supremo em abril de 2010. Essa manifestação, porém, não interrompeu os debates sobre a questão.
Os defensores da revisão da lei ganharam mais força em novembro daquele ano, quando a Corte Interamericana, ao condenar o Brasil a uma série de reparações no caso da Guerrilha do Araguaia, recomendou que a Lei da Anistia seja revista - uma vez que, tendo sido promulgada ainda durante o regime militar, é tida como autoanistia.
Para Pinheiro, a atual interpretação da lei não ajuda nem atrapalha os trabalhos da Comissão. "Nossa principal tarefa é indicar responsabilidades e autorias das graves violações de direitos humanos que ocorreram no Brasil. Não vamos julgar ninguém. Sob esse ponto de vista, a Lei da Anistia não ajuda nem atrapalha." 

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