Presidente supera Dilma e Lula com 1,16 medida com
força de lei por semana; parlamentares reclamam e Planalto alega ‘urgência
econômica’
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Marianna Holanda, O Estado de S.Paulo
09
Janeiro 2018 | 23h00
Em pouco mais de um ano e meio de mandato, o
presidente Michel Temer superou seus antecessores e alcançou o posto de
recordista em edição de medidas provisórias (MPs) desde 2001. Levantamento
feito pelo Estado mostra que o emedebista editou, em média,
mais de uma MP por semana (1,16). Números que superam os índices já considerados
altos dos petistas Luiz Inácio Lula da Silva, com 1,09 MP por semana, e Dilma
Rousseff, que fechou seu governo com 0,78.
Só na última semana
do ano passado, Temer editou seis medidas provisórias, alcançando 91 desde maio
de 2016 – 39 foram convertidas em lei e a maioria, 44, ainda está em
tramitação. Criticado pela Procuradoria-Geral da República e deputados
federais, o instrumento tem força de lei e deve ser usado, segundo a
Constituição, em casos de relevância e urgência.
Nesta terça-feira, 9, a Coluna do Estadão revelou que o presidente do Senado,
Eunício Oliveira (MDB-CE), deu ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ),
prazo de sete dias para recebimento das MPs antes do vencimento –
uma medida tem força de lei por 45 dias e, após esse período, caduca.
O Planalto, em nota,
alegou que, em função do “tempo de governo limitado e pela urgência das ações
econômicas, as medidas provisórias se fazem necessárias”. A discussão sobre o
tema chega ao Congresso e divide os partidos que apoiam e os que são contrários
ao governo. Para a oposição, há abuso na edição das medidas. Já líderes da base
defendem o instrumento para burlar a suposta burocracia no andamento de
propostas.
Para o deputado Chico
Alencar (PSOL-RJ), a edição recorde de MPs revela uma “voracidade” do governo
em desmontar situações criadas pela gestão anterior. “O governo abusa das MPs
por não poder contar com o rito normal do Legislativo e por depender de uma
base gulosa”, disse. Também da oposição, o deputado Carlos Zarattini (SP)
afirmou que o governo não tem perspectiva de continuidade e o excesso dessas
medidas trava a pauta.
Na base do governo, o
deputado Arthur Lira (PP-AL) reconheceu que houve aumento “maior do que
razoável” no envio de MPs e algumas matérias poderiam ter sido propostas como
projeto de lei. Já o deputado Efraim Filho (PB), líder do DEM, avaliou que MPs
ajudam a dar celeridade às propostas. “Esse governo se propôs desde sempre a
ser um governo de travessia. Por isso a celeridade das MPs para aprovar as
transformações propostas.”
Economia. Cerca de 80% das medidas envolvem temas de origem
econômica e tributária ou tratam de vários assuntos juntos. Um exemplo é a MP
da Privatização da Eletrobrás (814), de 28 de dezembro de 2017.
Com o objetivo de
retirar da lei o trecho que proíbe a desestatização da empresa, a medida
suscitou novas críticas do aliado e presidente da Câmara, Rodrigo Maia
(DEM-RJ), que já vinha falando em abuso de MPs.
“Medidas provisórias devem ser apenas para matérias
relevantes e urgentes. A venda de um ativo precisa do aval do Congresso antes.
Vivemos em uma democracia”, afirmou o presidente da Câmara ao Estado.
Além de Lula e Dilma, outras gestões também tiveram
médias inferiores, mas, como houve uma mudança nas regras em 2001, essas MPs
mais antigas foram desconsideradas pelo Estado.
Em 2001, uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) barrou a “farra das MPs”,
em que medidas eram reeditadas até passarem no Congresso.
As médias semanais de
José Sarney, Fernando Collor, Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso são
inferiores à de Temer, mas esse número pode mudar, se forem consideradas as
reedições de cada medida.
Foro. Uma das MPs que mais provocaram polêmica foi
a que deu status de ministério à Secretaria-Geral da Presidência – e, assim,
foro privilegiado a Moreira Franco (MDB), que comanda a pasta e foi citado na
delação da Odebrecht. O instrumento escolhido pelo presidente foi contestado no
Supremo Tribunal Federal pelo então procurador-geral, Rodrigo Janot, que alegou
falta de urgência.
Temer apresentou duas
MPs, uma vez que a primeira corria risco de caducar pela demora do Congresso em
avaliá-la. Mais recentemente, em dezembro, a atual procuradora-geral, Raquel
Dodge, também alegou inconstitucionalidade da lei gerada pela segunda medida.
Outro
momento em que o governo tentou emplacar mudanças via MP, mas desistiu, foi com
a proposta de extinção da Reserva Nacional de Cobre e seus Associados (Renca),
entre Pará e Amapá. A pressão veio de ambientalistas e celebridades. Apesar da
desistência da extinção da Renca, a MP virou lei. / COLABORARAM CECÍLIA DO LAGO e RICARDO
GALHARDO
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