Milícia faz matança em Salvador, diz polícia


Paramilitares aproveitam greve da PM para assassinar usuários de drogas, sem-teto e desafetos, segundo investigação

Para departamento, de 157 homicídios no período da paralisação, ao menos 38 tiveram 'paisanos' como autoresGRACILIANO ROCHA
DE SALVADOR
ROGÉRIO PAGNAN
FÁBIO GUIBU
ENVIADOS ESPECIAIS A SALVADOR
A greve de PMs na Bahia abriu terreno para milícias praticarem uma matança na periferia de Salvador.
Os alvos são usuários de drogas, moradores de rua e desafetos dos grupos armados que detêm o controle, de fato, de áreas mais violentas.
As milícias baianas são grupos paramilitares bancados por comerciantes para manter a ordem na periferia.
A inteligência da Polícia Civil já detectou que os grupos operam sob proteção de policiais em áreas como Subúrbio Ferroviário, aglomerado de bairros e favelas vizinho à baía de Todos os Santos.
"Esses grupos estão se aproveitando da greve, que reduziu o policiamento, para 'limpar' a área e matar quem estava incomodando", disse à Folha o diretor do Departamento de Homicídios e Proteção a Pessoa, Arthur Gallas.
Segundo ele, há evidências de que milicianos e traficantes de drogas tenham assassinado pelo menos 38 pessoas desde o início da greve da PM, no dia 31 de janeiro.
Até ontem, foram 157 homicídios em Salvador e na região metropolitana.
MORTES EM SÉRIE
Ontem, a Polícia Civil anunciou a prisão de dois PMs suspeitos de integrar um esquadrão da morte responsável pela chacina de cinco moradores de rua na Boca do Rio, em 3 de fevereiro. São eles os soldados Donato Lima, 47, e Willen Carvalho, 34. Outros dois suspeitos estão foragidos.
Os crimes seguem um padrão. Em geral, as vítimas são surpreendidas na rua, durante a noite, por homens armados com pistolas calibres 380 ou.40 (usada pela polícia na Bahia). Chegam de carro, em grupos de três a seis pessoas.
No dia 8, Fabio Sousa e seu primo Anderson Lima abasteciam a moto num posto da Ribeira quando homens desceram de um Siena e um Palio e abriram fogo. Sousa tentou correr e caiu. Foi morto no chão. Lima levou tiros no peito, no braço e na perna, mas conseguiu fugir.
No Lobato, no Subúrbio Ferroviário, quatro usuários de drogas ou suspeitos de pequenos crimes apareceram mortos nos últimos dias.
Nos últimos dias, a Folha percorreu bairros onde ocorreram crimes com características de extermínio. Os milicianos são chamados de "paisanos", referência aos trajes civis dos seguranças.
Sem PM nem Exército, o comércio do bairro São Caetano operava com portas fechadas por medo de saques. No local, os "paisanos" reinam.
Sob a condição de não serem identificados, comerciantes disseram que a proteção custa de R$ 20 a R$ 100 por semana. O dono de uma loja de sapatos disse que paga porque se sente coagido.
Na avenida Jorge Amado, onde houve a chacina da Boca do Rio, dois lojistas aceitaram conversar com a Folha.Um admitiu pagar R$ 60 por mês pela segurança. O outro encerrou a entrevista quando foi perguntada sobre a proteção privada dos "paisanos".
Colaborou SÍLVIA FREIRE, de São Paulo

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