Governo já discute redução de superávit primário para estimular o crescimento


Possibilidade é vista como ‘plano B’, no caso de agravamento da crise global; novas desonerações tributárias também estão em estudo


Adriana Fernandes e Lu Aiko Otta, de O Estado de S. Paulo
SÃO PAULO / BRASÍLIA - O governo pode reduzir o esforço fiscal previsto para este ano para estimular um crescimento maior da economia. Segundo apurou o ‘Estado’, essa possibilidade está em discussão na equipe econômica e é considerada uma espécie de plano B, caso a crise internacional se intensifique e as medidas já anunciadas de estímulo ao crédito e ao consumo sejam insuficientes para atingir o novo objetivo: crescer mais do que os 2,7% de 2011.
Tema tabu - e definido como "coisa do demônio" por alguns economistas do governo -, a hipótese de fechar as contas com saldo menor para pagamento de juros da dívida, o chamado superávit primário, ganhou espaço nas discussões. A mudança daria mais fôlego para o governo adotar medidas de estímulo, como o aumento das despesas totais (não apenas os gastos com investimentos, mas também de custeio), mesmo num cenário de desaceleração da arrecadação.
O governo também quer abrir espaço para novas desonerações tributárias, medida que a presidente Dilma Rousseff considera fundamental para ajudar as empresas. O problema é que a arrecadação está fraca e o governo acaba tendo de recorrer, cada vez mais, às receitas extraordinárias para fechar as contas.
A equipe econômica também já aceita a hipótese de dar algum tipo de compensação aos Estados e municípios pela perda de arrecadação com as desonerações feitas com o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), tributo federal cuja arrecadação é compartilhada com governadores e prefeitos.
O ministro da Fazenda, Guido Mantega, que antes era refratário à flexibilização da política fiscal, agora reconhece internamente que a medida poderá ser necessária. Ele tem insistido que, em momentos de crise, a austeridade fiscal a todo custo, como tem sido a opção na Europa, acaba sendo um entrave. A avaliação é que o Brasil está com uma política fiscal sólida e uma flexibilização não comprometerá a sua credibilidade.
Semelhante. "A receita contra a crise é muito semelhante à que usamos em 2009", disse uma fonte do governo. Em 2009, quando a economia brasileira sofreu um baque por causa dos efeitos da crise, o governo Lula reduziu a meta fiscal de 3,8% para 2,5% do Produto Interno Bruto (PIB).
Desde o início do governo de Dilma, cumprir a meta de superávit de 3,1% do PIB, sem descontar os investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), foi considerado ponto de honra para o ministro Mantega. Afinal, essa era a contrapartida para ajudar o Banco Central a reduzir a taxa de juros.
Mas, dizem fontes do governo, a determinação em fazer o "primário cheio" contraria a avaliação até mesmo de alguns analistas do mercado financeiro, que afirmam que um resultado próximo de 2,5% do PIB seria suficiente para manter a trajetória de queda da dívida pública. A redução dos juros e a alta do dólar também ajudarão a reduzir o endividamento, e o resultado poderá ser ainda menor, sem que isso comprometa a dinâmica da administração da dívida.
Apesar disso, a ordem era fazer o primário cheio. Não havia espaço para outra alternativa. Mas essa diretriz começou a se tornar um problema quando ficou evidente a necessidade de adotar novas medidas de estímulo à economia - como liberar recursos para os investimentos ou conceder desonerações tributárias.
Obstáculo. As desonerações enfrentam um obstáculo adicional: a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). O governo quer ampliar a desoneração da folha a outros segmentos da indústria, mas é impedido pelo artigo 14 da LRF. Esse dispositivo diz que benefícios tributários só podem ser concedidos se estiverem previstos no orçamento do ano em curso ou se houver compensação pelo aumento de alíquotas dos tributos existentes ou criação de impostos e contribuições.
As desonerações concedidas na segunda etapa do Brasil Maior, por exemplo, foram compensadas com o aumento do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) do setor de bebidas. A ampliação da lista, portanto, depende de outras elevações tributárias. Daí a ideia de elevar o IPI sobre aparelhos de ar condicionado e micro-ondas, além das motocicletas importadas. Isso abriria espaço para atender às demandas de outros setores para ter a folha desonerada.
Segundo o ministro Mantega, o corte do IPI de automóveis não precisou ser compensado com a alta de outros impostos.
  

Postar um comentário

0 Comentários