10 de julho de 2016 às 14h22
Da Redação, com Garganta Profunda*
Como parte de uma investigação feita pela blogosfera sobre uma mansão sem dono aparente, numa praia de Paraty, Rio de Janeiro, o Viomundo ajudou a desvendar:
1. O casarão de concreto, merecedor de um prêmio de arquitetura, está em nome de uma certa Agropecuária Veine Patrimonial, em sociedade com a Vaincre LLC, de Nevada, nos Estados Unidos.
2. A Vaincre foi criada pela Mossack & Fonseca, escritório panamenho especializado em montar empresas de fachada;
3. A herdeira de João Roberto Marinho, Paula, neta de Roberto Marinho, teria pago as taxas de manutenção da Vaincre e de duas outras offshore, a Juste International (ilhas Seychelles) e a A Plus Holdings (Panamá). Os indícios estão em papéis apreendidos na sede da Mossack em São Paulo, revelados pelo Viomundo. O nome de Paula aparece abaixo da anotação FPB Bank Inc.
4. Em nota, um dos donos do Grupo Globo, João Roberto Marinho, pai de Paula, disse que a família não tem relação com a mansão ou com as offshore, atribuídas por ele ao genro, Alexandre, do qual Paula se separou em 2015.
5. Segundo os Panama Papers, Lúcia Cortês Pinto, que oficialmente é a titular da offshore Juste International, aparece relacionada a um endereço no bairro de La Victoria, em Lima, no Peru. Uma investigação paralela à Lava Jato, no Peru, descobriu que empresas brasileiras usavam a legislação daquele país como forma de sonegar impostos no Brasil.
6. Alexandre, ex-genro de João Roberto Marinho, tem negócios relativamente modestos no Rio de Janeiro. É concessionário do estádio de remo da Lagoa Rodrigo de Freitas, onde foram construídos seis cinemas, alguns restaurantes e uma casa noturna. O esquema acima descrito parece ser extremamente sofisticado para um empresário de faturamento modesto. Uma hipótese é que o laranjal tenha servido a alguém que absolutamente não pode parecer.
7. A constituição das empresas cujos nomes aparecem associados a Paula Marinho nos papéis da Mossack dá indícios disso. A Vaincre LLC tirou proveito da legislação de Las Vegas, Nevada, que permite que tanto o administrador quanto o gerente de uma empresa sejam outras empresas sem dono definido. É uma dupla parede de proteção. No caso da Juste, Lúcia Cortês Pinto aparece no certificado de estabelecimento da offshore, mas os diretores são duas outras empresas protegidas por sigilo.
Agora, a operação Caça Fantasmas, um desdobramento da Lava Jato, descobriu dois acionistas da TV Verdes Mares, afiliada da Globo no Ceará, como clientes do banco clandestino FPB, que servia à Mossack & Fonseca.
O FPB era utilizado pela Mossack para obter clientes no Brasil.
Na página 21 do relatório (ver abaixo) da Polícia Federal aparece a Adlon International Foundation. Na página 22 surge a Formula VIII Holdings Corporation.
As duas entidades fazem parte de uma lista de 44 empresas:
São 44 (quarenta e quatro) empresas offshore “negociadas” pelo FPB BANK em território nacional (todavia não se sabe exatamente quais estão abertas), o que não deixa dúvida acerca da atuação ilegal da instituição financeira no Brasil. À partir dessa etapa da investigação, considerando a grande quantidade de empresas offshore vinculadas ao FPB BANK e seus representantes brasileiros, bem como as respectivas datas de registro, surgem indícios de que a instituição financeira ilegal (i) atuaria como intermediário na constituição e registro de offshore para seus clientes, oportunidade em que também figuraria como responsável/contato pela empresa, com o propósito de auxiliar a ocultação dos verdadeiros sócios; e (ii) constituiria a denominada offshore de gaveta, que seria vendida posteriormente ou simplesmente utilizada em determinadas transações comerciais e/ou financeiras.
O cruzamento dos dados obtidos pela Caça Fantasmas com os Panama Papers revela que a Adlon está em nome de Manoela Valença Queiroz Bacelar Paiva e a Formula VIII em nome de Otavio Valença Queiroz.
Ambos são acionistas da TV Verdes Mares, afiliada da TV Globo no Ceará, pertencente ao Grupo Edson Queiroz.
Curiosamente, os papéis da Caça Fantasmas não mencionam a Vaincre LLC, a Juste International ou a A Plus Holdings, embora a lista manuscrita apreendida na sede da Mossack na avenida Paulista relacione o FPB Bank às empresas e a Paula Marinho.
NO CASO HSBC
Integrantes do Grupo Edson Queiroz já haviam aparecido, com outros empresários de mídia, nos dados vazados do banco HSBC, como titulares de contas na Suiça.
O Globo noticiou:
Nos documentos, constam os nomes de proprietários do Grupo Folha, ao qual pertence o UOL. Tiveram conta conjunta naquela instituição os empresários Octavio Frias de Oliveira (1912-2007) e Carlos Caldeira Filho (1913-1993). Luiz Frias (atual presidente da Folha e presidente/CEO do UOL) aparece como beneficiário da mesma conta, que foi criada em 1990 e oficialmente encerrada em 1998. Em 2006/2007, os arquivos do banco ainda mantinham os registros, mas, no período, ela estava inativa e zerada.
Quatro integrantes da família Saad, dona da Rede Bandeirantes, também tinham contas no HSBC na época em que os arquivos foram vazados. Constam entre os correntistas os nomes do fundador da Bandeirantes, João Jorge Saad (1919-1999), da empresária Maria Helena Saad Barros (1928-1996) e de Ricardo Saad e Silvia Saad Jafet, filho e sobrinha de João Jorge.
Lily de Carvalho, viúva de dois jornalistas e donos de jornais, Horácio de Carvalho (1908-1983) e Roberto Marinho (1904-2003), aparece na lista. Horácio de Carvalho foi proprietário do extinto “Diário Carioca”. Roberto Marinho foi dono das Organizações Globo, hoje Grupo Globo, ao qual pertence O GLOBO. O nome de Lily surge nos documentos com o sobrenome de Horácio, seu primeiro marido, e o representante legal da conta junto ao HSBC é a Fundação Horácio de Carvalho Jr. O saldo registrado em 2006/2007 era de US$ 750,2 mil. Lily morreu em 2011.
Do Grupo Edson Queiroz, dono da TV Verdes Mares e do “Diário do Nordeste”, estão Lenise Queiroz Rocha, Yolanda Vidal Queiroz e Paula Frota Queiroz (membros do conselho de administração). Elas tinham US$ 83,9 milhões em 2006/2007. Edson Queiroz Filho também surge como beneficiário da conta. Ele morreu em 2008.
Luiz Fernando Ferreira Levy, que foi proprietário do jornal “Gazeta Mercantil”, que não existe mais, teve conta no HSBC em Genebra entre os anos de 1992 a 1995.
Dorival Masci de Abreu (morto em 2004), que era proprietário da Rede CBS de rádios (Scalla, Tupi, Kiss e outras), foi correntista da instituição financeira na Suíça entre 1990 a 1998.
João Lydio Seiler Bettega, dono das rádios Curitiba e Ouro Verde FM, no Paraná, tinha conta ativa em 2006/2007. O saldo era de US$ 167,1 mil.
Fernando João Pereira dos Santos, do Grupo João Santos, que tem a TV e a rádio Tribuna (no Espírito Santo e em Pernambuco) e o jornal “A Tribuna” tinha duas contas no período a que se refere os documentos. O saldo delas era de US$ 4,4 milhões e US$ 5,6 milhões.
Anna Bentes, que foi casada com Adolpho Bloch (1908-1995), fundador do antigo Grupo Manchete, fechou sua conta no ano 2000.
O apresentador de TV Carlos Roberto Massa, conhecido como Ratinho e dono da “Rede Massa” (afiliada ao SBT no Paraná) tinha uma conta com sua mulher, Solange Martinez Massa, em 2006/2007. O saldo era de US$ 12,5 milhões.
Aloysio de Andrade Faria, do Grupo Alfa (Rede Transamérica), tinha US$ 120,6 milhões.
SONEGAÇÃO E IMPUNIDADE
Como a blogosfera também revelou com exclusividade, a TV Globo sonegou R$ 183 milhões na compra dos direitos de transmissão da Copa de 2002. Segundo a Receita Federal, o esquema utilizou uma empresa de nome Empire nas ilhas Virgens Britânicas. A emissora simulou investimento externo para a formação da empresa. Em seguida, desfez a Empire e o capital dela foi utilizado para comprar os direitos sem pagar impostos no Brasil. A multa foi de R$ 615 milhões. Segundo revelou o Viomundo, em agosto de 2014 a Globo recolheu mais de R$ 1 bi para saldar a dívida.
As notícias acima reveladas nem sempre são sonegadas pela velha mídia. Podem sair aqui ou ali, de forma parcial, sem o merecido destaque. Quando publicadas assim, em conjunto, deixam claro que os barões da mídia brasileira fazem parte e, portanto, atuam da mesma forma que a elite brasileira: de um lado sonegam ou praticam a chamada a “elisão fiscal”, de outro defendem uma reforma tributária na qual sejam beneficiados — enquanto escondem da população em geral o fato de que o sistema tributário brasileiro é extremamente injusto, cobrando relativamente mais dos que têm menos.
O imposto rural é praticamente inexiste, a exportação de commodities é livre de ICMS por conta da Lei Kandir, barcos e helicópteros não pagam IPVA e as decisões tomadas pelo governo usurpador de Michel Temer apontam na direção do corte de gastos com Saúde e Educação, o que permitirá manter o status quo calcado na injustiça tributária.
Quando o juiz Sergio Moro levantou o sigilo dos grampos do ex-presidente Lula, a Globonews atribuiu o furo de reportagem ao repórter Vladimir Netto. Os áudios incluíam um grampo posteriormente considerado ilegal pelo ministro Teori Zavascki, do STF, por tratar-se de conversa da presidente Dilma Rousseff. Vladimir, filho da jornalista Miriam Leitão, da TV Globo, escreveu um livro sobre a Operação Lava Jato. Moro compareceu ao lançamento. Anteriormente, o juiz de Curitiba já tinha recebido o prêmio Faz a Diferença, do jornal O Globo, na presença de João Roberto Marinho.
Com esta relação incestuosa entre o juiz “salvador da Pátria” e os barões da mídia e apaniguados, é de se esperar que estes sejam investigados ou punidos pela Lava Jato no mesmo grau reservado para outros empresários e políticos?
*Garganta Profunda é jornalista investigativo com duas décadas de experiência contratado pelos leitores do Viomundo para compor a Galeria dos Hipócritas
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