Por Leonardo Attuch e Paulo Moreira Leite
Em determinado momento de sua entrevista ao vivo à TV 247, o economista Ladislau Dowbor, professor da pós-graduação da PUC de São Paulo, sublinha a importância do que está em discussão. "Isso não sai no Fantástico" diz, esclarecendo os caminhos empregados pelos grandes bancos do país para se apossar de fatias cada vez maiores do PIB a partir da recessão promovida pela política econômica de Michel Temer-Henrique Meirelles. "A economia embicou, perdeu em um ano 3,6%. Nos mesmos doze meses, o Bradesco aumentou seus lucros em 25%. E o Itaú aumentou seus lucros em 32% É inviável". Na entrevista ele conta também que, quando recebe a visita de professores estrangeiros, é obrigado a mostrar os documentos do banco onde recebe salários – no caso, Santander – porque ninguém acredita que uma instituição possa, legalmente, cobrar juros anuais de 633,21% no rotativo do cartão de crédito.
Consultor de várias agências da ONU, autor e co-autor de mais de 40 livros publicados, Dowbor está com livro novo na praça: "A Era do Capital Improdutivo – A nova arquitetura do poder: dominação financeira, sequestro da democracia e destruição do planeta". Nesta obra de 313 páginas, o professor passa a limpo a formação da hegemonia do capital financeiro sobre a economia global e particularmente brasileira. Mostra que o sistema financeiro capturou o Congresso brasileiro a partir das regras de campanha eleitoral que permitiram o financiamento do setor privado e a partir de então passou a desenhar regras e leis a sua imagem e semelhança.
Quando lhe perguntam se Dilma foi derrubada em função da política de redução de juros promovida entre 2012 e 2013, em seu primeiro mandato, o professor responde: "não tem dúvida. A partir de maio de 2013 não há mais governo no país". Para Dowbor, "ela (Dilma) não soube resistir. Tinha de baixar os juros. Vamos ter de baixar os juros no futuro. Não podemos manter um sistema que paga ao mês aquilo que no resto do mundo se paga ao ano".
Num esforço necessário de reconstituição das conexões entre a política e a economia no país, na entrevista ele retoma um dos principais capítulos do livro e debate a aprovação e a derrubada do célebre artigo 192 da Constituição de 1988. Recorda que, elaborado pelo industrial e deputado Fernando Gasparian, ali se pretendia criar regras civilizadas para o sistema financeiro, inclusive com um limite ("bastante confortável", nas palavras do professor) de 12% para a taxa de juros. Alvejado pela bancada conservadora desde o primeiro dia, o artigo 192 foi derrubado na década seguinte a partir de um projeto do senador José Serra, do PSDB paulista. Ladislaw Dowbor localiza no governo de Fernando Henrique Cardoso (1994-2002) o nascimento do atual rentismo brasileiro (ele emprega o termo " agiotagem"). Lembra que, para compensar as perdas que os bancos teriam com o fim da hiperinflação, criou-se a atual mercado de títulos públicos, destinado a remunerar aquela camada superior de nossa pirâmide social que tem recursos para especular com títulos do Tesouro numa escala nunca vista.
No depoimento, Dowbor descreve uma lógica coerente em seus efeitos perversos: "quando o sistema drena recursos da capacidade produtiva, paralisa as empresas. Quando drena a capacidade de compra das famílias, paralisa a demanda. Quando paralisa a demanda, reduz os impostos e gera crise fiscal".
Nesse sistema, a população se divide numa pequena parcela, que tem reservas financeiras e pode fazer compras à vista, e a grande maioria de trabalhadores, assalariados de baixa renda e profissionais mal remunerados, que não tem poupança e é obrigada a fazer compras a prazo – quando uma mercadoria idêntica custa 150% a mais. "Uns pagam 1200 reais por uma geladeira. Outros, 2400."
Perguntado sobre a redução de juros promovida pelo Banco Central a partir da posse de Temer, ele diz que a taxa do COPOM continua muito distante daquilo que se oferece aos clientes – sejam consumidores, sejam empresários – num patamar sem paralelo daquilo que se oferece na Europa e nos Estados Unidos, onde os bancos "se dão muito bem com juros de 2% ou 3% ao ano."
Assista à entrevista na íntegra:
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