Doria pode deixar 9 mil famílias rurais sem assistência na pandemia, diz associação

 


Projeto apresentado pelo governador prevê fechamento da Fundação Instituto de Terras do Estado de São Paulo (Itesp)

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |
 

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Segundo os servidores, Itesp presta assistência o 140 assentamentos rurais distribuídos por todo o estado e a mais de 1.400 famílias quilombolas - Ana Carolina A. Fernandes/Conaq

Em meio à pandemia do novo coronavírus, o governador João Doria (PSDB) pode deixar 9 mil famílias rurais e quilombolas sem assistência e 500 funcionários sem emprego com a tentativa de extinção da Fundação Instituto de Terras do Estado de São Paulo José Gomes da Silva (Itesp), responsável pela implementação da política agrária e fundiária do estado. O alerta foi feito pela Associação de Funcionários do Itesp (Afitesp). 

A extinção do Itesp está prevista no Projeto de Lei 529, apresentado pelo governador na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) na última semana.  Em nota, a Afitesp aponta que o projeto  compromete a segurança e soberania alimentar do estado.

“O cenário que se impõe torna imperativo o massivo investimento estatal em geração de empregos, garantia da saúde da população e promoção do bem-estar social como instrumentos de política anticíclica, capazes de atenuar e reverter os dramáticos efeitos de tal crise sobre o próprio orçamento público e, sobretudo, sobre a população empobrecida", defende a Afitesp em nota.

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Criada em 1991, a fundação presta serviço de Assistência Técnica e Extensão Rural (ATAR) a mais de 7 mil famílias, em 140 assentamentos rurais distribuídos por todo o estado e a mais de 1.400 famílias quilombolas, pertencentes a 36 comunidades remanescentes de quilombos.

Para a Afitesp o fechamento da fundação é um retrocesso com a política pública realizada e um “ato de desrespeito, desprezo pela vida e dignidade humana”, visto que grande parte das atividades desenvolvidas pelo Itesp são realizadas em regiões e municípios de baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) e contribuem para a dinamização da economia urbana e rural de pequenos e médios municípios e, consequente, geração de empregos, distribuição de renda e redução das desigualdades sociais e regionais.

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Outra área que se destaca é a regularização fundiária. Nos últimos anos, foram regularizados mais de 45 mil imóveis, e estão em andamento mais de 115 parcerias com municípios paulistas para regularizar mais de 75 mil. A instituição atua com a regularização de imóveis rurais no Pontal do Paranapanema, Vale do Ribeira e Alto Vale, e colabora para levar segurança jurídica ao campo para agricultores que não podem pagar. Por isso, a extinção do Itesp pode representar também um aumento da violência no campo e impacto na produção de alimentos.

Os representantes dos trabalhadores do instituto, articulados com as outras categorias afetadas pelo PL, lançaram uma campanha nas redes sociais chamada #FicaITESP que inclui também um abaixo assinado

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PL 529/2020

PL 529 prevê o fechamento de dez autarquias e instituições públicas até o início do ano que vem, uma vez que tramita na Alesp em caráter de urgência. No seu lugar, empresas privadas assumiriam os serviços, “poupando” recursos públicos necessários a outras áreas neste momento.  

Além da questão fundiária, assistência a famílias rurais, quilombolas e a própria produção de alimentos, o PL de Doria extingue autarquias responsáveis por moradia e remédio popular, reabilitação para pacientes com câncer, controle de doenças endêmicas, transporte público metropolitano, preservação ambiental. 

Entre elas a Fundação Zoológico, a CDHU (habitação), a EMTU (transporte) e a Superintendência de Controle de Endemias (Sucen), da Fundação para o Remédio Popular (Furp) e Fundação Oncocentro de São Paulo (Fosp), ligadas à saúde pública. 

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De acordo com a reportagem da Rede Brasil Atual, o projeto foi tema de audiência pública virtual da Alesp proposta pela deputada estadual Beth Sahão (PT), em que centenas de servidores das empresas ameaçadas de extinção participaram dura mais de duas horas.

Em todas as histórias relatadas, uma unanimidade: as empresas em questão representam investimento ínfimo do orçamento do estado. Muitas delas sofrem há anos com a falta de recursos, de concursos públicos e prestam atendimento a duras penas graças aos servidores. Mas não representam ônus aos cofres públicos.

O artigo 14 do PL 529 prevê também que o superávit financeiro de autarquias e fundações seja transferido ao final de cada exercício à Conta Única do Tesouro Estadual.

A Academia de Ciências do Estado de São Paulo (Aciesp) alerta que, se aprovado, uma das consequências será a retirada, ainda em 2020, de mais de um bilhão de reais das universidades estaduais paulistas (USP, Unesp e Unicamp) e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), principal fundação de apoio à pesquisa do Brasil. 

Acieps destaca em nota que os fundos da Fapesp não constituem superávit, mas sim reservas financeiras para projetos de pesquisa científica em andamento que, pela sua natureza, são de longa duração, ultrapassando o ano de exercício e denuncia: "A aprovação deste projeto de lei irá causar prejuízos irreparáveis à todas as atividades científicas do estado de São Paulo".

Edição: Leandro Melito

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