Arquivos do extinto Dops, descobertos em Santos,
revelam fúria de vigiar e perseguir cidadãos suspeitos de fazer oposição à
ditadura
Roldão Arruda, de 'O Estado de S.Paulo'
Serão abertos para consultas, a partir desta
semana, arquivos do extinto Departamento de Ordem Política e Social (Dops)
descobertos por acaso, em março do ano passado, em Santos (SP). São 45 mil
fichas e 11.666 prontuários, que estavam apodrecendo numa sala do Palácio de
Polícia.
O material foi transferido para o Arquivo Público
do Estado e agora, após higienizado, recuperado e organizado, será colocado à
disposição de pesquisadores e pessoas interessadas. Trata-se de um acervo que,
embora regional, ajuda a iluminar melhor os porões da ditadura militar.
Ele confirma, em primeiro lugar, a fúria da polícia
política no trabalho de vigiar e perseguir os cidadãos suspeitos de fazer
oposição ao regime. Nem o nome mais ilustre de Santos, Pelé, escapou dessa
fúria: o arquivo tem um prontuário com o nome dele.
Os documentos também revelam
que agentes policiais ligados à repressão não aceitaram a abertura política e a
anistia ocorridas nos anos 80 e, à revelia da lei, continuaram espionando
pessoas que consideravam de esquerda. Embora o Dops tenha sido extinto em 1983,
existem fichas e prontuários no arquivo que datam de 1986 e suspeita-se que
tenham prosseguido até 1988.
Não se trata, porém, de um arquivo íntegro. De
acordo com o historiador Carlos Bacellar, coordenador do Arquivo Público, tudo
indica que, em algum momento, ele passou por uma "limpeza". Já se
constatou a ausência de 160 prontuários. Eles estão mencionados no fichário,
mas não foram encontrados.
O caso mais notório é o do governador Mário Covas.
Por se opor à ditadura, ele foi cassado e lançado na lista dos simpatizantes do
comunismo e tinha seus passos estritamente vigiados. Suspeita-se que, assim
como já ocorreu com outros arquivos mantidos por policiais e órgãos das Forças
Armadas, a "limpeza" se destinou, sobretudo, a proteger os agentes da
repressão de futuras acusações de tortura, desaparecimento e outras violações
de direitos humanos.
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