'Pensava que o crack era meu Deus', diz trabalhador em tratamento.
'Se usar na lavoura, você fica assombrado, vê cobra, vê tudo', afirma outro.
Internados em clínicas de reabilitação, ex-cortadores de cana de Iracemápolis, a 150 km de São Paulo, e de Leme, a 188 km da capital, contam ao G1 como se viciaram no crack e de que forma a droga quase destruiu suas vidas. Relatório da Frente Parlamentar de Enfrentamento ao Crack divulgado na semana passada mostra o avanço da droga no interior paulista e a falta de leitos para tratamento. Os deputados estaduais afirmam que entre os principais usuários estão os lavradores, que se valem da droga para suportar a carga de trabalho.
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Em Iracemápolis - cidade de 20 mil habitantes que abriga uma usina de açúcar e álcool -, dependentes de crack fumam a droga não em uma cracolândia de concreto e asfalto como em São Paulo, mas em bosques e áreas verdes próximas ao centro da cidade. Sem leitos do Sistema Único de Saúde (SUS), a Prefeitura contrata vagas em clínicas particulares - situação semelhante à de boa parte das cidades. O estudo da Assembleia Legislativa mostra que 79% dos municípios consultados não contam com leitos hospitalares do SUS.
O levantamento, feito em 325 dos 645 municípios, revela ainda que nas cidades médias do interior do estado - com população entre 50 mil e 100 mil habitantes - o crack é tão citado pelos prefeitos quanto o álcool como a droga mais usada, com 38% das manifestações.
Cortador de cana em Iracemápolis, um rapaz de 21 anos, que pede para não ser identificado, diz que usava a droga dentro do canavial. "Muitas vezes eu levava o crack para dentro da lavoura, muitas vezes a pessoa levava para mim, chamava para gente usar lá dentro e era direto, não parava. Fora o crack, tinha muitas outras drogas: cocaína, maconha e até bebida alcóolica."
Ao contrário do que dizem os deputados, ele afirma que não dá para usar o crack durante o expediente. "O crack tira totalmente sua força. O pensamento do crack é só no crack. Quanto mais eu uso, mais eu quero. Não tem força física nem mental nem nada." Internado há quatro meses, o rapaz já ajuda na organização interna da clínica e diz que pretende retomar a vida com mais religiosidade ao sair. "Perdi muitas coisas, o respeito da minha mãe, o carinho da minha namorada e o amor dos amigos. Eu pensei que o crack era meu Deus", afirma.
Ao contrário do que dizem os deputados, ele afirma que não dá para usar o crack durante o expediente. "O crack tira totalmente sua força. O pensamento do crack é só no crack. Quanto mais eu uso, mais eu quero. Não tem força física nem mental nem nada." Internado há quatro meses, o rapaz já ajuda na organização interna da clínica e diz que pretende retomar a vida com mais religiosidade ao sair. "Perdi muitas coisas, o respeito da minha mãe, o carinho da minha namorada e o amor dos amigos. Eu pensei que o crack era meu Deus", afirma.
Ex-cortador de cana em Leme, José Rafael de Oliveira, de 25 anos, está para terminar o tratamento de seis meses a que se submeteu para se ver livre da dependência. "Chegou ao ponto de eu não conseguir manter minha casa. Com o tempo passando, eu perdi minha esposa e minha filha para o Conselho Tutelar. Quem recuperou foi minha mãe", diz.
Oliveira também conta que usava o crack apenas fora do horário de serviço. "O crack tira a dor do corpo, só que não serve para trabalhar. O crack deixa você assustado. Se você estiver usando durante o trabalho em uma lavoura, você não vai conseguir trabalhar. Você vai ficar assombrado, vai ver cobra, vai ver tudo", afirma.
Colega de Oliveira na mesma clínica e lavrador desde os 8 anos de idade, Adenilson Donizeti Ivo, de 31, também se submeteu a tratamento para largar o crack. "Eu usava a droga desde 1999, mas apenas depois de deixar a lavoura. O crack é ruim para trabalhar. Hoje os fiscais ficam no pé e, se pegarem, mandam embora sem direito a nada", afirma.
Nascido no Ceará, o cortador José Alves, de 33 anos, trabalha em lavoura de cana na região de Iracemápolis e conta que é comum a presença da droga no ambiente de trabalho. "Eu nunca usei, mas já vi usarem. Aqui mesmo eu ainda não vi, mas já vi em Balbinos e em Santa Cruz. Tem cara que só trabalha quando usa, mas quando acaba o efeito, acaba se entregando", afirma.
Nascido no Ceará, o cortador José Alves, de 33 anos, trabalha em lavoura de cana na região de Iracemápolis e conta que é comum a presença da droga no ambiente de trabalho. "Eu nunca usei, mas já vi usarem. Aqui mesmo eu ainda não vi, mas já vi em Balbinos e em Santa Cruz. Tem cara que só trabalha quando usa, mas quando acaba o efeito, acaba se entregando", afirma.
Psicólogo responsável pela clínica onde Oliveira e Ivo estão internados, em Artur Nogueira, Lucas Castanheira afirma que os seis estabelecimentos privados mantidos em convênio com prefeituras locais atendem cerca de 180 pacientes - a maioria deles dependentes de crack. Ele afirma que os pacientes são cada vez mais jovens.
"Mudou um pouco o perfil do dependente. As pessoas chegam muito mais cedo para tratamento em função do uso do crack. As crianças têm um contato primeiro com o crack. Hoje existem também muitos poliusuários, que usam crack, cocaína, álcool e maconha", afirma. Segundo ele, na maioria das vezes, são as prefeituras que pagam o tratamento, que custa em média entre R$ 9 mil e R$ 12 mil mensais.
"Primeiro precisamos tratar da prevenção porque não adianta a gente só tratar do problema já instalado. Mas como isso não foi feito, precisamos de mais apoio dos governos estadual e federal, pois a verba é muito pouca", diz.
Coordenador da Promoção Social de Iracemápolis, Nivaldo Antonio Conti afirma que a cidade mantém seis vagas em instituições privadas - via convênio - para tratar dependentes, ao custo de aproximadamente R$ 50 mil por ano.
O atendimento segue critérios sociais ou obedece a determinações judiciais. A Prefeitura de Iracemápolis também mantém um programa de auxílio a 30 famílias de dependentes, ao custo de R$ 30 mil anuais. Nivaldo afirma que o ideal é ter uma unidade dos Centros de Atenção Psicossocial (Caps Ad). Ele afirma que o Ministério da Saúde banca o investimento, mas a cidade teme não ter recursos para gantir o custeio da unidade.
Campanhas de prevenção
O diretor de comunicação da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica), Ademar Altieri, afirma que o setor emprega cerca de 1 milhão de pessoas e realiza campanhas de prevenção do uso de drogas dentro dos canaviais.
Em nota, a direção da Usina Iracema informa ter realizado junto aos cerca de 2 mil colaboradores e familiares ações contínuas preventivas e de conscientização voltadas ao combate às drogas, alcoolismo e tabagismo por meio de palestras e campanhas educativas.
O diretor de comunicação da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica), Ademar Altieri, afirma que o setor emprega cerca de 1 milhão de pessoas e realiza campanhas de prevenção do uso de drogas dentro dos canaviais.
Em nota, a direção da Usina Iracema informa ter realizado junto aos cerca de 2 mil colaboradores e familiares ações contínuas preventivas e de conscientização voltadas ao combate às drogas, alcoolismo e tabagismo por meio de palestras e campanhas educativas.
A empresa diz que todos os empregados têm registro em carteira profissional e usufruem de assistência médica, odontológica e campanhas de vacinação. Afirma ainda que não há utilização de mão de obra terceirizada.
A nota diz que a usina possui atualmente um índice médio de 85% de colheita mecanizada e sem queima, e que até 2014 essa marca chegará a 100% em todas as áreas mecanizáveis. "Infelizmente, a questão do avanço do uso do crack é um problema social que atinge diversos segmentos da sociedade e não apenas um setor", informa a nota.
A nota diz que a usina possui atualmente um índice médio de 85% de colheita mecanizada e sem queima, e que até 2014 essa marca chegará a 100% em todas as áreas mecanizáveis. "Infelizmente, a questão do avanço do uso do crack é um problema social que atinge diversos segmentos da sociedade e não apenas um setor", informa a nota.
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