
Em entrevista exclusiva a Alex Solnik, Eduardo Suplicy afirma que Michel Temer “faltou com a lealdade com a presidenta” ao apoiar o impeachment e, por ser “corresponsável pelo governo”, também deveria ser processado, tal qual a presidente, embora não veja motivo que o justifique: “Eu acho muito triste que um grande número de senadores esteja votando para que ela perca o seu mandato”. “É lamentável que alguns senadores estejam colocando o seu voto em benefício de favores” pondera ele; leia a íntegra
27 DE AGOSTO DE 2016 ÀS 11:00 // RECEBA O 247 NO TELEGRAM 

Por Alex Solnik
Na contramão da maioria dos políticos brasileiros, que raramente concorrem a cargos inferiores depois de conquistar os superiores, Eduardo Suplicy decidiu concorrer, este ano, a vereador de São Paulo depois de ter sido vereador, deputado estadual, deputado federal, pré-candidato a presidente da República e senador por 24 anos. Nessa entrevista exclusiva ao 247 ele revela detalhes de sua audiência com a presidente Dilma ocorrida depois de 34 cartas e três anos de insistência e os conselhos que lhe deu, dentre os quais o de comparecer pessoalmente para se defender no Senado que classifica como “a última esperança para o ‘não’ vencer o ‘sim’”. Também conta como resolveu o dilema entre votar em sua ex-mulher, Marta Suplicy e o candidato de seu partido, Fernando Haddad a prefeito de São Paulo: “Não vou usar a minha condição de candidato a vereador que apoia o Fernando Haddad para criticá-la”, promete. Famoso por cantar sempre que pode, até mesmo no plenário do Senado o hit “Blowing in the Wind” explica o que aconteceu entre ele e a estrela pop Joan Baez, que se consagrou com essa balada de Bob Dylan depois de almoçarem a sós no Copacabana Palace. “Contei para a Marta o que se passou” disse ele. Conhecido por não comprar briga com ninguém, apesar de ter sido campeão de boxe na juventude, afirma que Michel Temer “faltou com a lealdade com a presidenta” ao apoiar o impeachment e, por ser “corresponsável pelo governo” também deveria ser processado, tal qual a presidente, embora não veja motivo que o justifique: “Eu acho muito triste que um grande número de senadores esteja votando para que ela perca o seu mandato”. “É lamentável que alguns senadores estejam colocando o seu voto em benefício de favores” pondera ele.
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Quando eu te entrevistei, por volta de 1992 você contou um episódio com a Joan Baez... que se teria apaixonado por você... aquela entrevista te criou algum problema com a Marta?
Não... eu contei pra Marta o que se passou. Quando estávamos estudando nos Estados Unidos, certo dia fomos assistir a um concerto da Joan Baez no estádio San José. Próximo de Palo Alto, na Califórnia. Fomos eu, a Marta e o João... não, o André, porque o João ainda não havia nascido, ele nasceu em 1974. Nos anos 80, governo João Figueiredo, eu era deputado e então os que estavam organizando a vinda de Joan Baez disseram que ela queria conhecer muito o presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo e Diadema e perguntaram se eu poderia apresentá-la. Eu falei: com o maior prazer. Então, no dia em que ela chegou eu estava em São Paulo e a levei primeiro ao Largo de São Francisco, na Faculdade de Direito, onde ela conversou com os estudantes e cantou uma música à capela, depois fomos ao Sindicato dos Metalúrgicos e conversamos longamente com Lula que contou as histórias de como haviam ocorrido as greves...como 13 sindicalistas haviam sido indiciados na Lei de Segurança Nacional...ele chegou a ser preso...
E essa perseguição ao Lula? O que você diz desses boatos de que o Lula pode ser preso depois do impeachment?
Por algumas vezes eu ouvi o presidente Lula dizer que não cometeu qualquer ato ilegal. E que ele terá toda disposição de explicar a qualquer autoridade o que por ventura queiram saber. Acho que há uma ênfase muito grande por parte de alguns, querendo fazer algo contra ele... prendê-lo...especialmente para tentar impedir que ele se torne outra vez candidato à presidência da República com uma força muito grande. Mas eu acho que ele vai conseguir explicar a qualquer autoridade o que aconteceu e ele tem a convicção de que ao explicar tudo o que houve ele não será responsabilizado por qualquer ato ilegal. É isso que ele tem afirmado em diversas ocasiões em reuniões do partido.
Você se dá com ele?
Me dou. Não que tenha uma relação no cotidiano com ele. Mas quando nos encontramos, como em diversas ocasiões nesses últimos meses, em atos públicos recentes, inclusive de apoio ao Fernando Haddad ele me abraça com muito carinho. Me dou com ele bem.
Há alguma divergência entre ele e Dilma?
Nada sério. Os dois têm um diálogo constante...e de muita amizade e confiança entre eles. Uma ou outra questão menor pode, às vezes, significar uma divergência sobre algum ponto ou outro...é possível que o Lula tivesse tomado outras decisões de política econômica em relação ao que ela realizou, mas isso é mais do que natural entre dois amigos, que se respeitam.
O Lula será o candidato do PT nas próximas eleições?
Pode vir a ser. Claro que o PT tem, felizmente, inúmeros valores que poderiam também disputar a presidência da República...e então uma reflexão do partido vai ser necessária...mas você sabe que há uma vontade em diversos segmentos, inclusive uma das correntes do PT há poucos dias se reuniu e lançou o presidente Lula para que na convenção de 2017 ele seja consagrado como candidato a presidente em 2018 ou seja, isso pode acontecer. Mas até 2018 ou se houver antecipação das eleições...até 2018 tantas coisas poderão acontecer...pelo estatuto do PT o que deverá acontecer é uma escolha da maneira mais democrática possível. E o presidente Lula continua sendo uma força de grande expressão no partido.
E a Joan Baez?
Bem, voltando a Joan Baez... de noite nós fomos ao Tuca, teatro da PUC, que estava lotado, mais de 1500 pessoas...para assisti-la cantar. O Lúcio Inácio da Cruz, meu treinador de boxe dos 15 aos 21 anos, que se tornou um grande amigo meu, havia se tornado campeão dos meio-pesados do Brasil e então trabalhava na Polícia Federal. Na hora que eu cheguei com ela na PUC, o Lúcio muito amigavelmente me disse: “Eduardo, infelizmente não vai poder haver o show”. “Como não? O que aconteceu”? “As canções que ela vai cantar não foram apresentadas previamente à censura federal”. Não teve jeito. Entramos no Tuca, sentamos na plateia, eu expliquei que não haveria o show e ela sentada nos bancos começou a cantar “Pra não dizer que não falei das flores” e “Blowin’ in the Wind”. A música do Geraldo Vandré todos cantaram juntos, foi lindo. E quando ela cantou “Blowin’ in the Wind”, com aquela voz linda, sem alto falante, ressoou por todo o teatro...aplaudiram muito. Naquele dia naturalmente fiquei muito amigo dela. No dia seguinte eu tinha uma palestra em Brasília, mas fiquei com vontade de conversar mais com ela e falei “olha, no caminho para Brasília eu posso passar para lhe encontrar para almoçar”. E daí eu fui para o Rio de Janeiro de manhã para encontrá-la, acho que ela estava hospedada no Hotel Excelsior. Fomos almoçar lá no Copacabana Palace e daí fui me despedir dela e...telefonei para o Sindicato dos Servidores Públicos onde eu iria fazer a palestra, em Brasília, só para confirmar que eu iria e tudo...e aconteceu que na hora em que eu estava ao telefone, contando que eu iria e tal ela me deu um beijo... na boca! Então...foi isso que aconteceu... daí eu fui embora...e eu contei pra Marta isso...
Mas ela chegou a propor mais alguma coisa?
Não, foi só um beijo...
Eu tô contando isso porque depois que essa entrevista saiu na “Interview” eu tive um entrevero com a Marta... ela ficou muito brava... ameaçou quebrar meu gravador...porque ela não queria falar para a “Interview”... pensei que foi por causa da tua entrevista...há mais de vinte anos estou com essa dúvida...
Mas foi isso que aconteceu...
Escuta, você vai votar no Haddad ou na Marta?
A Marta compreendeu... ela fez a opção de sair do PT, inclusive preferiu não dialogar comigo a respeito dessa decisão dela e eu permaneci no PT, então, não poderia senão votar... Marta sabe da minha fidelidade partidária...portanto, com todo o respeito à decisão que ela tomou...não vou usar a minha condição de candidato a vereador que apoia o Fernando Haddad para criticá-la, é uma questão de respeito até para com meus filhos...
Não te incomoda o fato de ela usar o nome Marta Suplicy até hoje?
Quando, no ano de 2001 nós nos separamos, ela solicitou a mim que, tendo em conta que ela havia se tornado conhecida no Brasil e muito conhecida, como psicóloga, por seus livros, como “Maria Mariazinha”, “Conversando sobre sexo”, pela extraordinária audiência que ela teve no TV Mulher...e tendo ela se tornado deputada estadual, prefeita de São Paulo, ela perguntou a mim se eu não teria qualquer objeção a que ela continuasse com meu nome. Eu achei justo. E é também o nome dos meus filhos e ela é a mãe querida deles. Avó querida de meus netos... nós temos seis netos...então não tenho nenhuma intenção de dizer pra ela pra não usar o meu nome...
Você é um cara totalmente pacífico... nunca vi você brigar com ninguém...
Você não olhou ali naquela fotografia na parede?
Quando você era boxeur?
Leia...aquele recorte de jornal...
“Eduardo Suplicy saiu da lona para ganhar por nocaute”...Como se chamava o campeonato da Gazeta Esportiva? “Punhos de campeão”?
“Luvas de ouro”...
“Luvas de ouro”!
Campeonato de estreantes da Gazeta Esportiva. 1962. Mas o boxe, que não é uma briga, é uma luta, é um esporte, a ginástica do boxe me ajudou muito por toda a vida e também me ajudou a aprender a me defender, se por ventura houver a necessidade. Durante os 24 anos como senador nunca houve necessidade, mas eu estava pronto...assim como hoje também... e eu continuo a fazer exercícios...toda segunda e sexta... ainda hoje, que é quinta-feira eu tive porque a minha professora tinha ficado doente por duas semanas e não pôde vir, então fez a reposição... mas amanhã eu tenho ginástica, das 6 e 45 às 7 e 45... e eu sou um discípulo de Mahatma Ghandi... de Martin Luther King... da não violência... e dos ensinamentos do cristianismo...
Você tem a idade do Temer...
Eu tenho 75 anos, 21 de junho de 1941. Ele também tem 75?
Tem. Você acha que ele foi ético em relação à presidente Dilma? Ou ele traiu a presidente?
Olha, eu sempre tive com ele uma relação de respeito, de amizade. Quando da segunda vez em que ele foi candidato...da primeira vez pelo que pude acompanhar, ele sempre foi ouvido pela presidenta quando ele quisesse...não me lembro de haver registros de queixas da parte dele que a presidenta não o tivesse como um colaborador em quase todas as ações, a sua voz era ouvida e ele foi eleito junto com a presidenta para realizar um programa que havia sido aprovado pelas convenções tanto do PT quando do PMDB. Eu, inclusive, durante o ano 2014 das eleições eu me lembro de ter feito uma visita pessoal a ele, na sua casa, lá na praça...
Panamericana?
Lá perto da Praça Panamericana, mas a praça se chama...perto do Colégio Santa Cruz...eu fui à residência dele, conversei com ele, dei a ele meu livro “Renda da Cidadania, a saída é pela porta”...
Por que ele aderiu ao impeachment traindo a presidente?
Quem sabe um dia eu tenho a oportunidade de saber da parte dele porque. Porque eu percebo na presidenta Dilma que ela avalia que ele não agiu com a devida lealdade para com ela.
E na sua opinião?
Eu acho que ele faltou com a lealdade para com quem o convidou a ser o vice-presidente, que assumiu o programa que ela havia definido para o país, como se tivesse pouco a ver com o que estava sendo realizado pelo governo.
Ele deveria ser o primeiro a testemunhar que ela não fez nada de ilícito e como presidente nacional do PMDB deveria ter barrado o impeachment no começo, se fosse ético, não acha?
Eu acho. É uma pena isso, mas eu espero que mais de um terço dos senadores reconheçam que ela não agiu com qualquer ação que configure crime de responsabilidade.
Essa atitude não o marcou com o carimbo de traidor? Ele não pode sair na rua...
O que aconteceu no estádio do Maracanã constituiu um sinal muito importante que o povo brasileiro deu a ele, a ponto de ele nem querer ir à cerimônia de encerramento. Eles hoje têm consciência de que ele não é um presidente popular. Outra coisa seria se ele fosse eleito diretamente pelo povo. Porque uma hipótese difícil, mas não impossível seria que nesta semana em que a presidenta Dilma dialogará diretamente com os senadores e em que pese a posição da direção nacional do PT com a qual eu não estou de acordo, teria votado contrariamente, segundo a qual a presidente Dilma pelo que ela já expressou proporá uma consulta popular para saber se o povo brasileiro quer ou não a continuidade do governo dela, ou se prefere antecipar as eleições e daí o Michel Temer e o PMDB poderiam até disputar, aí sim, se eleito Michel Temer se tornaria um presidente popular. Mas precisaria ver se o povo iria aceitá-lo de fato porque substituir o voto de um colégio eleitoral de mais 110 milhões de brasileiros pelos 81 senadores não é o mais adequado.
Ele já foi declarado inelegível pela justiça eleitoral de São Paulo...
O Michel Temer?
Sim, por oito anos...
Por que?
Porque ele fez uma doação eleitoral como pessoa física além do permitido...ele é inelegível e poderá assumir a presidência da República...não é estranho?
Mas ele poderia até consultar a justiça eleitoral se ele poderia ser candidato. Mas isso eles não estão pensando. Ainda outro dia, quando o ministro das Relações Exteriores, José Serra disse que era importante que na Venezuela se fizesse o referendo sobre se o presidente Maduro deve ou não continuar, eu coloquei no meu facebook que, de forma coerente, ele também deveria aceitar que tivesse um entendimento pelo qual se pudesse viabilizar a proposta da presidenta Dilma, de uma consulta popular para saber se vai haver ou não antecipação das eleições.
Mas essa consulta poderia ser feita também em relação ao próprio Michel Temer, não?
Mas como a proposta da presidenta, pressupondo que ela vai voltar, que ela estaria disposta a fazer essa consulta, então seria consistente que o PMDB, o PSDB e o José Serra aceitassem a proposta da presidenta Dilma.
Você não acha que o Temer, por ser tão ligado a Dilma também deveria sofrer impeachment?
Ah, sim. Ele é co-responsável.
Se ela é culpada ele também é culpado...
Claro. Eu acho que sim. Eu acho que ele deveria ser uma pessoa solidária à presidente, no entanto ele tem agido de uma maneira não leal.
Como você está vendo o julgamento?
Se eu fosse senador, eu votaria “não”. Tenho a convicção da seriedade da presidenta Dilma e como ela jamais cometeu atos de enriquecimento ilícito, agiu de boa-fé... o que o relatório Anastasia considera que foi crime de responsabilidade são atos semelhantes aos que o próprio Anastasia realizou, como também outros governadores e presidentes que antecederam a presidenta Dilma. E o exame técnico da equipe do Senado e da Procuradoria da República também assim indicaram. De maneira que eu acho muito triste que um grande número de senadores esteja votando para que ela perca o seu mandato, mas eu ainda tenho muita esperança de que a presença dela no Senado... você sabe que eu tive uma audiência com ela no Palácio da Alvorada dia 1º. de junho...isso depois de três anos e 34 cartas que eu mandei pra ela...ela finalmente me recebeu... e antes ela dizia que as coisas estavam tão difíceis e tudo... “Eduardo, deixa passar esses momentos difíceis que eu vou te receber”. Acabou sendo possível após a decisão da Câmara para que ela fosse julgada pelo Senado. E quando eu liguei, na última semana de maio ela foi muito atenciosa, me ligou de volta e falou “venha me visitar”. Eu até disse que iria passar no Senado naquele dia para conversar com alguns senadores com os quais eu sempre mantive uma relação muito construtiva e respeitosa. Visitei o Cristóvão Buarque, o Romário, o Acyr Gurcacz e também conversei por telefone com Antônio Carlos Valadares, tentando convencê-los que o melhor voto seria “não”. Preocupado com a decisão do Cristóvão que, naquele dia tinha até conversado com a presidenta Dilma por mais de uma hora e iria ter uma segunda conversa. Entretanto, a não ser que ele ainda pense melhor...por isso eu até estou mandando uma carta para todos...o próprio Romário ainda estava em dúvida...o Acyr, que votou pela continuidade do processo estava convencido que o melhor voto é “não”... acho que ele vai votar “não”... e o Valadares ainda não sei.
Mas parece que houve pressão dos partidos, o que não cabe...
Eu acho que tem pressão dos partidos... tem ações por parte do próprio Poder Executivo, do governo provisório, para tentar persuadir os senadores, não em razão de ela ter ou não cometido crimes de responsabilidade, mas sendo generoso com os senadores nas suas reivindicações... hoje ainda li que medidas serão tomadas para os estados do Nordeste a pedido dos senadores...isso não tem nada a ver com o voto “sim” ou “não”...é lamentável que alguns senadores estejam colocando o seu voto em benefício de favores para suas regiões ou estados e para fortalecê-los politicamente por meios que são condenáveis.
Você acha que esse tipo de ações pode levar à nulidade do processo?
Eu acho que o próprio presidente Ricardo Lewandowski deveria estar atento a isso e os ministros do Supremo, porque essas ações no caso de ocorrer o impeachment poderão, depois, serem analisadas, se a presidenta Dilma e o PT resolverem questionar o resultado perante o Supremo Tribunal Federal. Não sei em que medida juridicamente isto possa ser possível, uma vez que a constituição diz que o julgamento é feito pelo Senado, mas se houve algum procedimento inadequado eu acho que sim, que o Supremo Tribunal Federal deve ter o poder de decisão sobre o que vier a acontecer.
E o que aconteceu nessa sua reunião com a presidente?
A Primeiro de Junho? Eu escrevi a primeira carta para ela em 2013 pedindo um encontro para falarmos a respeito da minha sugestão de constituir um grupo de trabalho de 70 estudiosos que definiria as etapas da implantação da Lei da Renda Básica da Cidadania que foi sancionada a 8/1/2004. Em 18 de dezembro de 2014 eu fui ao Superior Tribunal Eleitoral por ocasião da diplomação dela. Entrei na fila. “Parabéns, presidente”! “Eduardo, me dê um beijo”! “E a nossa audiência, presidenta? Eu agradeço muito se a senhora puder me receber antes de terminar o meu mandato”. “Que dia termina”? “Dia 31 de janeiro”. “Eu acho justo, mais do que justo, vou lhe receber”. Na última semana de dezembro o Beto Vasconcelos, então chefe do Gabinete Civil me diz “Eduardo, ela está tendo que receber os 39 ministros, tá muito difícil”. Na última semana de janeiro caiu a Graça Foster e toda a direção da Petrobrás e mais uma vez o Beto me falou “a presidenta está tão preocupada com a questão da designação para a nova diretoria da Petrobrás etc que não vai ser possível”. Dez de março: a presidenta veio para fazer uma palestra para os empresários da construção civil no Anhembi, em São Paulo. Eu fui lá, assisti a palestra, ela foi aplaudida pelos empresários. Terminou, o cerimonial me disse: “Eduardo, venha cumprimentar a presidenta”. “Parabéns, presidenta”! “Eduardo, você estava aí”? “Eu estava presidenta, na primeira fila, diante do seu púlpito”. “A luz forte nos meus olhos não me permitiu enxergá-lo”. “E a nossa audiência, presidenta”? “Não é que eu não queira lhe receber...mas o que você me pede agora é impossível”. “Mas, presidenta, o que eu estou sugerindo é que a senhora constitua um grupo de trabalho para saber se a renda básica da cidadania será possível em dois, três, cinco ou mais anos”. “Ah, então eu vou lhe receber em junho”. “Ah, presidenta, que bom! Agradeço muito se puder ser antes do meu aniversário, dia 21 de junho”. “Quantos anos você faz”? “Setenta e quatro”. Em 2015. “Então, eu vou lhe receber dia 20 de junho com bolo”.
Com...?
Com bolo!
Ah, com bolo! Entendi “com Moro”!
Com bolo de aniversário. Então, liguei na última semana, agora era o Álvaro Henrique Baggio o chefe de gabinete, o Beto Vasconcelos tornou-se o Secretário Nacional de Justiça...ele foi sempre muito atencioso comigo e dando força... aí o Álvaro Henrique Baggio diz “olha, não vai dar antes do dia 21, mas ela marcou dia 22 de junho às 17 horas”. “É o meu melhor presente de aniversário”. Fui para Brasília, peguei o avião meio dia e trinta, cheguei às duas, estava indo para o Palácio do Planalto, 10 para as 3 telefona o Álvaro Henrique Baggio: “Eduardo, ocorreram problemas tão difíceis nos últimos dias... precisou ser cancelado”. No dia 13 ou 14 de outubro, no Congresso Nacional da CUT...no Anhembi, Auditório Celso Furtado...na sala vip estavam o presidente Lula, o presidente Pepe Mujica e a presidenta Dilma... na hora que eu entrei na sala a presidenta Dilma deu um passo à frente: “Eduardo, eu estou em falta com você...deixe passar esses momentos difíceis que eu vou lhe receber”. “Que bom”! Mas os momentos difíceis não se passaram...foram se tornando cada vez mais difíceis e então finalmente era 27 de maio, uma sexta-feira...
Vinte e sete de maio deste ano? No dia 12 ela foi afastada...
Sim, em 2016. Portanto, ela já estava no Palácio da Alvorada...eu liguei para ela e ela me falou “Eduardo, pode vir às 11 horas dia 1º. de junho”. Eu fui...e tive um ótimo diálogo com ela...de aproximadamente 45, 50 minutos... presente estava o Ricardo Berzoini, que foi ministro, testemunhou a minha conversa... até perguntei...eu expliquei a minha proposta e ela perguntou “quantas pessoas você acha que deve ter esse grupo de trabalho”? E ela própria, então, disse, “15 estaria bem”? “De bom senso... aquela lista de 70 nomes foi uma sugestão... acho que é de bom senso”... “É, porque mais do que isso não vai funcionar bem”...
Quer dizer que ela estava esperançosa em voltar?
Eu até sugeri a ela: “seria muito importante que a senhora vá ao Senado e converse olho no olho com os senadores, porque isso pode ter um grande efeito. Inclusive com aqueles com os quais e as quais a senhora teve um relacionamento próximo... alguns foram seus ministros”...
Inclusive a sua ex-mulher...
“De tal forma que eu acho que um diálogo franco...” dizendo algo como “afinal, senador ou senadora, durante o tempo que o senhor ou a senhora conviveu comigo, em algum momento o senhor viu que eu tivesse agido de forma ilícita...que eu tivesse agido de má-fé? Quando houve notícias de malfeitos no governo, acho que a senhora ou o senhor foram testemunhas das providências que eu tomei para não permitir aquilo, averiguar através da Controladoria Geral da República, da Polícia Federal, do advogado-geral da União e todos os instrumentos”. Eu tenho esperanças... e agora, na última quarta-feira... no ato com a presidenta Dilma... você estava lá por acaso... na terça-feira, na Casa de Portugal... você estava?
Não pude ir...
Eu li uma mensagem do Dalmo de Abreu Dallari e fui muito aplaudido...a carta dele foi muito aplaudida...
Você virou um ídolo pop...em outra ocasião na Casa de Portugal quando você chegou foi recebido como um pop-star...
Terça-feira foi semelhante...e a presidente me abraçou, me deu um beijo muito carinhoso e daí eu falei “que bom que a senhora vai ao Senado, acho muito importante... quem sabe esse diálogo pessoal com cada senador poderá fazer diferença”...é a última esperança...
Não será bem um diálogo pessoal...
Será com todos... mas cada um fará perguntas...e na hora da pergunta o diálogo é olho no olho...é nisso que eu estou pensando... ela poderá dizer... primeiro ela fala “agora estou à disposição de cada um para responder quaisquer questionamentos”... isso faz uma grande diferença...
O problema é que os senadores já estão comprometidos com esse governo provisório, não acha?
Muitos...
A única exceção no PMDB é a Kátia Abreu...
E o Roberto Requião.
Exatamente. E a Kátia Abreu, que não abandonou a presidente depois de ser ministra.
Ela foi muito corajosa e firme.
Você acha que a Lava Jato impulsionou o impeachment?
A ação da Polícia Federal para detectar a forma com que empresas se relacionavam com políticos e com a direção de empresas públicas era algo importante que precisava ser desvendado. E isso atingiu a todos os partidos. Mas é fato que os responsáveis pela Operação Lava Jato têm dado muito mais ênfase, colocado muito mais energia em desvendar possíveis ações relacionadas ao Partido dos Trabalhadores. E a pessoas como o próprio presidente Lula. E muito menos ênfase, inclusive do ponto de vista daquilo que então foi divulgado à imprensa...houve para o Partido dos Trabalhadores uma ação muito forte. Quando me perguntam a respeito...o trabalho da Polícia Federal foi importante para desvendar episódios que são inadmissíveis... Quando houve as descobertas no fundo do Oceano Atlântico, nas camadas do pré-sal, o presidente Lula costumava dizer: “parece que Deus é brasileiro... as reservas vão permitir ao Brasil em breve estar erradicando a pobreza absoluta... prover muito melhor qualidade de educação... de assistência à saúde... vamos ter progressos tecnológicos...culturais... de grande importância”... E isso animou o povo brasileiro. Mas na hora em que algumas pessoas passaram a se enriquecer ilicitamente... pessoas com responsabilidade na direção da Petrobrás... e nos seus relacionamentos com empresas...e com políticos, parlamentares... isso é algo gravíssimo! E é importante que a Lava Jato coloque as suas energias não apenas em pessoas do PT que cometeram erros ou relacionadas ao PT... porque muitas delas, segundo o próprio noticiário... muitas dessas ações foram perpetradas por pessoas dos demais partidos...os diálogos havidos com o ex-presidente da Transpetro, ex-senador, foi meu colega no Senado, Sergio Machado, em que se falava em como sustar a Lava Jato para não avançar sobre pessoas, por exemplo, do PMDB, isso foi grave.
Ele inclusive disse que deu dinheiro ilícito a Temer...
E a averiguação em profundidade desse assunto não parece ter o mesmo empenho que teve para com pessoas do PT. E a ênfase na imprensa foi muito menor. Me perguntam às vezes, no facebook ou aonde eu vou...”ah, mas você ainda está no PT, com todos esses problemas”? Olha, quando se está numa grande organização como o PT, mais de 1 milhão e 700 mil filiados, algumas pessoas cometem erros e erros gravíssimos de enriquecimento ilícito, nosso dever é procurar tomar medidas para prevenir e corrigir esses erros e ali onde estivermos agirmos com toda a seriedade e transparência e com princípios éticos e com toda retidão... é o que eu procuro fazer... seja nos meus 24 anos no Senado...nos 13 meses em que, honrado que fui pelo prefeito Fernando Haddad para ser Secretário de Direitos Humanos e Cidadania...
Nunca te ofereceram dinheiro ilícito nas campanhas?
Olha, vou lhe contar um episódio. Era 2002. Eu havia sido, de 2001 para 2002 pré-candidato a presidente da República. Em 17 de março de 2002, pela primeira vez na história dos partidos políticos do Brasil todos os filiados de um partido foram convidados a votarem qual seria o candidato a presidente. 172 mil pessoas compareceram, 84,4% votaram no presidente Lula, eu tive 15,6% dos votos. Pouco depois disso, por volta de abril de 2002, numa reunião do diretório nacional, ao se discutir as finanças o deputado Chico Alencar, então no PT, hoje no PSOL sugere que publiquemos em tempo real as doações de qualquer natureza. Para o PT e para os nossos candidatos. Aí houve uma reflexão. Delúbio Soares era o tesoureiro, já conversei com ele a respeito, inclusive quando ele pediu para retornar após ser afastado e veio conversar comigo no meu gabinete e eu disse “olha, tudo bem, eu acho que às vezes a gente pode cometer erros, agora, eu queria então que o PT se tornasse favorável e passasse a agir conforme aquela recomendação”. Porque ele naquele dia tinha dito “olha, se nós formos abrir a informação de que tal empresa está nos dando recursos isso vai inibir os empresários em querer dar para nós ou para outros partidos, vai nos prejudicar”. E assim não se aceitou a proposta. Mas eu, como senador, na minha página eletrônica tinha as declarações de doações. Por exemplo: fiz um jantar de fundos. As pessoas podiam contribuir com 100, 200 ou 500 reais. O nome de cada um dos que compareceram ao jantar foi assinalado. E todas as contribuições eu também as registrei.
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