Por Rafael Fabrício de Oliveira e Rogério de Souza

Ocupação de remanescentes de quilombolas (São Roque/SP)
21 maio, 2017
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O Quilombo do Carmo está localizado
no espaço rural de São Roque, nos limites com Cotia e a pouco mais de 70
quilômetros de São Paulo. Pressionado econômica, política e socialmente
pela expansão urbana e da especulação imobiliária, seu território é
suprimido a cada dia pelos interesses unilaterais de políticos locais em
aliança com incorporadores de terras. O que culminou com a ocupação
quilombola de novas terras no local, acentuando as tensões entre a
população remanescente, órgãos federais, a municipalidade, moradores de
condomínios de classe média e latifundiários.
Conforme dados levantados pelo projeto do
Instituto Federal de São Paulo (2016) “Remanescentes quilombolas do
Carmo: a luta por memória na terra de direitos”, houve grave redução do
território quilombola do Carmo entre os períodos de 1919 a 2009, sendo
que os 2.175 alqueires iniciais foram reduzidos a 6,6 alqueires, tendo a
população da comunidade vivenciado na prática a perda de 99,72% do
território original. Além disso, o que resta, está em litígio pela não
demarcação e titulação.
Mesmo se tratando de uma comunidade
remanescente quilombola, nacionalmente reconhecida pelo Ministério da
Cultura por meio da Fundação Palmares, com amplo acervo documental, que
comprova sua trajetória histórica e de resistência, a morosidade na
demarcação e titulação da propriedade definitiva pelo INCRA tem
provocado diversos problemas e dificuldades. Destes, a perda de
importantes referenciais ligados a sua ancestralidade com o território, o
racismo institucional, a dificuldade de autonomia produtiva, alimentar e
profunda exclusão social.
Diante destes fatos, organizados e
mobilizados, os remanescentes quilombolas decidiram, ao final do mês de
março de 2017, pela ocupação de uma gleba de terras adjacentes ao bairro
do Carmo, onde acampam atualmente 25 famílias, já fazendo uso do espaço
por meio do plantio de hortaliças e o estabelecimento de hortas,
instalando moradias e espaços comunitários. Conforme explica uma das
mulheres quilombolas no local, “chegamos a segunda metade de abril mais
fortes e organizados do que nunca”.

Foto: Somos todos Quilombo do Carmo #titulaçãojá – 08/04/2017
Apesar do relato, há simultaneamente uma
insegurança cotidiana, considerando, entre outros fatores, o episódio da
prefeitura de São Roque perpetrar pedido de reintegração de posse no
Tribunal de Justiça de São Paulo (Processo: 1001459-18.2017.8.26.0586)
da área ocupada pela comunidade. Fato que resulta numa contínua
insegurança e maior possibilidade de conflito. Em carta aberta a
população de São Roque e região, os moradores explicaram que “[…] depois
de anos lutando através de associações e por diversos meios legais
entramos nos seguintes entendimentos: iria se passar mais e mais anos e
infelizmente estaríamos sem respostas, nossas terras comprovadas através
de estudos antropológicos feito pelo MPF, simplesmente nas mãos de
terceiros, e eles grandes fundiários de terras fazendo diversos
condomínios com elas e nossos filhos nascendo. Sem nossa luta seria
ainda mais difícil recuperar nossas terras, hoje somente com mato por
cima dela, seu uso está difícil, imagina com grandes empreendimentos em
cima dela, seria praticamente impossível.”

Foto: Rafael Oliveira (IFSP) – 08/04/2017
A área ocupada pelos quilombolas estava
até então sem uso social da terra, somente com uma construção abandonada
da companhia telefônica nos limites da área e instalações irregulares
de um relógio de força do condomínio vizinho. Segundo um dos moradores
locais, trata-se de uma forma indébita e estratégica legalmente de
apropriação do território coletivo quilombola por agentes privados com o
apoio político municipal.
Além dos estudos, acervo documental,
laudos do ministério público federal, do reconhecimento pelo
MinC/Fundação Palmares, que comprovam, reconhecem e dão sustentação
administrativa para identificação, reconhecimento, delimitação,
demarcação e titulação das terras ocupadas pelos remanescentes do
Quilombo do Carmo, esta ocupação torna-se ainda mais legítima por
reverberar às novas demandas da população, que cresceu e carece de
autonomia, sobretudo ser capaz de reprodução física, social, econômica e
cultural, como institui o Decreto 4887/2003.

Foto: Luca Bonando (URE) – 08/04/2017
A ocupação “Somos todos Quilombo do Carmo – Titulação Já”
resiste às pressões policiais, jagunços e capangas que apertam os
arames das propriedades locais e aos políticos que articulam a saída e
dissolução da ocupação. No entanto, o movimento de luta também vai
gradativamente ganhando apoio regional, destacando-se a contínua
presença da Frente Popular e União Regional dos Estudantes de São Roque
(URE), o Instituto Federal de São Paulo, o Ministério Público Federal,
além da população civil organizada, conscientes da necessidade de
justiça social e o pleno desenvolvimento das populações quilombolas
junto a seus direitos e o fortalecimento das políticas étnico-raciais.
Os interessados em ajudar a ocupação
poderão entrar em contato com o movimento através da página:
https://www.facebook.com/search/top/?q=quilombolas%20do%20carmo
Rafael Fabrício de Oliveira, professor do IFSP.
Rogério de Souza, professor do IFSP.
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