Na Greve Geral, meu pai, Policial Militar, chorou


Relato da filha de um Policial Militar de São Paulo que era a favor da Greve Geral
(Foto: Tuane Fernandes / Jornalistas Livres)
“Diferente das outras manifestações, eu não participei da passeata da Greve Geral. Não que eu não quisesse, mas minha mãe pediu pra que eu não fosse e eu respeitei.
Meu pai é policial, faz parte da Tropa de Choque. Eu estava assistindo quando ele chegou em casa. Passava das 02h da manhã.
Meu pai chegou quieto e sentou do meu lado. Eu estranhei mas continuei vendo TV. Quando ele saiu, vi minha mãe voltando com ele pro sofá e ele chorando desesperado. Eu não sabia o que estava acontecendo e comecei a perguntar se ele estava machucado. Ninguém me respondia e eu entrei em pânico também, comecei a chorar e minha mãe teve que “cuidar” de mim e do meu pai.
Ele não conseguiu nos contar nada no momento. Ficamos acordados até quase cinco horas da manhã e ele começou a falar. Ele nunca gostou de participar de manifestações, sempre achou desnecessárias e nunca ficou do lado dos manifestantes. “Um bando de vagabundos”, já ouvi diversas vezes em casa.
No dia da Greve Geral ele não queria trabalhar porque concorda que o governo está retirando nossos direitos. Um dia antes ele me contou que estava se sentindo um “idiota”. Ele não ficou na manifestação do Largo da Batata, ele estava posicionado no caminho por onde o ato passaria. Ele ficou na frente, como escudo, protegendo os demais policiais que arremessavam bombas e balas de borracha. Ele me contou, depois de muito chorar, que teve um surto durante o “trabalho” que realizava. Ele não queria estar ali. Ele concordava com os manifestantes. Ele não bateu diretamente em ninguém mas sabe que a presença dele ali fez a operação da polícia funcionar.
Eu nunca vi meu pai chorar e talvez tenha sido por isso que eu entrei em desespero junto com ele quando ele chegou em casa.
Até agora não consegui digerir essa história e tá um clima estranho em casa. Parece que a profissão do meu pai, que ninguém nunca ousou questionar, agora não serve mais pra ele. E ele não quer mais servir pra ela.”

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