Ocupações de escolas derrubam ideologia que pretende privatizar o ensino




EM DEFESA DA ESCOLA

Protagonistas das ocupações de 2015 e 2016 mostraram que a crença na má qualidade das escolas públicas foi construída por setores conservadores da sociedade
por Sarah Fernandes, da RBA publicado 16/05/2017 18h09, última modificação 16/05/2017 19h38
DANILO RAMOS/RBA
Ocupação
Estudantes da escola Fernão Dias durante ocupação, que virou marco na luta após instituição permanecer uma semana sitiada pela polícia
Santo André (SP) – As ocupações de escolas em diversos estados do Brasil, ocorridas em 2015 e 2016, ajudaram a derrubar o argumento neoliberal que os serviços públicos necessariamente não têm boa qualidade e que os alunos de escolas públicas não gostam das instituições e dos currículos nelas trabalhados. “Por que eles lutariam tanto por um lugar que não gostam? Isso não é a realidade”, defendeu a professora da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP) Marília Sposito, que durante a manhã desta terça-feira (16) participou do I Encontro Internacional da Rede de Escola Pública e Universidade, realizado na Universidade Federal do ABC (UFABC), em Santo André.
A ideologia da má qualidade das escolas públicas foi construída por setores conservadores da sociedade e se exemplifica pela suposição de má qualidade dos professores, o que no limite justificaria a privatização do ensino por meio de sistemas apostilados, por exemplo, como argumentou o professor da UFABC Salomão Ximenes.
O movimento de ocupação começou no final de 2015, quando estudantes da rede estadual de São Paulo, inspirados em secundaristas chilenos, ocuparam suas escolas contra o projeto de reorganização escolar proposto pelo governador Geraldo Alckmin (PSDB), que pretendia fechar pelo menos 94 escolas e transferir compulsoriamente entre as unidades escolares 311 mil alunos. No auge do movimento, em 2 de dezembro daquele ano, estudantes paulistas chegaram a ocupar 213 escolas em todo o estado.
“Enquanto tiver gente defendendo a escola pública ela continuará existindo, o problema é quando a desconfiança na instituição cresce tanto que ninguém mais a defende. Mas os movimentos de resistência surgiram de onde menos se esperava: das escolas públicas, alardeadas como sucateadas e sem qualidade”, disse Marília. “Foi um espaço de resistência, sem tutela da universidade. A inspiração veio de seus pares, estudantes da Argentina e do Chile. Quando se apropria de uma técnica de luta também se cria alternativas.”
Em 2016, o movimento de ocupações se espalhou por escolas e universidades de 20 estados e do Distrito Federal contra a reforma do ensino médio, sancionada pelo presidente Michel Temer em 16 de fevereiro deste ano, depois de tramitar como Medida Provisória (MP) 746, e contra a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 55, promulgada pelo Congresso em dezembro de 2016, que restringe os investimentos sociais do governo federal, inclusive em educação. O número de universidades ocupadas chegou a 171. No auge do movimento, em 28 de outubro, 1.198 escolas foram ocupadas no país, 845 só no Paraná.
A professora frisou que os adolescentes que protagonizaram as ocupações de escolas são filhos de uma geração que, sob os governos petistas de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, teve anos seguidos de aumento real nos salários, o que permitiu que seu ingresso no mundo do trabalho fosse retardado. “Seus pais tiveram uma folga no orçamento familiar. Essa geração que se apropria de suas escolas nós ainda não conhecemos, assim como os estudantes que trabalham.”
 “As escolas são locais de aprendizagem. Em pesquisas, nos depoimentos de alunos, se ouve coisas como ‘minha escola é uma família’. Uma proposta autoritária de política educacional poderia desmontar esse lugar. O estudante percebe isso e se mobiliza contra”, defendeu Marília. “Se vivemos hoje retrocessos na política não podemos dizer que voltaremos ao lugar inicial. Os sujeitos são outros. Não há mais volta.”
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