Entrevista-wagner-marcia
Embora sejam ambos próximos ao PSOL, a escritora e professora de Filosofia Márcia Tiburi, filiada ao partido e o ator Wagner Moura, simpatizante, divergem a respeito de quem deve entrar no lugar quando Temer cair. Nessa entrevista exclusiva à TV 247, realizada no Senac-Lapa, em São Paulo, por Leonardo Attuch e Alex Solnik, momentos antes de Márcia e Wagner se apresentarem no evento “Diálogos Contemporâneos”, ela defendeu a candidatura Lula: “O povo gosta dele”; “Ele é a cara do povo”; “O Lula é muito melhor do que qualquer outro que possa aparecer”. Para Wagner “a esquerda precisa de um projeto novo e esse projeto não é representado por Lula”. “Meu sonho é uma chapa Haddad-Freixo” diz Wagner; confira a íntegra
24 DE JUNHO DE 2017 ÀS 15:44 // 247 NO TELEGRAM // 247 NO YOUTUBE
Por Alex Solnik e Leonardo Attuch
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Embora sejam ambos próximos ao PSOL, a escritora e professora de Filosofia Márcia Tiburi, filiada ao partido e o ator Wagner Moura, simpatizante, divergem a respeito de quem deve entrar no lugar quando Temer cair. Nessa entrevista exclusiva à TV 247, realizada no Senac-Lapa, em São Paulo, por Leonardo Attuch e Alex Solnik, momentos antes de Márcia e Wagner se apresentarem no evento “Diálogos Contemporâneos”, ela defendeu a candidatura Lula: “O povo gosta dele”; “Ele é a cara do povo”; “O Lula é muito melhor do que qualquer outro que possa aparecer”. Para Wagner “a esquerda precisa de um projeto novo e esse projeto não é representado por Lula”. “Meu sonho é uma chapa Haddad-Freixo” diz Wagner. “Não quero uma chapa de homens brancos” discorda Márcia. Mas eles concordam que a votação do impeachment deu vergonha: “Foi tão vexaminoso, tão horroroso, tão absurdo que eu acho que é comparável ao 7 a 1” disse Márcia. Também concordam a respeito da exploração política da corrupção: “A guerra contra a corrupção é como a guerra contra as drogas...é uma guerra que destrói muita gente, gasta muito dinheiro, destrói o país e você faz um jogo ideológico” diz Márcia. “Essa batalha moral contra a corrupção foi responsável, no mundo, por centenas de golpes de estado” diz Wagner. Quando o assunto é soberania, eles voltam a divergir. “No Brasil, o povo não é soberano, esse é um problema”, garante Márcia. “O povo, sim, é soberano e seria lamentável que elegêssemos um candidato horroroso como Bolsonaro, mas seria uma solução democrática” rebate Wagner. Para ele, “nem todo mundo que votou em Trump é um fascista”.
LEONARDO: Márcia, do que trata teu livro “Ridículo Político”?
MÁRCIA: O “Ridículo Político” foi uma tentativa de refletir sobre a “berlusconização” da política, vamos chamar assim, esse fenômeno internacional e nacional também, no qual aqueles políticos que fariam a pior cena possível, digamos assim, se tornam os sujeitos mais importantes, mais capitalizados do ponto de vista social.
LEONARDO: Aqueles que dariam “vergonha alheia” se tornam os protagonistas...
MÁRCIA: Um dos assuntos do livro é a “vergonha alheia”. Os cidadãos sentem cada vez mais “vergonha alheia” justamente diante daqueles que perderam a vergonha. Porque, vocês podem notar... a gente sente compaixão de uma pessoa que é colocada numa situação vexaminosa, mas desde que ela sinta vergonha na situação. A gente percebe que alguém tem vergonha, então nós ficamos compadecidos. No nosso contexto atual nós começamos a sentir vergonha alheia porque nós percebemos falta de vergonha naqueles que deveriam sentir vergonha. Pra dar um exemplo conhecido por todo mundo vou dar o exemplo do dia 17 de abril de 2016. O dia da votação do impeachment na Câmara dos Deputados...
LEONARDO: O dia da infâmia, o dia da vergonha...
MÁRCIA: O dia da vergonha. Exatamente. E naquele dia todos os brasileiros, independe de suas filiações partidárias, ideológicos, de suas reflexões ou falta de reflexões, ali todo mundo sentiu a mesma vergonha: a esquerda, a direita, o centro, em cima, embaixo, todo mundo passou muito mal vendo o espetáculo. Foi tão vexaminoso, tão horroroso, tão absurdo que eu acho que é comparável ao 7 a 1 da Copa do Mundo. Foi uma sensação horrível! Dava vontade de sumir, de desaparecer, que é típica desse sentimento que é a vergonha. Então, o livro fala disso. Fala da capitalização sócio-política, a capitalização que certos personagens, certos indivíduos estão tendo dentro dessa cena ridícula...
LEONARDO: O Temer, por exemplo, que tem 2% de aprovação...
MÁRCIA: Não consigo não perguntar como ainda é possível que haja 2% de aprovação.
ALEX: Mas a margem de erro é de 3 pontos. Ele pode estar com menos 1.
MÁRCIA: É um negócio doido!
ALEX: Temer está mais perto do “menos 1”.
MÁRCIA: E eu tô no clima desse livro. A minha inspiração foram as cenas constrangedoras que a gente tem vivido e essas cenas constrangedoras que podem parecer só uma questão estética, são uma questão profundamente política e são sinais da crise profunda, que não é só da política institucional, mas também da cultura política e uma crise, também, do significado do Brasil, ao meu ver, pra nós brasileiros. Eu discuto o lugar do ridículo político como parte de um processo de neoliberalização do Brasil. Então, o ridículo político não é uma categoria só pra gente falar “Fulano é um político ridículo”. Ao contrário, é a tentativa de mostrar uma categoria hermenêutica que seja capaz de dar conta de um fenômeno que demonstra uma grande mutação na cultura política internacional e nacional, que é a “berlusconização”...a “bolsonarização”...a “dorização”...a “temerização”... como é que esses caras, que seriam ou insignificantes ou acostumados a fazer papelão ou aquelas figuras que mais nos dão vergonha, ou que mais nos estarrecem... como é que esses caras conseguem tanto poder? Onde nós sentiríamos vergonha, onde qualquer cidadão normal sentiria vergonha os caras viram os donos do poder. Isso eu acho que a gente tem que compreender, analisar o que está se passando, porque a tendência é que isso continue...
ALEX: Mais do que ridículo a gente chegou no ponto de crime...na capa de uma revista saiu a manchete “Temer é o chefe da maior e mais perigosa quadrilha do país”. Você, Wagner, que já interpretou vários chefes de quadrilha... Pablo Escobar, Capitão Nascimento, bem esse não era chefe de quadrilha mas enfrentava quadrilha...o que você está achando dessa quadrilha no poder... o juiz inclusive liberou chamar Temer de chefe de quadrilha...segunda ou terça que vem, Janot deve denunciar o nosso presidente da República por corrupção.
WAGNER: É difícil pensar como chegamos aqui... como, historicamente, a gente chegou ao ponto que a gente chegou. Porque a tendência é você analisar de uma certa derrocada moral do PT, uma série de acusações contra o PT que levaram ao impeachment, que levaram à chegada de Temer, mas eu acho que o processo começa muito antes disso, talvez eu nem saiba dizer que processo é esse. O que eu acho é que, sobretudo e falando do ponto de vista até mais pragmático da crise, e é por isso que eu insisto nas diretas-já, porque eu acho que a crise, sobretudo, é uma crise de legitimidade. Esses 4% de aprovação dizem respeito não só a um presidente que tem conduzido a política que é contrária aos interesses da maioria da população brasileira, mas é sobretudo é um presidente que não é considerado pela maioria das pessoas como um presidente legítimo.
LEONARDO: Nem dentro nem fora do país...
WAGNER: Nem dentro, nem fora do país...exatamente... mesmo ele sendo recebido e tudo o mais. A nossa crise é uma crise de legitimidade. Um Congresso que, na avaliação da maioria das pessoas, também é um Congresso, embora eleito democraticamente ele não tem... E aí a gente vai para um ponto grave que é a desmoralização da política como um todo...a figura do político...
LEONARDO: Chega um ponto em que vale qualquer coisa.
MÁRCIA: Isso que o Wagner falou é uma coisa super importante. É preciso destruir o que as pessoas entendem por política. Dizer que o poder corrompe já é uma coisa antiga, mas a gente chegou nessa ideia de que a corrupção acabou com tudo e que ser político é ser corrupto. Inclusive, o discurso da corrupção é um dos mais pérfidos nesse processo. E é um discurso corrupto.
LEONARDO: A história mostrou que os moralistas...
MÁRCIA: A guerra contra a corrupção é como a guerra contra as drogas...é uma guerra que destrói muita gente, gasta muito dinheiro, destrói o país e você faz um jogo ideológico para dizer...
WAGNER: Essa batalha moral contra a corrupção foi responsável, no mundo, por centenas de golpes de estado, tomadas de poder, geralmente utilizadas pela elite, quando a situação não está favorável, eles vêm com esse discurso, é um discurso de fácil compreensão...
LEONARDO: Mas vocês esperavam que, por exemplo, Aécio Neves também desmoronasse, dcomo também o Temer... isso chegou a ser surpreendente pra vocês? Eles vocalizavam esse discurso...
WAGNER: Não. Não tem surpresa nenhuma.
MÁRCIA: O problema é que esses caras também... esses poucos do grupo, da elite... esses caras também já não valiam grande coisa... no teatro da política quem era o Aécio, né, gente? Era o neto de vovô...
LEONARDO: Um personagem...
MÁRCIA: Era um personagem... um senador lá... um cara que consegue se eleger. Porque tem uma ala toda no Brasil, quando a coisa se dividiu entre Dilma e o Aécio, tinha uma ala que prefere votar numa figura como o Aécio ou uma parte da população que prefere votar no anti-petismo, vota no Aécio.; o ódio ao PT vota no Aécio...e um monte de gente perdida, que nem sabe o que é política votava no Aécio.
LEONARDO: Mas essas pessoas sumiram... (risos)
MÁRCIA: Essas pessoas agora morrem de vergonha, mas essas pessoas continuam votando... ou, então, continuam não votando. Quem é que elegeu, por exemplo, o João Dória em São Paulo? Foram os brancos e os nulos. Quer dizer, não foi a maior parte da população. Esse também é um fenômeno interessante. Eu acho que a gente está afundando. Temos que rever tudo o que diz respeito a política. Estamos afundando num grande cinismo. Um tremendo dum cinismo. Quem ganhou até agora vai continuar ganhando se a gente não reverter o significado dos jogos de linguagem da política.
ALEX: Ô Wagner, quanto você acha que o Temer dura ainda?
WAGNER: Realmente não sei dizer. Ele tem mostrado uma resiliência surpreendente. Eu achei que naquele pronunciamento que ele fez logo depois da denúncia, que ele fosse renunciar. Todos nós achamos. E foi ótimo porque ele começou o discurso dele com “primeiramente”...(risos) e deu uma pausa...
MÁRCIA: (risos)
LEONARDO: (risos)
ALEX: (risos)
WAGNER: Então, ele tem demonstrado uma resiliência surpreendente. Há uma incerteza sobre se a saída de Temer... quem entraria no lugar dele pra conduzir as reformas...talvez seja essa a questão pela qual Temer ainda está aí...porque não se sabe bem quem seria a pessoa para substituir o presidente com força pra levar as reformas adiante...
ALEX: Mas você não acha que com esse tipo de reação, sempre insistindo em continuar, ele só prejudica o país?
WAGNER: Evidentemente! Claro!
LEONARDO: Por que não confiar a decisão à população brasileira? O povo é soberano, 65% querem diretas.
MÁRCIA: No Brasil, o povo não é soberano, esse é um problema.
LEONARDO: Por que eles têm medo do povo?
MÁRCIA: Porque o povo vai votar no Lula! O Lula é a cara do povo! O Lula é a pessoa que o povo gosta. Mesmo nós que somos de esquerda, somos críticos, com tudo que a gente faz de crítica à própria esquerda, o que a gente fez de crítica ao PT, a gente continua sabendo que o Lula ainda é muito melhor do qualquer outro que possa aparecer...
LEONARDO: Mas vocês dois têm divergências nisso... ou não?
WAGNER: Eu acho que sim. Eu, quando defendo as diretas – e foi curioso porque falando desse pessoal que acompanha o Aécio...tem uma gente que está sem discurso...
LEONARDO: Foi como encontrar a mulher com outro na cama...
WAGNER: Então, eles estão sem discurso. Houve um movimento de trazer essas pessoas que votaram... porque, veja, eu penso assim: nem todo mundo que votou em Trump é um fascista...nem todo mundo que votou em Dória... existe um discurso de assimilação rápida que a mídia, a direita é muito eficaz em fazer: “bandido bom é bandido morto”... “pra acabar com a corrupção tem que ir todo mundo pra cadeia”... é um discurso muito fácil...e as pessoas entram muito nesse jogo. Com essa decadência do PSDB, do Aécio, do governo, eu acho que existe uma parcela da população grande que está sem discurso e seria importante que essas pessoas se juntassem com o movimento pra tirar Temer de onde ele está e pra exigir eleição direta que seria, a meu ver, a única solução para resolver o problema da legitimidade...
LEONARDO: Mas você não apoia o Lula, como a Márcia...
MÁRCIA: Não, gente!
WAGNER: Eu sinto nessas pessoas uma resistência muito grande às diretas por medo de que Lula ganhe, o que eu acho uma covardia muito grande, uma covardia do ponto de vista moral. O meu pensamento é de que o povo, sim, é soberano e que seria lamentável que elegêssemos um candidato horroroso como Bolsonaro. Por outro lado, essa solução seria uma solução democrática.
LEONARDO: Mais legítima.
WAGNER: Legítima. Teria mais legitimidade do que o que temos hoje. Então, eu acho que deveríamos ter eleição mesmo com o perigo de um fascista chegar ao poder. Sobre Lula eu acho o seguinte. Eu acho que a esquerda precisa de um projeto novo de esquerda. Um projeto novo que ressignifique a esquerda. E eu acho que esse projeto não é representado por Lula.
MÁRCIA: Concordo.
WAGNER: O meu sonho...seria uma chapa... vou dizer... vou lançar uma coisa... Haddad-Freixo. Com um projeto de Brasil.
MÁRCIA: Eu tenho outra proposta. Eu sou filiada ao PSOL. É o partido mais à esquerda, mais crítico que há. Só que às vezes eles exageram. Eu não concordo com muitas opiniões que estão dentro do partido do qual faço parte. Sou feminista. Eu não quero uma chapa de homens brancos, por mais que eu adore o Freixo, o Haddad, eu acho esses caras super-legais, são gente muito boa, gosto muito deles, mas eu quero uma chapa de uma democracia mais radical.
WAGNER: Maravilhoso...
MÁRCIA: Pelo menos tem que ter uma mulher negra nessa chapa.
ALEX: Quem é a mulher?
WAGNER: É o que eu estou dizendo... é uma ressignificação da esquerda... a esquerda precisa se ressignificar inclusive do ponto de vista moral...
MÁRCIA: O PT, pro meu gosto, é muito pouca esquerda, entendeu? Sou muito mais a favor de uma esquerda bastante radical, mas que seja uma democracia radical, uma esquerda muito pensada, que pense na questão indígena no Brasil, gente.
ALEX: Quem é a mulher negra?
WAGNER: Eu tenho uma.
MÁRCIA: Fala!
WAGNER: Áurea.
MÁRCIA: Áurea Carolina. Nossa candidata da “Partida”. Do meu movimento. Sou super a favor. E com Haddad de vice. Ou o Freixo de vice!
WAGNER: Acho que é por aí.
ALEX: Vamos lançar a chapa Wagner-Márcia!
MÁRCIA: (risos) Eu sou feminista... não posso ser vice! Não posso.
LEONARDO: Deixa eu perguntar uma coisa pra você... você falou que é possível votar no Trump e não ser fascista...votar no Dória e não ser fascista... é possível votar no Bolsonaro e não ser fascista?
WAGNER: Eu acho que sim.
MÁRCIA: Claro.
WAGNER: Na eleição de Freixo eu ouvi muitos caras dizerem: pra mim ou é Freixo ou é Bolsonaro.
LEONARDO: Por que acontece isso?
WAGNER: Eu acho que por causa do discurso do corrupto, do cara que não se corrompe...o Bolsonaro passa essa imagem do cara que, embora seja...
LEONARDO: É muita desinformação...
MÁRCIA: As pessoas votam pela aparência das pessoas. Votam no homem branco. O Lula passou um trabalho imenso... a Dilma, também... a Dilma, por ser mulher...e por não fazer aquele jogo das simpatias e por não ser corrupta, etc etc, mas o Lula também, por ser um cara do Nordeste, por ser o trabalhador, por ser o cara que não tem uma parte do seu corpo... só quando ele botou aquelas roupas que os marqueteiros inventaram...
LEONARDO: E que foram feitas por um alfaiate famoso...
MÁRCIA: ... que ele ficou palatável pra estética burguesa, que tem uma moral burguesa e uma política burguesa. E a esquerda está cheia desse “burguesismo”. Então, vamos repensar.
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