Presidente Gilmar Mendes caça votos no Congresso, calibrando o discurso para apelar ao PSDB e ao baixo clero

08 de junho de 2017 às 22h25

  
Foto José Cruz, Agência Brasil
Por Luiz Carlos Azenha
O Brasil é um circo.
Para entender como funciona o circo é preciso olhar por trás da lona.
Constituição, respeito às regras pré-estabelecidas, comportamento ético?
Quem tenta entender o Brasil a partir disso está fadado a naufragar.
A campanha das Diretas nos anos 80, por exemplo, foi lindíssima, mas desde o início foi utilizada como ferramenta para forçar a ditadura a aceitar o resultado de uma eleição indireta no Congresso: Tancredo contra Maluf.
Acabamos governados pelo oligarca Sarney, que mesmo fazendo um governo absolutamente desastroso ainda conseguiu prorrogar seu mandato por mais um ano utilizando concessões de rádio e TV como propina para comprar parlamentares.
O povo, no Brasil, é mero instrumento de pressão, mobilizado de acordo com o objetivo de elites político-partidárias, que nos bastidores negociam à revelia dos interesses populares. Nenhum princípio resiste a uma negociação de bastidores no Brasil.
Isso me ocorreu quando, no julgamento da chapa Dilma-Temer, pelo Tribunal Superior Eleitoral, ouvi o presidente do TSE, Gilmar Mendes, considerar absurda a abertura de inquérito para apurar ilicitudes supostamente cometidas pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.
Gilmar sugeriu que os crimes estariam prescritos. Ora, pensei com os botões do Mino Carta, será que o Gilmar não deveria ter evitado dar o exemplo, uma vez que foi indicado para a Corte justamente por FHC?
Em intervenções anteriores, Gilmar frisou mais de uma vez que atribuía ao tamanho do Estado brasileiro o fenômeno da corrupção.
Se o Estado fosse menor, haveria menos chances de se corromper agentes públicos.
O curioso é que Gilmar, o sócio do Instituto Brasiliense de Direito Público, por um lado mama nas tetas do Estado brasileiro através de contratos com o poder público, mas de outro tira o foco do banqueiro Daniel Dantas, do empresário Eike Batista, da Odebrecht e da JBS quando é conveniente atacar o Estado e esquecer os corruptores.
Fiquei com a pulga atrás da orelha: as emissoras de TV de alcance nacional vão concentrar sua cobertura, certamente, na denúncia de que a chapa Dilma-Temer recebeu propina na campanha de 2014. Não vão dizer que os adversários Aécio-Aloysio Nunes fizeram o mesmo, nem que Aloysio hoje serve ao governo corrupto de Temer.
Ora, se é assim, a quem se dirige o discurso de Gilmar Mendes?
Fernando Rodrigues, do Poder 360, desfez minhas dúvidas: ao PSDB, mas principalmente ao baixo clero do Congresso. O baixo clero vai se dar conta, se ainda não se deu, de que Gilmar Mendes tem hoje maior capacidade de guerrear a Lava Jato no campo do judiciário do que a desmoralizada trupe de Temer.
Foi justamente por isso que Rodrigo Janot atirou em Aécio mas mirava em Gilmar.
O discurso de Gilmar, portanto, é discurso de candidato ao Planalto pela via indireta, depois do desembarque dos tucanos do governo, previsto para acontecer semana que vem.
Gilmar é o mais próximo que o PSDB poderia desejar na presidência, mantendo Henrique Meirelles na Fazenda, o projeto de desmantelar o Estado brasileiro e ao mesmo tempo evitando que a Lava Jato devore os tucanos até 2018.
Não se esqueçam que, na suposta delação do ex-ministro Antonio Palocci, vazada como balão de ensaio no Correio Braziliense, figurariam com destaque o banqueiro Andre Esteves, do BGT Pactual, montadoras de automóveis e empresas de comunicação.
O vazamento colocará pesos pesadíssimos do PIB brasileiro na corrida por um acordão que enterre a Lava Jato o mais rapidamente possível. Gilmar, como sabemos, em suas decisões judiciais é amicíssimo do PIB.
Fernando Rodrigues reproduziu outra fala de Gilmar durante o julgamento no TSE: “Há exageros. Às vezes, por questões pequenas cassamos mandatos. É preciso moderar a ‘sanha cassadora‘, porque você coloca em jogo outro valor, que é o valor do mandato”. 
Isso soa como música aos parlamentares que estão sob investigação no Congresso.
Portanto, no horizonte, temos a possibilidade, em uma eleição indireta na Câmara, de um confronto entre Gilmar — “o neutro”e “apolítico” — contra Rodrigo Maia-Aldo Rebelo, que numa entrevista ao Nocaute deixou claro que pode se transferir para o PSB e rejeitou aliança com Lula.
O senador afastado Aécio Neves deixou claro, na conversa gravada por Joesley Batista, que faltava coragem a subordinados de Temer para fazer o que precisava ser feito contra a Lava Jato. Provocou a queda do ministro da Justiça, Osmar Serraglio. Mas, no teatro do TSE, o espetáculo de Gilmar foi um lembrete de o quanto ele pode trabalhar nos bastidores pelo resultado desejado.
Segundo Fernando Rodrigues, as regras de uma disputa eleitoral indireta seriam decididas pela Mesa Diretora do Congresso, composta pelo senador Eunício Oliveira (PMDB-CE), presidente; deputado Fábio Ramalho (PMDB-MG), vice-presidente; senador João Alberto Souza (PMDB-MA), 2º vice-presidente; deputado Giacobo (PR-PR), 1º secretário; senador Gladson Cameli (PP-AC), 2º secretário; deputado JHC (PSB-AL), 3º secretário; senador Zeze Perrella (PMDB-MG), 4º secretário.
Eunício, o “Índio”, é suspeito de receber R$ 2,1 milhões para aprovar a MP 613, que desonerou a cadeia de produção do etanol e beneficiou a Odebrecht; Fábio Ramalho, o Fabinho, é mais conhecido pelas festas que promove em seu apartamento funcional, com a presença de modelos-manequins de reputação ilibada se comparada à de muitos deputados; João Alberto é filhote do oligarca José Sarney; Giacobo é aquele que ganhou R$ 134 mil em doze sorteios diferentes da Caixa em apenas duas semanas, em 1997; Cameli é outro investigado na Lava Jato; João Henrique Caldas é amigão de Eduardo Cunha e Zeze Perrella está sob investigação na Operação Patmos como sub-receptor de propina, subordinado a Aécio Neves.
São os homens que pretendem definir as regras da escolha do futuro presidente do Brasil. E vocês ainda levam isso aqui a sério? Ouçam, abaixo, as conversas gravadas entre Aécio e Gilmar Mendes e Zeze Perrella.

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