27/09/2017

A ditadura começa quando a “moral” se substitui ao Direito

crossjust
Ironias e “justiça poética” à parte, há uma situação perigosa na decisão de afastar Aécio Neves do mandato e criar uma “meia-cassação” e uma “meia prisão” tomada pelo Supremo Tribunal Federal.
Fernando Rodrigues, no Poder360, com toda a razão, chama a atenção para o absurdo de vivermos uma situação onde o Judiciário, quando quer e como quiser, definir se e como um mandato parlamentar pode ser exercido.
Com Eduardo Cunha, a gaveta aguardou o necessário para que ele desfechasse o processo de impeachment, quando executada, foi o suficiente.
Com Delcídio do Amaral, preso em flagrante, a decisão foi submetida ao plenário do Senado. Aprovada, mas poderia não sê-lo.
Com o deputado Celso Jacob, ele fica preso na Papuda e pode sair para votar, na plenitude do mandato.
Agora, com Aécio, vive-se a dúvida de se a decisão de “meia-prisão” e da “meia-cassação” vai ao plenário do Senado, com resultados duvidosos.
Tão grave quanto não se ter – ou respeitar – uma regra única quando se trata de suspender um mandato ou “semiaprisionar”, sem prazo definido, uma pessoa, é o fato de que tudo esta eivado de julgamentos “morais”, em lugar dos legais.
O trecho do voto de Luiz Fux, transcrito por Rodrigues, é estarrecedoramente “moral”:
Muito se elogia porque ele [Aécio] se despediu da presidência do partido. Ele seria muito mais lisonjeado, muito mais elogiado se ele tivesse se despedido alí do mandato, tivesse se distanciado. (…) Tudo se resume num gesto de grandeza que 1 homem público deveria ter adotado. E já que ele não teve esse gesto de grandeza, nós vamos auxiliá-lo a que se porte tal como deveria se portar.”
Com a devida vênia, Ministro, vá plantar batatas. O papel do STF não é “auxiliar a se portar como deveria se portar”, é aplicar a lei.
Não importa que Aécio Neves seja um lixo, a esta altura devidamente descartado do projeto golpista.
Se o comportamento de Aécio Neves está – e tudo mostra que está – fora da lei, é papel do STF fazê-lo responder por ele. Dispensam-se as considerações de natureza ética, porque ética é matéria que não pertence ao Supremo, mas ao próprio Senado onde, aliás, foi solenemente ignorada.
A consciência democrática tem de rejeitar o “direito penal do inimigo”, mesmo quando se trata de uma figura abjeta como a de Aécio Neves.
A prisão de Aécio Neves, pela profusão de provas de que ele praticava achaque sobre os “irmãos JBS”, com gravações, malas e ameaças de morte era plenamente justificável se necessária à instrução do processo e à colheita de provas, como se fez com sua irmã e com o apanhador-“matável” Fred, seu primo.
Quatro meses depois, sem a menor ocorrência de fato novo e deixando que, das seis às 18 horas, ele possa articular livremente qualquer ato de obstrução à Justiça, desde que fora do Senado, assume ares de “punição moral”, própria do autoritarismo.
Porque, amanhã, o Supremo está legitimado para que seja senador apenas quem ele “quer”.

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