Emílio Rodriguez: Até quando OAB, MPF, STF vão ficar calados diante da crucificação da arte e a destruição do Estado Laico?

viomundo

17 de setembro de 2017 às 15h51


Picasso (Guernica), Munch (O Grito), Chagal (Rosa Azul) e Kandinsky  eram alguns dos artistas “degenerados” do passado na Europa nazista. Assim como é no presente a performance de Viviany Beleboni, na parada gay de 2015, em São Paulo
A Crucificação da Arte e a luta para salvar o Estado Laico e a Democracia….
por Emílio Rodriguez, especial para o Viomundo
No Brasil, a liberdade de expressão e a arte também estão sob forte ataque.
Nos últimos 15 dias, isso aconteceu pelo menos três vezes.
Em Porto Alegre, uma exposição foi cancelada devido à ação de milícias fascistas do MBL (Movimento Brasil Livre).
A repercussão negativa foi tamanha que o Ministério Público foi vê-la e desmascarou os obscurantistas: não se tratava de incitação à pedofilia.
Depois, em Campo Grande (MT), a polícia a apreendeu uma tela exposta no Museu de Arte Contemporânea do Mato Grosso do Sul, sob a acusação de “apologia à pedofilia.
A intenção é justamente o contrário, reagiu  a artista mineira Ropre, autora da tela: O quadro denuncia o machismo!
Nessa sexta-feira, um juiz passa por cima dos fundamentos do Estado Democrático de Direito eproíbe uma peça de teatro.
A democracia tem como pressupostos a tolerância, a liberdade de expressão e a defesa do direito de expressão da minoria.
Quando um grupo social busca impor sua visão sobre os demais e as instituições ditas democráticas, ao silenciar, aceitam, isso é sinal – atenção! – de que a democracia está em perigo real.
Cadê os verdadeiros liberais para defender o Estado laico e os fundamentos do Estado de Direito?
Cadê o Ministério Público, que tem como missão garantir os direitos das minorias?
Inegavelmente, o MBL assume cada vez mais o seu fascismo.
Não bastasse invadir as escolas públicas no Paraná, agora usurpam uma exposição de arte, assumindo o assume o papel de censor da chamada “arte degenerada”, tal como fizeram os nazistas na década de 1930.
Os adoradores de Hitler pregavam que toda arte moderna, como as de Pablo Picasso, Van Gogh, Kandinsky, Chagal e muitos outros, era degenerada e deveria ser eliminada.
O nazismo defendia o padrão clássico, que retoma a arte do Renascimento, que se aproximava do padrão típico da raça ariana.
Assim, tal como os nazistas, os MBL da vida acham que tudo que lhes é “estranho” ou questiona o modo de verem o mundo deve ser negado e não pode ser exibido.
Por isso, agora, querem impor a censura e decidir o que eu posso ou não assistir.
Por quê?
Tirar o ser humano da zona de conforto é uma das funções da arte.
Assim, às vezes choca nos obrigando a refletir sobre nós como seres humanos e nossa ação no mundo e questionar.
E, aí, o x da questão: esses grupos fascistas não admitem questionamentos, críticas. Por isso, passam a perseguir e tentar destruir todos que divergem deles em todos os planos, inclusive no religioso.
Por que um Estado Laico?
Por uma razão muito simples: impedir guerras religiosas dentro de um país, como ocorreram, por exemplo, na França no século XVI.
Por isso, no século XVIII os iluministas substituíram o fundamento do poder do direito divino dos reis pelo pacto social fundado na vontade popular.
Enfraquecer o estado laico é criar condições para uma guerra religiosa futura.
Além disso, lembre-se de que, durante o golpe de 2016 contra a democracia brasileira, líderes religiosos de extrema direita se juntaram ao MBL.
São os mesmos que agora estão nesta cruzada contra a “arte degenerada” e querem ser os fiscais da minha, da sua consciência.
Ironicamente, afrontam a religião.
Por quê?
Por se acharem DEUS que não pode ser questionado e que a VERDADE deles tem de ser a de toda a sociedade.
Há ainda outro ponto político importante que incomoda esses grupos fascistas.
Os artistas foram a vanguarda da luta contra o golpe que derrubou a presidenta Dilma e colocou no poder a quadrilha comandada por Temer e aliados.
Daí a censura, pretendem calar um setor que é crítico por natureza.
A arte muda a forma de o ser humano ver o mundo.
A arte tem o poder de atingir a nossa alma.
A arte nos liberta da condição de escravos do mundo capitalista e nos torna gente.
Por isso, querem calar os diferentes.
Sou cristão, mas defendo a tolerância.
Há uma frase de Voltaire que deveríamos ter sempre tem mente:
“Posso não concordar com nada do que você diz, mas vou defender seu direito dizê-lo até a morte”.
Hoje você cassa o direito alguém se manifestar, mas amanhã alguém poderá calar a sua voz.
Sempre fui contra a censura. Pode-se discordar da peça de teatro, mas jamais impedir sua exibição.
Já tivemos homens religiosos envolvidos em escândalos de corrupção e pedofilia, por exemplo.
Mas jamais eles foram impedidos de ter livre religião, jamais se impediu um culto.
Então por que proibir uma peça de teatro ou uma exposição?
Destruir ou enfraquecer o Estado Laico e passar por cima da liberdade de expressão são passos rumo à ditadura, ainda mais quando já vivemos o estado de exceção.
Na década de 1980, a peça de Plínio Marcos sobre Jesus Negro causou enorme comoção.
Hoje, os registros históricos mostram um Jesus homem de pele tostada e muito diferente da imagem clássica de um homem branco de olhos azuis. E, aí, como fica?
Eu sei que as instituições foram avacalhadas pelo golpe, estão inclusive desmoralizadas. Mas não temos outra saída que não lutar pela manutenção do Estado de Direito.
Cadê OAB, Ministério Público, STF?
Vão deixar que fundamentalistas religiosos e grupos de extrema direita continuem a crucificar a arte?
Senhores e senhoras, por favor, deixem de olhar os seus umbigos e ajudem a salvar a nossa já combalida democracia enquanto ainda há tempo.
Sugiro, agora, que assistam o documentário Arquitetura da Destruição que desnuda a propaganda nazista e a história do governo de Hitler.

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