Para ser aprovado, o texto precisa do apoio da maioria simples dos deputados presentes
BRASÍLIA (Reuters) - A bancada evangélica na Câmara dos Deputados rachou quanto ao apoio ao projeto de lei das fake news, com integrantes mantendo oposição à proposta mesmo após o relator Orlando Silva (PCdoB-SP) ter alterado o texto para atender suas reivindicações no parecer final, disseram deputados e fontes do grupo à Reuters.
Com cerca de 130 deputados, a frente parlamentar evangélica -- que reúne congressistas de diversos partidos -- é tida como decisiva para o avanço do projeto na Câmara, que foi anunciado pelo presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), para ir à votação na próxima terça-feira, dia 2 de maio.
Nesta semana, o requerimento de urgência da intitulada Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet foi aprovado pelo plenário da Câmara por 238 votos a 192. Uma fonte da bancada estimou que, nessa votação, 40% dos votos foi para cada lado e 20% não votaram, em meio a acaloradas discussões sobre a possibilidade de eventual censura da atuação dos religiosos nas redes sociais com a implementação das mudanças.
A discussão da matéria ganhou fôlego nos últimos meses na esteira de atentados violentos em escolas e os ataques às sedes dos Três Poderes do 8 de janeiro, com o governo Lula e a cúpula do Judiciário pressionando por uma legislação mais efetiva para coibir eventuais delitos incitados ou gestados por meio dessas plataformas.
As big techs, como são conhecidas as gigantes do setor, têm defendido que haja um tempo maior para a discussão do assunto. Para Marcelo Lacerda, diretor de Relações Governamentais e Políticas Públicas do Google Brasil, a proposta “traz sérias ameaças à liberdade de expressão”.
Para ser aprovado, o texto precisa do apoio da maioria simples dos presentes, desde que haja quórum de pelo menos 257 deputados dos 513 da Casa.
Na última versão do texto, após reuniões com a bancada evangélica, Orlando Silva atendeu a sugestões feitas pelo grupo. Segundo fontes, o relator deixou expresso que a aplicação da nova lei vai levar em conta o "o livre exercício da expressão e dos cultos religiosos, seja de forma presencial ou remota, e a exposição plena dos seus dogmas e livros sagrados".
Um dos expoentes da bancada, o deputado Marco Feliciano (PL-SP) disse à Reuters que, apesar das modificações, a tendência é que a maioria da frente vote de forma contrária ao texto. Não há, entretanto, fechamento de questão -- quando todos seguem uma orientação -- porque se trata de bancada suprapartidária.
Segundo Feliciano, houve uma conversa "por educação" da frente com o relator, mas ele deixou claro que não houve "acordo algum". "Na medida que fomos estudando percebemos que, embora tenha coisas boas, a sua essência no geral (do projeto) é muito ruim", disse.
Questionado especificamente sobre as mudanças feitas pelo relator, Feliciano disse que "tudo depende de interpretação".
"Eu questionei o relator sobre o que diz o PL na questão de racismo, preconceito, etc. O STF comparou o crime de homofobia ao crime de racismo", disse Feliciano. "Como fica um pastor ou padre pregando sobre o pecado e ser processado? As plataformas movidas por inteligência artificial, algoritmos, saberão separar a liberdade religiosa sobre pecado do preconceito? Até se provar que focinho de porco não é tomada, o usuário terá sua conta derrubada", criticou.
Em discurso no plenário na quinta, antes da versão do novo texto ter sido formalmente apresentada, o coordenador da frente parlamentar, Eli Borges (PSD-TO), disse que não havia qualquer tipo de negociação de voto com a bancada.
"A frente trabalha, luta e defende a sua base com todas as forças que tem, mas voto é uma questão individual. Nós queremos apenas que respeitem a nossa liberdade religiosa”, destacou ele. Procurado na sexta, ele não quis falar.
Outra liderança da frente, o deputado Cezinha de Madureira (PSD-SP) disse que o relator atendeu a todas as exigências da bancada e que é preciso que haja responsabilidade dos deputados para se construir o melhor caminho para avançar com a proposta. Para ele, é preciso que parte do segmento não faça oposição pura e simples.
"É um contra ideológico", afirmou. "Fazer oposição fazem aqueles que têm a sua pauta própria. Nós não estamos preocupados com direita e esquerda, não. Nós somos o centro de tudo, a igreja é 40% da nação e temos que ajudar o país a continuar crescendo, ter ordem e paz. Nós não somos extremos", criticou.
Madureira compartilhou em sua conta de Instagram um vídeo no qual o relator Orlando Silva assegura que não haveria o banimento de versículos da Bíblia das redes sociais caso o texto vire lei.
O deputado evangélico reconhece que há uma divisão na frente, mas, embora possa haver ainda pontuais modificações, avalia que o melhor seria aprovar a matéria para que não se continue ocorrendo, em suas palavras, "ativismo judicial" no tema. Mesmo diante do racha dos evangélicos, disse estar confiante na aprovação do texto na Câmara.
Nenhum comentário:
Postar um comentário