Desde o dia 3 de abril, diferentes campi do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo (IFSP), maior do Brasil com mais de 60 mil estudantes e 5 mil servidores e servidoras, entraram em greve aderindo ao movimento paredista realizado em todo o país, com unidades interrompendo suas atividades regulares em datas diferentes, algumas totalmente e outras de maneira parcial. De lá para cá, estudantes do IFSP reuniram-se em suas assembleias e declararam apoio ou aderiram à greve.
As pautas da greve são:
. Recomposição do orçamento das
Universidades e Institutos Federais e reajuste imediato dos auxílios e bolsas
estudantis: atualmente os Institutos Federais possuem 40% a mais de estudantes
do que em 2015, porém, o orçamento é o mesmo daquele ano, inviabilizando o
aumento de recursos destinados à assistência estudantil, ao bandejão
(pouquíssimos campi do IFSP têm esse serviço), aos insumos para pesquisa e à
manutenção da estrutural predial.
. Recomposição salarial: no governo
anterior, técnico-administrativos em educação (TAE) e professores ficaram os 4
anos sem nenhuma forma de reajuste salarial, acumulando uma perda de rendimento
de 27%. Por conseguinte, muitos TAE se desligaram das Universidades e
Institutos Federais para trabalhar na iniciativa privada ou em outra esfera
pública, como nas municipais e estaduais.
. Reestruturação das carreiras das
Instituições Federais de Ensino: o piso salarial dos técnico-administrativos é
muito baixo e pouco atrativo para a contratação de novos profissionais. Para
quem ingressou com formação de Ensino Fundamental completo, o piso é de R$
1.446,12; e para aqueles que são aprovados em concurso público para exercer
cargo que exige formação de Ensino Médio completo, o montante é de R$ 2.667,19.
Mesmo entre os docentes dos Institutos Federais a desvalorização é grande. Como
estes têm um plano de carreira que valoriza a titulação (trajetória acadêmica)
e quase todos os profissionais são doutores e pós-doutores, recebem um
adicional por isso, porém, o salário base por 40 horas semanais de trabalho
está abaixo do Piso Salarial Profissional Nacional do Magistério Público da
Educação Básica, atualmente em R$ 4.580,57. Como consequência, quando um
docente se afasta para qualificação ou por outro motivo, os Institutos Federais
enfrentam dificuldades para contratar professores substitutos, pois o
rendimento oferecido a estes é o salário base.
. Revogação de todas as normas que
prejudicam a educação federal aprovadas nos dois governos anteriores: entre
essas medidas estão o aumento de carga horária docente inviabilizando a
concretização de pesquisa e extensão; e a revogação do Novo Ensino Médio.
Essas pautas de reivindicação foram
apresentadas ao presidente eleito em novembro de 2022, ainda na transição. No
início de 2023, entidades representativas dos trabalhadores das Instituições
Federais de Ensino novamente protocolaram esse documento. Depois de muito
diálogo, Lula concedeu um reajuste de 9%, bem aquém das perdas salariais dos
últimos anos. Porém, seus ministros pediram paciência, pois outras medidas
viriam em breve. Findado o ano, o governo divulgou, próximo ao Natal, proposta
de 0% de reajuste para 2024, com uma melhora nos benefícios (alimentação,
creche e saúde). Os sindicatos protestaram e os Ministérios de Gestão e Inovação
(MGI) e Fazenda sinalizaram que, com o aumento da arrecadação, haveria reajuste
em 2024.
Os dados econômicos oficiais
revelaram um crescimento na receita de 10 bilhões de reais nesses primeiros
meses. Além disso, outras categorias como Polícia Federal, Polícia Rodoviária
Federal, Polícia Penal Federal, Banco Central e Auditoria Fiscal foram
atendidos com reajuste ou reestruturação da carreira. Por que os servidores da
educação, maior contingente do serviço federal, foram ignorados?
Ao mesmo tempo em que o Ministério da
Fazenda afirma que não há dinheiro para servidores federais da educação, a
imprensa informa a liberação de 6 bilhões de reais para emendas direcionadas ao
chamado Centrão.
Com a paralisação dos servidores dos
Institutos Federais a partir do dia 3 de abril (somando-se aos
técnico-administrativos das Universidades que já estavam em greve), rapidamente
o governo se movimentou e convocou as entidades representativas para reuniões
nos dias 10 e 11 de abril. A proposta apresentada mostrou-se muito aquém
daquela aguardada pelas categorias: termo de compromisso sobre a elevação nos
valores dos benefícios priorizando quem ganha menos e tem maior idade. Sobre a
reestruturação das carreiras, indicou a criação de mesas específicas para cada
grupo de trabalhadores; e sobre o reajuste salarial, nada foi falado. A
ministra de Gestão e Inovação concedeu entrevista na quinta, 11, e comentou
sobre o esforço do governo para conseguir espaço no orçamento e apresentar uma
contraproposta em uma ou duas semanas. Na mesma quinta-feira, o governo
convocou a Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de
Ensino Superior (Andifes) para reunião e indicou o empenho para atender as
pautas acima. Também foram convocadas as entidades representativas para uma
reunião na próxima sexta-feira, dia 19. Portanto, o movimento paredista já
resultou numa maior mobilização e atenção por parte do governo à situação
precária nas Instituições Federais de Ensino.
Porém, na ausência de resposta
assertiva, docentes das Universidades devem aderir à greve a partir do dia 15
de abril, somando-se ao movimento paredista. Durante esta semana, diferentes
atividades em defesa da educação federal estão programadas, com destaque para a
Audiência Pública na Câmara dos Deputados (16, às 16 horas), a Marcha dos
Servidores Públicos Federais em Brasília (17, às 9 horas) e as Atividades
Setoriais e Específicas pela Reestruturação das Carreiras.
A greve é o último instrumento
acionado pela classe trabalhadora para pressionar o patronato e autoridades e,
assim, garantir condições materiais e simbólicas dignas de trabalho. Servidores
e servidoras da educação federal não queriam paralisar as suas atividades.
Sabem do transtorno causado aos estudantes, aos responsáveis legais, aos
próprios técnico-administrativos e docentes e à sociedade de forma geral. No
entanto, o governo não apresentou, até o momento, proposta concreta que
valorize de fato as Instituições Federais de Ensino, como prometido em campanha
eleitoral.
Depois dos traumas golpistas de
2015/2016, questiona-se sobre o melhor momento para se promover uma greve.
“Esta não enfraqueceria um governo de matriz popular?” “Os grupos neoconservadores
não tomarão de assalto o movimento grevista para desgastar o governo?” A greve
das Instituições Federais de Ensino não é contra o governo Lula. Ao contrário.
É um movimento que disputa um orçamento que hoje é fortemente controlado por
lobistas de diferentes setores econômicos e o Centrão. Ou seja, essa greve é
para que o orçamento contemple o campo que, em períodos eleitorais, diferentes
candidatos e candidatas enfatizam e afirmam que é o futuro do Brasil. Essa
greve é pela educação pública, de qualidade e socialmente referenciada. Uma
greve para disputar o governo Lula e não deixá-lo à reboque da casa grande.
Para fortalecer aparelhos de Estado que historicamente defendem a democracia.
Uma greve para que o governo Lula seja, de fato, nacional-popular.
Rogério de Souza. Professor no IFSP e
Coordenador do Sindicato Nacional dos Servidores Federais da Educação Básica,
Profissional e Tecnológica de São Paulo (Sinasefe-SP)
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