FABIO SERAPIÃO
Interceptações telefônicas realizadas durante as investigações do suposto esquema de fraudes em licitações em Campinas colocam sob suspeita contratos da Sabesp com empresas ligadas ao empresário Gregório Wanderlei Cerveira, que chegou a ser preso em maio e confessou ter pago R$ 400 mil aos lobistas Maurício de Paulo Manduca e Emerson Geraldo de Oliveira – os dois também foram detidos por intermediarem “negócios” em empresas municipais campineiras na gestão do prefeito Dr. Hélio (PDT).
Com base nos diálogos, relatório do Ministério Público Estadual (MPE) sobre o caso afirma que pode-se “concluir pela possível existência de outros contratos fraudulentos”, que “deverão ser investigados no momento oportuno”. Tanto a estatal paulista quanto o empresário negam irregularidades.
Nas conversas gravadas pela polícia a pedido do MPE, Cerveira e o então diretor comercial de uma de suas empresas, João Thomaz Pereira Júnior, mostram-se preocupados com a possibilidade de notícias sobre o envolvimento nas denúncias de irregularidades em Campinas “contaminarem” contratos com a Sabesp.
Para os promotores do Grupo de Atuação Especial no Combate ao Crime Organizado (Gaeco) de Campinas, a preocupação dos empresários da Hydrax Saneamento de Tubulações é um indício de ilicitudes nos contratos com a empresa. Os dois, avalia a Promotoria, “também demonstram preocupações com outros negócios, possivelmente ilícitos, de empresas com as quais mantêm acordo”. Em um dos diálogos, o diretor comercial pede que Cerveira não cite o nome da Sabesp em seu depoimento ao MPE.
Preso no dia 20 de maio em uma megaoperação coordenada pelo MPE, Cerveira tem participação na Hydrax, na Camp Saneamento de Tubulações e integra os consórcios Centro Córrego Limpo, Canal Limpo Guarujá e Performance Praia Grande. Ao todo, empresas e consórcios possuem cerca de R$ 58 milhões em contratos com a Sabesp.
EscutasEm uma conversa de 11 minutos na noite de 8 de abril, ao comentar a manchete de um jornal da região de Campinas, o diretor comercial alerta Cerveira sobre o perigo de a notícia da investigação de fraudes em licitações na Sanasa, empresa de saneamento de Campinas, contaminar outros contratos. Para Pereira Júnior, a citação do nome Hydrax nos jornais iria “começar a complicar em alguns lugares” e para isso era necessário “tomar alguns cuidados com empresas com que temos acordo”.
Durante a ligação, o diretor ressalta que outros jornais devem publicar fatos e se mostra preocupado ao citar que a Sabesp teria ciência do envolvimento da empresa no escândalo campineiro. “Agora apareceu no jornal, loguinho (sic) Sabesp tá sabendo. Loguinho outros jornais publicam”, diz ele, para em seguida completar que seria necessário “montar uma estratégia para você (Cerveira) sair das empresas”. “Se não contamina tudo e vai tudo para o saco”, afirma.
‘Doença contagiosa’No mesmo dia, os dois voltam a conversar e Pereira Júnior reforça a necessidade de evitar que a investigação atingisse outros contratos da empresa. “Se vem o bochicho, vem à história toda. Isso vai dar uma espirrada legal, entendeu? Temos que pensar em uma estratégia total, entendeu?”, enfatiza Pereira Júnior antes de perguntar ao dono da Hydrax: “Quando você tem alguém com alguma doença contagiosa, você tem que fazer o quê?” “Isolar”, responde Cerveira.
Cinco dias depois, os dois empresários voltaram a conversar e Pereira Júnior pediu que Cerveira não citasse nem a Sabesp nem a prefeitura de Jaguariúna em seu depoimento aos promotores. “Vandão (Cerveira), não envolve nome de Sabesp e da Prefeitura de Jaguariúna, pula fora desse assunto”.
Outro ladoProcurada pelo JT, a Sabesp informou que não se manifestará sobre as interceptações telefônicas nas quais é citada porque não teve acesso à totalidade do conteúdo dos grampos.
A estatal paulista tem contrato de R$ 48, milhões firmado em janeiro de 2009 com o Consórcio Performance Praia Grande que, além da Hydrax, tem o próprio Gregório Cerveira como sócio.
O negócio, que prevê a recuperação hidráulica e otimização do sistema de distribuição de água na cidade do litoral sul, está sendo analisado pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE).
Em 2010, a assessoria técnica do órgão apontou possíveis irregularidades no processo de concorrência. O JT solicitou ao TCE o parecer da área técnica, mas sua assessoria de imprensa informou que não pode fornecê-lo antes do julgamento final. Sobre o parecer técnico do tribunal, a Sabesp alegou apenas que a análise do TCE é um ”procedimento de praxe”.
Para o advogado de Cerveira, Antônio Carlos Germano Gomes, o suposto indício de ilicitudes nos contratos apontado pelos promotores é insustentável. Segundo ele, a preocupação demonstrada pelos empresários refere-se a um possível “prejuízo empresarial” que a Hydrax teria caso seu nome fosse envolvido no escândalo de Campinas.
“A Hydrax já havia tido um problema com a Sabesp por não conseguir dar conta de um contrato devido a problemas de caixa. Caso os jornais divulgassem e surgissem dúvidas sobre a idoneidade da empresa, esses contratos poderiam ser suspensos”, explicou.
Análise:
O combate, sem tréguas, à corrupção, um dos papeis inerentes à
ação do Ministério Público de SP (MPE-SP), deve ser a regra e
apurado, doa a quem doer e independente de partidos políticos, em todos os
níveis da administração pública, envolvendo prefeituras paulistas e órgãos e
empresas vinculadas ao governo do Estado de SP.
O governo Alckmin sabe que por pouco não teve de disputar o segundo
turno em 2010. O quadro sucessório estadual que se abre para 2014 não lhe é
nada favorável, visto que outros dois nomes podem dividir os seus votos Kassab
(PSD) e Skaf (PMDB), além da candidatura do PT. Neste cenário, o segundo
turno seria inevitável, gerando preocupações no Palácio dos Bandeirantes.
Alckmin sabe que é necessário impor derrotas ao PT e seus aliados em 2012,
senão a derrota em 2014 é quase certa. Por isso, as apurações de fraudes do
MPE-SP, focando apenas cidades e regiões onde o PT e seus aliados
têm potencial de crescimento, enquanto que as apurações envolvendo seu governo
apenas de arrastam, para não dizer que são engavetadas, se encaixam plenamente
no planejamento estratégico de seu governo.
A atuação da Máfia da Merenda, cujo esquema de
pagamentos de propinas perpassa por diversas prefeituras paulistas, tem
seu ápice de fraudes e de supostos pagamentos de propinas para fins eleitorais
nas gestões Serra e Kassab da prefeitura de São Paulo. Januário
Montone, ex-secretário de Gestão do Serra e atual secretário de Saúde de
Kassab, é um dos supostos administradores públicos que
receberam propinas. Outro articulador deste esquema é Paulo César
Ribeiro, irmão da primeira-dama Lu Alckmin e cunhado do
governador Geraldo Alckmin.
Num passe de mágica, as notícias sobre ambos saem da mídia.
Simultaneamente, as apurações do MPE-SP, envolvendo o resultado das apurações
de atuais e ex-administradores de cidades como Jandira,
anteriormente, e Jales, nesta última sexta-feira, 10/06, ganham destaque
pelas mídias locais e com posteriores repercussões nos grandes jornais e
emissoras de TV.
Situação semelhante ocorre com as apurações pelo
MPE-SP da denominada Máfia das Licitações, envolvendo suspeitas de
fraudes em contratos feitos por algumas prefeituras, entre as quais
Campinas, por intermédio da empresa municipal Sanasa (Sociedade de Abastecimento
de Água e Saneamento S/A), e órgãos e empresas do governo do Estado de SP.
Ressalte-se que entre as diversas empresas investigadas pelo MP, estão as do
Grupo Cepera, dos Conglomerados Camargo Corrêa e Saeng e a empresa Hydrax.
O Grupo Cepera, investigado em Campinas, tem
contratos com a Sanasa, de aproximadamente R$ 70 milhões. Este mesmo grupo,
porém, tem contratos em torno de R$ 500 milhões com órgãos e do governo de S.
Paulo: Sabesp, Companhia Paulista de Obras e
Serviços, Departamento de Perícias Médicas do Estado de São Paulo, Secretaria
de Saúde do Estado de São Paulo, Imprensa Oficial, e Prodesp.
Se os indícios são de corrupção são generalizados, envolvendo empresas
do governo do Estado de SP como consta de nota emitida pelo MP, por que o
foco está apenas direcionado para Campinas e restritos ao Grupo Cepera?
Diante destes fatos, percebe-se, de um lado, uma ação concreta do
MP no combate às fraudes, o que é salutar, em relação a determinadas
prefeituras; de outro, o total desconhecimento da opinião pública, em razão do
segredo de justiça, das apurações feitas pelo MP envolvendo fraudes
praticadas por administradores de órgãos e empresas do governo de SP.
Fica-se com a impressão que, nestes casos, as apurações que deveriam ser feitas
pelo MP são delegadas às empresas e órgãos do Estado de SP para realização
apenas de auditorias internas.
Por tudo isto, a apuração com profundidade dos fatos relatados pelo
MPE-SP, com seu resultado trazido ao conhecimento público, seria a forma de
garantir transparência e impedir que estes fatos, independente dos
partidos políticos envolvidos, se repitam e provoquem prejuízos aos cofres
públicos
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