27/07/2011

SP tem R$ 10 bi em caixa, mas tira verba de obras


CRISTIANE BOMFIM
A Prefeitura de São Paulo tem R$ 10,07 bilhões guardados e intocáveis em contas e aplicações financeiras. O valor é referente a maio e representa 28,28% do orçamento total (R$ 35,6 bilhões) previsto para ser gasto neste ano em todas as áreas. Mesmo com tanto dinheiro em caixa, o prefeito Gilberto Kassab está retirando verba de projetos importantes. Em decreto de 22 de junho, ele remanejou R$ 593,29 milhões de diversas obras – como a canalização do Córrego Zavuvus, em Americanópolis, zona sul. Nos dois últimos verões, enchentes nesse córrego provocaram a morte de seis pessoas.
Segundo a Prefeitura, o remanejamento de verbas não prejudica e execução de investimentos programados. Em nota, a administração municipal disse que a transferência de R$ 593,29 milhões para pagamento de dívidas e condenações judiciais ocorreu porque a maior parte dos projetos está “em fase de licitação ou projeto e terão os recursos restituídos na medida que forem necessários”.
Os balancetes provisórios de junho e julho apontam para superávit inferior ao de maio – de R$ 7,7 bilhões e R$ 9,2 bilhões, respectivamente –, mas os valores podem ser maiores já que, segundo a própria Prefeitura, a contabilidade desses meses não foi finalizada.
A lista de projetos e obras que perderam parte dos recursos tem 294 itens. Entre eles estão promessas de Kassab, inclusive algumas citadas como metas da Agenda 2012 da Prefeitura. Um dos exemplos é a duplicação da Estrada do M’Boi Mirim. Motivo de protestos em março e abril por causa dos congestionamentos constantes e má qualidade do transporte público, a ampliação da via já perdeu R$ 11 milhões.
O mesmo ocorreu com verba prevista para canalização de córregos e construção de piscinões: R$ 88,34 milhões foram remanejados para pagar dívidas municipais. No início do ano, a Prefeitura retirou algumas casas erguidas nas margens ou sobre o Córrego Zavuvus. Muitas ficaram. E só é possível ver obras em um trecho do córrego – quando cruza com a Rua Delfino Facchina.
“Se continuar nesse ritmo, vamos passar por muita enchente ainda”, prevê a comerciante Cecília de Sousa Franco, de 61 anos. Apenas duas pessoas trabalham na retirada de terra do local, segundo os moradores.
Projetos que facilitariam a vida do pedestre na cidade como a reforma de calçadas e a construção de passarelas perderam juntas R$ 1,24 milhão. Da construção de ciclovias e ciclofaixas foram retirados R$ 620 mil.
De acordo com o professor de Direito Administrativo da PUC-SP Márcio Cammarosano, em contas municipais deve ser mantido o equilíbrio entre receita e despesa. “Quando o superávit é acentuado podemos entender de duas formas: ou a administração está deixando de aplicar o dinheiro em obras e serviços que beneficiem a população ou a carga tributária cobrada dessa mesma população é maior que o necessário”, avaliou Cammarosano.
O professor de Economia e Administração da PUC-SP Darcio Genicolo Martins afirma que a transferência de dinheiro de um serviço para o outro pode ser entendido como mudança de prioridade da administração municipal. “Em tese é uma decisão de gestão pública e sinaliza o que é prioritário para ele (prefeito)”, explica Martins. Sobre o acúmulo de recursos, ele diz que possivelmente os R$ 10 bilhões guardados nos cofres municipais não serão usados até o fim do ano. “É um valor muito alto e não acredito que a gestão consiga gastar adequadamente tudo neste ano.”
Questionado na manhã desta terça-feira sobre as transferências, o prefeito Gilberto Kassab afirmou que “recursos em caixa não significam recursos que estejam sobrando”. Kassab disse ainda que “se (os recursos) foram transferidos é porque era prioridade que fossem transferidos”.
Outro lado
A Prefeitura diz ainda que o saldo de R$ 10,07 bilhões em maio – e R$ 7,7 bilhões em junho (com valores não fechados) – já está reservado para “honrar compromissos, como restos a pagar do exercício anterior, empenhos e liquidações do exercício corrente. Outra parcela representativa refere-se aos recursos provenientes das operações urbanas ou de transferências federais e estaduais, que serão utilizadas em projetos específicos”. Mas, a assessoria de imprensa não explica em quais projetos o dinheiro será utilizado.
Sobre a obra no Córrego Zavuvus, a Prefeitura justifica que está fazendo a remoção das famílias, mas segundo moradores que continuam vivendo nas margens do córrego, há pelo menos três meses, ninguém é retirado e funcionários não são vistos no local.
A Secretaria de Coordenação das Subprefeituras informou que entre 2005 e hoje, 1,14 milhão de metros quadrados de calçadas foram reformadas. Diz ainda que o orçamento inicial de R$ 26 milhões para implantação de acessibilidade em calçadas ganhou reforço de R$ 130 mil. Os investimentos em recapeamento de ruas e avenidas deverão ficar na ordem dos R$ 150 milhões.
Para reforma e ampliação de praças, a Prefeitura promete gastar neste ano R$ 83,74 milhões. Já sobre a urbanização de sete favelas que perderam recursos, a Secretaria de Habitação diz que os prazos estão mantidos e ações como cadastramento de moradores já estão acontecendo.
Veja na íntegra o decreto 51438, publicado na página 1 do Diário Oficial da Cidade de 23 de junho, que estabeleceu o remanejamento de verba de obras e projetos para o pagamento de dívidas no site do Diário Oficial: http://diariooficial.imprensaoficial.com.br/nav_v4/index.asp?c=1&e=20110623&p=1

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