Grupo da USP monitorou 500 páginas de
conteúdo distorcido ou falso em junho; para pesquisadores, tema terá
protagonismo em 2018
17
Setembro 2017 | 05h00
Cerca de 12 milhões de pessoas difundem notícias falsas sobre
política no Brasil, de acordo com levantamento do Grupo de Pesquisa em
Políticas Públicas para o Acesso à Informação (Gpopai) da Universidade de São
Paulo (USP). Se considerada a média de 200 seguidores por usuário, o alcance
pode chegar a praticamente toda a população brasileira. O dado é resultado de
um monitoramento com 500 páginas digitais de conteúdo político falso ou
distorcido no mês de junho.
Pesquisadores das diversas áreas ligadas ao assunto, como Ciência
da Computação, Ciência Política, Comunicação e Direito, são unânimes em afirmar
que as notícias falsas podem ganhar bastante protagonismo na próxima disputa
presidencial brasileira, com potencial de alcance maior do que as informações
de fontes reconhecidas como confiáveis. “No atual momento, a polarização
ideológica coincidiu com o consumo de notícias sobre política por meio das
redes sociais. Quanto mais manchetes se prestam a essa informação de combate,
maior é a performance delas, o que acaba por corroer o sistema como um todo,
poluindo o debate político”, avaliou o cientista político Pablo Ortellado, um
dos coordenadores do Gpopai.
O prognóstico é reforçado por exemplos quase que diários na rede.
No dia 19 do último mês, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi alvo de
uma fake news que dizia que o petista havia sido expulso de um restaurante em
Natal. Naquele dia, Lula estava em Pernambuco na caravana pelo Nordeste. A
notícia falsa teve quase 15 milhões de compartilhamentos, comentários e outras
interações no Twitter.
PUBLICIDADE
Para o professor da Escola de Comunicações e Artes da Universidade
de São Paulo (ECA-USP) Eugênio Bucci, o que impulsiona alguém a compartilhar
fake news é a lógica do entretenimento. “A notícia falsa, quando corresponde a
um preconceito profundamente enraizado, é fonte de grande prazer. O sujeito vê
aquilo e fala ‘eu sabia’.”
Segundo a advogada da área do direito digital, Juliana Abrusio há
dois principais perfis desse perpetuador de inverdades nos momentos prévios de
decisões políticas: o idealista na faixa entre 20 e 50 anos, que faz de tudo
por seu candidato, e o contratado, que faz tudo por dinheiro. “Normalmente,
prevalece o contratado”, disse.
De acordo com a advogada – que já teve entre seus clientes o
senador Aécio Neves (PSDB-MG) durante a campanha presidencial de 2014 –, um
processo por crime de calúnia, difamação e injúria, materializado em notícia
falsa, leva de 6 a 12 meses para ter um desfecho. “O direito não consegue
caminhar na mesma velocidade da internet.”
Junk news. Ela também alerta para a proliferação de “notícias
enviesadas”, chamadas de junk news. “Quando tiram de contexto um assunto para
transmitir outra mensagem.”
O professor de
Comunicação Social da Universidade Federal do Espírito Santo Fábio Malini
verificou que essas junk news, de 300 fontes distintas, foram mais
compartilhadas do que as notícias verdadeiras sobre a delação de executivos e
ex-executivos da Odebrecht no momento em que a colaboração premiada da
empreiteira foi homologada, em janeiro deste ano. / COLABOROU ELISA CLAVERY
3 PERGUNTAS
PARA...
José Fernando R.
Júnior, professor do Instituto de Ciências Matemáticas e de
Computação
1. De onde vêm
as notícias falsas?
Essa é a pergunta essencial para entender todo o resto. As
notícias falsas (ou pós-verdades) são criadas, na maioria absoluta das vezes,
para a obtenção de lucro. Quanto mais visualizações do seu site, mais cliques e
mais ganhos, os quais podem chegar a milhares de dólares. Este mecanismo é
seguido por outras empresas como o Facebook.
2. Notícias
falsas são mais compartilhadas que as verdadeiras? Por quê?
As notícias falsas são compartilhadas proporcionalmente ao quanto
são sensacionais. Da mesma maneira como as notícias reais. Todavia, se há uma
motivação financeira forte, pode-se ter um mecanismo de divulgação mais
agressivo.
3. Qual é a
diferença no compartilhamento de notícias falsas e verdadeiras?
Para identificar uma notícia verdadeira, basta verificar se há em
sua teia de compartilhamentos um número significativo de fontes com
credibilidade e/ou de usuários com perfil autêntico, no sentindo de zelo com
relação à veracidade do que compartilham.
0 Comentários