05/09/2017

Sabesp: A toque de caixa, sem transparência, governo Alckmin privatiza; a maioria das ações vai ficar nas mãos do mercado

05 de setembro de 2017 às 15h02

  
por Conceição Lemes
De 1997 até hoje, os sucessivos governos tucanos já venderam mais de R$ 100 bilhões em empresas estaduais e participações no Estado de São Paulo.
A bola da vez é a Sabesp, responsável pelo fornecimento de água, coleta e tratamento de esgotos de 367 municípios paulistas.
A Assembleia Legislativa (Alesp) deve dar o aval nesta terça-feira (05/09) ou quarta-feira (06/09).
Está na ordem do dia, pronto para ser votado em plenário, o projeto de lei 659-2017, do governador Geraldo Alckmin (PSDB), que “dispõe sobre a reorganização societária da Sabesp”.
A tramitação foi a toque de caixa:
3 de agosto – Em regime de urgência, o projeto de Alckmin deu entrada na Alesp.
16 de agosto — Partidos da base do governo fazem o chamado congresso de comissões.  É um recurso regimental, para acelerar a tramitação, mas que limita o debate. Em vez de o projeto passar pelas três comissões que teria que percorrer normalmente, é feita uma sessão conjunta.
22 de agosto – Finalmente, acontece a audiência pública. Cerca de três horas depois, como já se tornou praxe, a base de Alckmin tentou dar como aprovado o projeto para  ir a plenário para votação.
Na pressa de aprovar rápido, acabou atropelando o regimento interno.
Os deputados da oposição apresentaram então emendas e o resultado do primeiro congresso foi anulado.
29 de agosto – A base do governo convocou um novo congresso para apreciar as emendas da oposição. Nenhuma foi aprovada, já que Alckmin tem folgada maioria na Casa.
5 de setembro – A qualquer momento, nesta semana, o projeto deverá ser votado pelo plenário. Deve ser aprovado com folga, praticamente sem contraditório, apenas com o tempo de discussão habitual no plenário da Alesp, para poucas pessoas presentes e uma audiência baixíssima da TV ALESP.
A grande mídia ignorou o assunto, possivelmente por afinidade  ideológica dos donos dos veículos ou por ser a Sabesp um dos grandes anunciantes no mercado paulista.
A “oposição” partidária, parlamentar e sindical também não tem força para barrar o processo.
Resultado: a população desconhece o que vai acontecer, os deputados não estão sendo pressionados a dar explicações e o governo Alckmin vai vender mais um patrimônio do povo paulista. É uma velha história que se repete.
Com lucro de R$ 2,94 bilhões em 2016,  a Sabesp tem assim distribuído assim o seu capital social.
NYSE  é a sigla de New York Stock Exchange. Ou seja, ações na Bolsa de Valores de Nova York.
Não será a primeira vez que a Sabesp venderá seus ativos.
Anteriormente, já fez três grandes operações para venda dos seus ativos, que os tucanos chamam eufemisticamente de Programa Estadual de Desestatização:
Julho de 1997: R$ 406,770 milhões
Maio de 2002: R$ 537 milhões
Outubro de 2004: R$ 687,986 milhões
Uma vez aprovado o projeto de lei 659/2017, os próximos passos:
1) O governo Alckmin  criará uma outra empresa (sociedade controladora/holding), que controlará a Sabesp e outras empresas/subsidiárias que venham a surgir para operar ações relacionadas a saneamento.
2) O Estado transferirá suas ações da Sabesp para o capital da sociedade controladora.
3) O capital social desta nova empresa será formado por ações ordinárias (com direito a voto no Conselho de Administração) e ações preferenciais, uma característica específica do mercado acionário brasileiro.
4) Nesta nova empresa/sociedade controladora, o Estado terá apenas a maioria (ou o controle) das ações ordinárias, com direito a voto no Conselho de Administração.
Em consequência, a Sabesp será controlada por outra empresa, que terá a maioria de suas ações nas mãos do mercado.
5) Essa nova empresa controlará a Sabesp através de um contrato de gestão bem amplo, que interferirá completamente na sua administração.
Realmente, o assunto é árido e levanta questões óbvias, como estas, respondidas para oViomundo pelo consultor econômico Paulo Copacabana.
— Por que uma empresa estadual pública superavitária deve sofrer radical transformação, de forma tão acelerada e sem amplo conhecimento pela sociedade?
Não há resposta minimamente razoável apresentada nas justificativas da mensagem do governador e no texto do projeto.
— Mas para que tamanha urgência na tramitação?
Especula-se que seria para fazer caixa de campanha para a eleição de 2018.
— Como ficam os investimentos para universalizar o tratamento do esgoto, que é um problema sério no Estado de São Paulo?
Não ficam. Por uma razão: as metas de desempenho previstas no projeto não detalham os planos de investimentos.
–O Estado terá poder para interferir na Sabesp através da nova empresa?
O governo pode até ter o controle do conselho administrativo da nova empresa, direcionando a política mais geral, mas o contrato de gestão é que definirá os detalhes do funcionamento da SABESP. E nos detalhes é que está o problema.
— Mas isso tudo será transparente?
Não. No projeto de lei e no contrato de gestão falta transparência tanto em relação ao detalhamento dos investimentos quanto ao cumprimento de metas. A transparência existente, na verdade, é sempre voltada aos investidores, não para os cidadãos paulistas. É aí que também mora o perigo.
— O que o governo do Estado ganha com essa venda?
Arruma um jeito de captar mais recursos em bolsa de valores, sobretudo na de Nova York, com o argumento de que precisa investir mais, principalmente neste momento em que o Estado de São Paulo também enfrenta crise orçamentária e financeira e as operações de financiamento tradicionais junto aos bancos nacionais (BNDES, CEF, Banco do Brasil) e estrangeiros estão restringidas.
— E os dividendos como ficam?
A nova empresa/controladora, com ações preferenciais crescentes nas mãos do mercado, distribuirá ainda mais dividendos.
— Será uma privatização branca?
Uma nova modalidade de privatização, digamos assim, com a Sabesp sendo administrada através de um contrato de gestão e mantendo a falta total de transparência nos investimentos.
—  Então não seria melhor debater antes com a sociedade?
Obviamente, mas o governo Alckmin sempre tem pressa neste tipo de negócio. Além disso, Alckmin tem aversão à participação da sociedade. Está no DNA dos tucanos. Aqui no Estado de São Paulo não temos cidadãos, temos apenas consumidores e investidores. Tudo é privatizado e privatizável.
— Qual o resultado provável disso tudo?
Atualmente, a Sabesp já não cumpre a sua obrigação natural de promover saneamento para todos, ou seja, água tratada, esgoto coletado e tratado.
Agora, imagine como será com a nova controladora que terá absoluta autonomia para fazer o que quiser e com a crescente força de acionistas privados, querendo mais e mais dividendos.
Os investimentos prometidos podem ficar mais uma vez “na saudade”.
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