24/03/2011

Um buraco no caminho

Especialistas esperam uma avalanche de ações judiciais de pessoas que caíram na rua em razão de o TJ condenar a prefeitura de Sorocaba a indenizar uma aposentada

Recentemente, desembargadores da 9 Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça condenaram, por unanimidade, a prefeitura de Sorocaba a indenizar em R$ 10 mil uma professora aposentada que caiu na rua e fraturou o pulso. Para o engenheiro Eduardo José Daros, presidente da Associação Brasileira de Pedestres, esse precedente deve provocar uma avalanche de ações judiciais.

"As  pessoas não sabem que têm esse direito. Elas caem na rua e, mesmo machucadas, se levantam e vão embora", comenta Daros. Ele lembra que, se a moda pegar, os paulistanos que moram em frente de calçadas esburacadas também vão sofrer as consequências. "O ônus da indenização ficará por conta deles", alerta.

Um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) de 2003 ? e válido ainda hoje, segundo especialistas ? mostra que nove entre cada mil paulistanos caem nas ruas por causa de calçadas esburacadas.

O levantamento foi reforçado por outro, feito em 2004 pela médica Júlia Greve, professora do Departamento de Ortopedia da Faculdade de Medicina da USP. Segundo o estudo, de 584 pessoas que passaram pelo pronto-socorro 122 foram em razão de quedas em calçadas.

A maioria, diz Júlia, é idosa. A médica observa que esses pacientes carregam sequelas das quedas. "Muitos deixaram de andar nas ruas por medo de cair. Só caminham em casa ou vão ao shopping de carro para circular em segurança."

OBSTÁCULOS / O consultor em segurança viária e mobilidade urbana Philip Antony Gold afirma, com base em estudo feito por ele em 120 quarteirões de cinco regiões de São Paulo, que o pedestre encontra um obstáculo a cada sete metros de calçada. Buracos, segundo a pesquisa, totalizam 35%  e  desnivelamento, 25%. "Em regiões de grande circulação de pessoas, como a Avenida Paulista e áreas centralizadas, a Prefeitura solucionou o problema. Mas em muitos bairros da periferia ainda persiste", diz.

Para Gold, a cidade nunca terá calçadas boas se a responsabilidade pela manutenção continuar sendo do morador. "É a mesma coisa que encarregar o motorista do pedaço de rua que o carro dele vai andar. Um faz construção nova, mas a do vizinho é antiga, outro não tem dinheiro no momento para reforma e no fim para tudo." 

Para o urbanista Cândido Malta, há muitas calçadas irregulares na cidade por falta fiscalização. "A pior situação é quando existe declividade de 5%. Não há quem se mantenha nelas. Além disso, 50% dos cerca de 40 quilômetros de passeios -  loteamentos clandestinos anistiados - são cortados por obstáculos."

Malta cita como exemplo de calçada ideal um modelo holandês chamado "woonert". "É o que conhecemos por calçadão. Pedestres e carros dividem o mesmo espaço, mas os motoristas sabem que têm de respeitar os mais fracos", explica. Segundo ele, o modelo poderia ser implantado aqui também se os motoristas conseguissem aprender a ter "civilidade".

Segundo a Secretaria de Coordenação de Subprefeituras, nos 45 primeiros dias de 2011, o número de multas aplicadas para passeios danificados na cidade aumentou 30%. Foram  152 imóveis a mais que os 4.890 do ano anterior.


MAIS de 100
caem nas ruas por mês ou nove a cada mil habitantes 

Consequências
Traumatismos, principalmente na cabeça e face; fraturas nos membros, quadril e vértebras; lesões de ligamento, principalmente no tornozelo; lesões na coluna; morte

Seus direitos
Recorrer à Justiça com pedido de indenização por danos morais e materiais

Registrar local, queda, consequências, nem que seja por foto de celular

Reunir testemunhas que se comprometam a depor e anotar telefone e endereço delas

Fazer um boletim de ocorrência

Guardar todos os dados do socorro, como placa de ambulância ou do táxi, nome do hospital, declaração do médico e recibos, inclusive de gastos com remédios e fisioterapia

Encaminhar por e-mail ou carta uma reclamação sobre o local do acidente à prefeitura e guardar o comprovante e a resposta

Prazo para recurso: até 3 anos 

 

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